Mariana Kotscho
Busca
» ANSIEDADE

Ansiedade na infância: um alerta necessário para famílias e educadores

Aprenda reconhecer quando a ansiedade na infância saiu do controle e precisa de tratamento adequado

Yolanda Basíllio* Publicado em 02/05/2025, às 06h00

O acesso as telas e redes sociais deixa as crianças mais vulneráveis emocionalmente - pexels
O acesso as telas e redes sociais deixa as crianças mais vulneráveis emocionalmente - pexels

A ansiedade infantil se tornou um tema urgente na nossa sociedade. O aumento de diagnósticos e comportamentos ansiosos entre crianças nos leva a refletir sobre o que está acontecendo — e principalmente, o que podemos fazer a respeito. O psicólogo social Jonathan Haidt, em seu mais recente livro A Geração Ansiosa, mergulha nas raízes desse fenômeno e propõe explicações e caminhos para lidar com esse cenário que preocupa pais, educadores e profissionais da saúde mental.

As crianças estão mesmo mais ansiosas?

Sim. Diversas pesquisas internacionais apontam um aumento significativo nos índices de ansiedade e depressão entre crianças e adolescentes, especialmente a partir de 2010. Haidt aponta que essa tendência coincide com a popularização dos smartphones e o uso constante de redes sociais, o que leva a uma infância "enclausurada" e menos vivida em contato com o mundo real. As crianças estão mais protegidas, mais vigiadas — e paradoxalmente, mais vulneráveis emocionalmente.

Segundo o autor, os pais têm um papel central nesse processo. Ao tentar proteger demais os filhos de riscos e frustrações, muitos acabam privando-os das experiências necessárias para desenvolver resiliência emocional. A superproteção, ainda que bem-intencionada, pode ser um dos gatilhos para o aumento da ansiedade.

Telas e ansiedade: causas, efeitos e soluções

Haidt é enfático ao dizer que “a infância baseada em telas” está contribuindo para uma geração mais frágil emocionalmente. O excesso de estímulos digitais afeta o sono, o foco e as relações sociais das crianças, além de alimentar comparações constantes e uma sensação de inadequação — especialmente entre meninas.

Entre as principais causas da ansiedade infantil, Jonathan Haidt destaca o uso precoce de smartphones, o acesso a redes sociais sem supervisão e a crescente escassez de brincadeiras ao ar livre. Esses fatores contribuem diretamente para o aumento de sintomas como baixa autoestima, irritabilidade, dificuldade de concentração, além de alterações no apetite e no sono. Para enfrentar esse cenário, é fundamental estabelecer limites claros para o uso de telas, incentivar atividades presenciais e fortalecer as interações reais entre as crianças. Outra estratégia importante é promover o chamado “tédio criativo” — aquele tempo sem estímulos digitais que convida a criança a inventar, explorar e imaginar, ativando sua curiosidade natural e fortalecendo sua autonomia emocional.

Como identificar que a ansiedade saiu do controle?

Sentir medo, insegurança ou nervosismo em algumas situações é normal. Mas quando esses sentimentos se tornam frequentes, intensos e desproporcionais, é sinal de alerta. Alguns sintomas incluem:

  • Crises de choro ou pânico frequentes
  • Medo exagerado de separação dos pais
  • Dores físicas sem causa aparente (como dor de barriga ou dor de cabeça)
  • Insônia ou sono agitado
  • Evitação de situações sociais ou escolares

Nesses casos, o acompanhamento com psicólogo infantil é essencial. Se os sintomas impactam significativamente a rotina da criança, também é importante buscar avaliação médica para considerar outras intervenções.

O papel da família no acolhimento

Mais do que controlar, a família precisa acolher. Criar um ambiente seguro emocionalmente, onde a criança se sinta ouvida, compreendida e aceita, é fundamental para sua saúde mental. Isso significa escutar sem julgar, validar os sentimentos e oferecer apoio sem tentar resolver tudo imediatamente.

Haidt reforça que a criação de vínculos fortes e seguros é o verdadeiro antídoto contra a ansiedade. A presença afetuosa e atenta de um adulto pode ser o diferencial entre uma infância ansiosa e uma infância saudável, mesmo em tempos difíceis.

A escola pode ajudar? Como?

A escola é um espaço privilegiado para identificar e acolher crianças com sinais de ansiedade. Professores atentos podem perceber mudanças de comportamento, isolamento ou queda no rendimento escolar — sinais que muitas vezes escapam aos olhos dos pais.

Além disso, é possível incluir no dia a dia práticas que promovam a autorregulação emocional, como:

  • Roda de conversa sobre sentimentos
  • Momentos de silêncio e respiração consciente
  • Atividades ao ar livre e brincadeiras livres
  • Um ambiente escolar menos competitivo e mais cooperativo

Perda de apetite ou obesidade: os extremos da ansiedade

A ansiedade pode impactar diretamente o comportamento alimentar das crianças. Algumas perdem completamente o apetite; outras buscam conforto na comida. Ambas as reações merecem atenção.

O ideal é observar com carinho, conversar sem pressão e, se necessário, buscar ajuda de uma equipe multidisciplinar (psicólogo, nutricionista e pediatra). O foco deve estar sempre na saúde emocional — e não apenas no peso.

Veja também

Atividades que ajudam a regular a ansiedade

Algumas práticas simples podem ter um impacto significativo na regulação da ansiedade infantil. Exercícios de respiração profunda e meditação guiada ajudam a desacelerar o corpo e a mente, promovendo uma sensação de calma. Atividades ligadas à arte e à expressão criativa — como pintura, modelagem, música e dança — oferecem caminhos leves e acessíveis para que as crianças externalizem suas emoções. O contato com a natureza, seja por meio de brincadeiras ao ar livre ou do cuidado com plantas e animais, também é extremamente benéfico, assim como as brincadeiras livres com outras crianças, que fortalecem a autonomia emocional e as habilidades sociais. Por fim, a prática de esportes e movimentos físicos contribui para a liberação de endorfinas, ajudando a aliviar a tensão acumulada no corpo.

Dicas finais para lidar com a ansiedade na infância

  • Menos telas, mais presença: substitua o tempo de tela por tempo de qualidade juntos.
  • Dê nome aos sentimentos: ajude a criança a identificar e expressar o que sente.
  • Promova experiências reais: estimule brincadeiras ao ar livre, encontros com amigos e tarefas práticas.
  • Ofereça rotina e previsibilidade: isso traz segurança e ajuda a reduzir a ansiedade.
  • Busque ajuda especializada sem medo: cuidar da saúde mental desde cedo é um investimento para a vida inteira.

Diante do crescimento alarmante dos casos de ansiedade na infância, é urgente que pais, educadores e sociedade como um todo repensem as bases do cuidado com as crianças. Como Jonathan Haidt evidencia em A Geração Ansiosa, estamos criando filhos em ambientes superprotegidos e hiperconectados, mas emocionalmente frágeis. Romper com esse ciclo exige ações práticas e intencionais: limitar o uso de telas, promover vínculos seguros, valorizar o brincar livre e o contato com a natureza, além de garantir espaços de escuta e acolhimento dentro das famílias e das escolas. Reconhecer os sinais de que a ansiedade saiu do controle e buscar ajuda profissional quando necessário é um ato de responsabilidade e amor.

Mais do que nunca, precisamos devolver à infância o direito de ser vivida com leveza, presença e segurança. Afinal, cuidar da saúde emocional das crianças é também cuidar do futuro de todos nós.

*Yolanda Basílio é psicóloga, psicomotricista e consultora parental. Atua com Educação Infantil há 15 anos e hoje está como CEO da POPPINS, um ecossistema todo dedicado aos cuidados da Primeira Infância.

*Com edição de Marina Yazbek Dias Peres