O aumento de casos de sofrimento emocional e lesões autoprovocadas entre crianças e adolescentes reforça a urgência do acolhimento, prevenção e escuta
Claudia Santos de Melo* Publicado em 18/09/2025, às 06h00
Falar de saúde mental de crianças e adolescentes é falar de um futuro que está sendo tecido hoje. O Setembro Amarelo de 2025 traz novamente à cena um tema urgente: o aumento expressivo dos casos de sofrimento emocional e de lesões autoprovocadas entre os mais jovens. Segundo dados do Ministério da Saúde, entre 2012 e 2022, houve um crescimento de mais de 60% nas hospitalizações por essa causa na faixa etária infantojuvenil. Esse número não pode ser reduzido a mera estatística, pois traduz histórias interrompidas, pedidos de ajuda não ouvidos e trajetórias que poderiam ter sido diferentes se tivessem encontrado acolhimento a tempo.
Na Psicologia Humanista, inspirada por Carl Rogers, entende-se que cada criança e adolescente possui em si uma tendência natural ao crescimento — uma força vital para se atualizar e se desenvolver. Contudo, para que essa potência floresça, é fundamental que o ambiente ofereça aceitação, presença e segurança. Quando a criança é exposta a contextos marcados por pressão, violência, invisibilidade ou solidão, o risco de que o sofrimento silencioso se transforme em sintomas graves aumenta consideravelmente.
Por isso, pais, educadores e cuidadores precisam estar atentos a sinais que muitas vezes se apresentam de forma sutil: mudanças bruscas no comportamento, queda no desempenho escolar, isolamento, irritabilidade constante, distúrbios do sono, alimentação irregular ou frases que denotem desesperança e desvalorização da própria vida. Esses indícios jamais devem ser naturalizados ou minimizados; pelo contrário, constituem convites urgentes para aproximação, escuta e diálogo.
Um dos fatores que mais impactam a vida dos adolescentes atualmente é o uso excessivo das redes sociais. Embora esses espaços possam ser oportunidades de conexão, quando utilizados sem acompanhamento adequado, transformam-se em cenários de comparação constante, pressão estética, cyberbullying e cobranças irreais de desempenho. Paralelamente, o ambiente escolar, por vezes, reproduz exigências que colocam a produtividade acima do bem-estar emocional. Essa combinação, redes sociais e pressão acadêmica, gera em muitos jovens uma sensação de inadequação e um sentimento precoce de fracasso.
No entanto, é possível trilhar caminhos de cuidado. Conversar sobre emoções deve deixar de ser tabu. Crianças aprendem, desde cedo, sobre cores, números e regras, mas raramente sobre seus próprios sentimentos. Perguntar “como você se sente?”, validar emoções sem julgamento e oferecer um espaço seguro para a fala já são formas potentes de prevenção. No olhar humanista, não se trata de oferecer respostas prontas, mas de criar um encontro em que a criança se sinta compreendida, respeitada e valorizada como uma pessoa única.
Assim, o Setembro Amarelo, ao nos convocar a olhar para os mais jovens, nos lembra que a saúde mental não é acessório, mas sim um fundamento da vida. Que possamos transformar escolas e lares em ambientes de escuta genuína, vínculos de confiança e experiências de cuidado. Afinal, como dizia Rogers, “amar é estar ao lado de alguém sem tentar moldá-lo à nossa própria imagem”. Esse talvez seja o maior gesto de valorização da vida: reconhecer cada criança e adolescente como sujeito de potencial, capaz de construir sua história, desde que encontre, em nós, adultos presentes e sensíveis, o chão seguro para caminhar.
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