Precisamos estar atentos à saúde mental de crianças e adolescentes mais do que nunca. Os casos de depressão aumentaram significamente
Mariana Wechsler* Publicado em 16/10/2022, às 06h00
Quanto maior for a distância entre a criança e o amor e atenção dos pais, maior é a chance da criança ou adolescente desenvolver um processo de depressão. Nos últimos 10 anos, o tempo de uso de telas nas famílias e o stress no ambiente familiar tem aumentado tanto quanto o número de casos de depressão e tentativas de suicídio entre os jovens, isso não é mera coincidência.
Segundo um estudo realizado pelo Instituto de Psiquiatria (IPq) da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP), pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), com 2511 crianças, 26% tinham algum tipo de transtorno mental. E mais agravante, mais de 80% das crianças com algum transtorno não haviam sido diagnosticadas antes e, por consequência, nenhum tratamento foi oferecido.
Não pretendo aqui dizer que o uso de telas é a causa dos transtornos psicológicos. Mas podem ter certeza de uma coisa, o excesso do uso de telas é sim uma das principais causas de afastamento emocional entre filhos e pais. E quando os pais não estão presentes na vida dos filhos, não são capazes de ver que um problema está acontecendo ou não são capazes de lidar com o problema.
Segundo o pesquisador Daniel Fatori, que participou desse levantamento do IPq em 2019, as causas que atrasam ou impedem os pais de procurar tratamento para as crianças são a falta de informação e o estigma sobre as doenças mentais.
A situação é ainda mais alarmante em famílias que a criança sofre de disforia de gênero. Para quem não conhece o nome, disforia de gênero é quando a pessoa sofre por não se reconhecer como seu gênero, a mente tem uma percepção e o corpo não corresponde a essa percepção.
Em famílias que não estão abertas a perceber (a aceitar) essa condição da criança, o sofrimento está ali presente. No início, a disforia de gênero pode se manifestar como se fossem as birras, a dificuldade de aceitar uma roupa, não querer brincar com algum brinquedo, braveza excessiva, até já vi criança simplesmente sair correndo para ficar bem longe dos pais no meio da rua na multidão.
Isso tudo porque, em geral, os pais olham para a manifestação do problema e não para sua causa. Dão inúmeros nomes aos efeitos, mas não abrem um olhar para o que motiva o comportamento desafiador. E essa falta de olhar o motivo resulta em maior distanciamento e em mais dores.
Numa pesquisa publicada 08.05.20 no Jornal Brasileiro de Psiquiatria, foram avaliadas pessoas transgêneros sob diversos aspectos, um deles sobre pensamento suicida. Em média, 73,7% possuíam pensamentos suicidas em algum momento da vida e 29,9% haviam tentado de fato pelo menos uma vez, além de 26,8% já terem tentado automutilação/autoagressão, com predomínio de três ou mais episódios. E sobre a “aprovação” familiar (com relação a mudança de sexo), 27,3% que disseram que são aprovados parcialmente e 26,8% que são desaprovados.
Agora o dado mais importante. Quando os jovens passam a conviver num ambiente que o recepciona, que entende a sua situação, que aceita a sua percepção, a taxa de pensamentos suicida cai mais da metade e até a probabilidade de vícios também diminui bruscamente (base de um estudo intitulado “Association Between Gender-Affirming Surgeries and Mental Health Outcomes”, de Anthony N. Almazan e Alex S. Keuroghlian).
Crianças sofrem com os hormônios do crescimento, crescer dói mesmo. Adolescentes sofrem com os hormônios da puberdade que de alguma forma também doem. Os pais precisam olhar para seus filhos e sempre se lembrarem disso, crescer dói. Quando os pais não estão olhando, quando não acolhem, a dor que já existe só aumenta e se aprofunda.
As causas da depressão podem ser muitas, podem até ser químicas, às vezes o corpo não produz certa substância, ou até mesmo consumir glúten quando o corpo é intolerante ao alimento. São muitas questões possíveis e não necessariamente os pais são culpados pela depressão dos filhos. E, com certeza, num quadro assim um acompanhamento psicológico é de extrema importância para o jovem, assim como os pais também precisam de apoio.
Como pais, nosso papel é OLHAR, PERCEBER e DIALOGAR. E dialogar com o coração despido de qualquer ideia e conceito predefinido, é olhar nos olhos e conversar com a alma.
Muitas vezes, em nossa sociedade, temos visto a dificuldade de considerar a criança como um ser que já existe, no hoje. Precisamos considerar que a criança seja vista, ouvida, que seus sentimentos sejam validados, que ela seja cuidada como alguém que é útil e importante no agora.
Numa carta escrita pelo Buda Daishonin a um de seus discípulos, ele escreveu: “o que é costumeiro no tolo é esquecer nas horas cruciais o que prometera nas horas normais”. É no dia a dia que alimentamos um sentimento, são nas pequenas coisas e nos olhares nos corredores da nossa casa que semeamos e distribuímos nossas emoções. Essas são as horas cruciais.
Quando em momentos sem conflito se você ignorar quem você realmente é, você irá falhar quando enfrentar um momento desafiador. Em momentos em que você precisa ter consciência dos fatos a sua volta, quando você ignora-os, esse é o momento em que seu muro cresce e menos você enxerga a realidade.
Divida seus sentimentos com seus filhos, com seu marido e sua família. Esse será seu principal ensinamento. Quando seus filhos a veem sabendo lidar e nomear sentimentos, eles aprendem a fazer o mesmo. O diálogo e o amor são manifestações de reciprocidade.
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*Mariana Wechsler, Educadora Parental, especialista em educação respeitosa, budista há mais de 34 anos e formada em Comunicação. Mãe de Lara, Anne e Gael. Escreve sobre sobre os desafios da vida com pitadas de ensinamentos budistas e suas experiências morando fora do Brasil, longe de sua rede de apoio. Acredita que as mães precisam aprender a se cuidar e se abraçar, além de receberem apoio e carinho. Sempre diz: “Seja Fantástica! Seja sempre a sua melhor amiga”.