Meninas e meninos precisam saber que são muito mais do que o que a sociedade as impõe.
Vini Campos* Publicado em 02/08/2022, às 08h36
Quando falo sobre masculinidade tóxica nas infâncias, me sinto o Suplicy, a quem admiro, falando sobre a renda mínima cidadã. É que venho batendo na mesma tecla há tempos. Claro que não sou influencer que consegue chegar às multidões, nem um jornalista ou político respeitado, ou um ator que tenha protagonizado novelas no plim plim.
Se você está lendo esse texto, provavelmente já me conhece. Meus textos costumam chegar a pessoas mais próximas a mim, que me acompanham pelos livros para crianças e adolescentes que publiquei, ou pelos programas que fiz na TV. Porém, se é a primeira vez que você está me lendo, vou te explicar qual é minha luta.
Trabalhando e escrevendo para as infâncias, venho observando há alguns anos, que o conteúdo produzido para nossos pequenos é pouco diverso e costuma reforçar questões de gênero. Meninas doces, delicadas, vestidas de rosa, cuidam de bebês, cuidam dos irmãos, cuidam dos pets e brigam entre elas pelo bonitão da escola. Meninos fazem esportes e querem ganhar, meninos lutam e querem vencer, meninos estudam e têm que dominar. Menino não chora, menino não fala de sentimento, menino não acolhe. Menino é macho. Forte e se possível tem o pau grande, ou um carro grande, ou uma arma. A arma costuma resolver muitos dos problemas citados.
Sendo as mulheres as vítimas desses meninos, a dramaturgia, a tv, a literatura, a música, todas elas focaram no empoderamento da mulher. E as mulheres conquistaram espaços, cresceram na sociedade e inclusive aprenderam o que é sororidade. A sociedade, mais uma vez, colocou no colo das mulheres, no colo da vítima, a responsabilidade de se proteger.
Só que nós homens também somos vítimas. Os números de suicídio entre meninos adolescentes é três vezes maior que entre meninas. Estudos mostram que 95% da violência mundial é causada por homens.
Apesar disso, na prática, continuamos dominando ditando regras, fazendo leis que interferem diretamente no corpo das mulheres, sem ao menos consultá-las sobre isso. O corpo delas continua servindo para aquilo que nos convém.
Mas como disse lá no começo, meu foco é na infância, e por isso, venho mais uma vez apelar às mulheres, afinal são elas as que educam, não é mesmo?
Mulheres, mães, professoras, educadoras, avós, tias, cuidadoras: atenção com o conteúdo que suas crianças consomem. Na tv, nos vídeos, nos livros, em muitíssimos dos casos, os meninos, apesar de ainda serem muito pequenos, estão divididos em dois grupos: os fortes, ganhadores e poderosos, e os estúpidos, perdedores e viadinhos. Nossos meninos precisam saber que eles podem ser muito mais que isso, que existem outras maneiras de ser. Nossos meninos precisam chorar, aprender que perder está tudo bem, que sentir é delicioso, que amar e ser amado é potente, que ter uma companheira do lado para o debate e não para a obediência.
É injusto e cruel fazer um menino pensar que para ser admirado por sua família e por seus pares, ele precisa destruir o outro, dominar mulheres e resolver suas inseguranças na porrada. Boy lixo não nasce lixo. Boy lixo aprende a ser lixo pensando que é o único caminho para que ele seja respeitado como homem. Que o anestesista estuprador esteja ganhando seguidores nas redes, é o sinal mais claro de que estamos lidando com uma doença perigosa.
Helen Karina,
que grande menina.
Atenta, astuta, interessada
Nunca está estressada
Professora de coração
Não é fácil a situação
Mas Helen não abaixa os braços
Ela estuda, se dedica e cria laços.
*Vini Campos é ator, jornalista de formação e escritor de coração. Pai de três adolescentes, está cursando a pós-graduação "Pedagogias das Infâncias" na Universidade de Caxias do Sul.