As dores e as delícias da maternidade: expectativas, realidade, projeções
Monica Rosenberg* Publicado em 01/08/2022, às 07h00 - Atualizado em 12/10/2022, às 07h00
Florence Onyebuchi “Buchi” Emecheta, grande escritora nigeriana escreveu, em uma de suas melhores obras “As Alegrias da Maternidade”, sobre as delícias de se perceber mãe, com uma criança que tem à frente, um “mundo” de novas perspectivas e de aprendizados.
Assim como também fala das dores de se perceber mãe e entender as barreiras que terá que ultrapassar para que possa oferecer esse “mundo” à criança recém-chegada.
“Buchi” parece ecoar Carlos Drummond de Andrade quando ele afirma que “acreditar” em nossa própria mentira é o primeiro passo para o estabelecimento de uma nova verdade”. Ou seja, a ela como mulher, parte de uma sociedade dividida e preconceituosa, que a impede de ajudar seus filhos nas atividades que poderiam revelar e aflorar a melhor essência, não apenas deles como dela também, só sobrou acreditar na emergência de um mundo livre de atitudes e comportamentos exclusivistas.
As alegrias da maternidade estavam no fato de que, apesar da exclusão, ela acreditava e trabalhava gentilmente por essa sociedade inclusiva e livre dos comportamentos injustos.
Ainda que ela aborde outras realidades, há muito a ser refletido por nós hoje, já que, em pleno século 21, estamos inseridos em estruturas preconceituosas, segregacionistas e exclusivistas, onde as leis precisam de reformas e a sociedade, de voz para exigir mudanças. Qual a utilidade de uma lei que garanta acesso a políticas públicas inclusivas e que continue sendo desrespeitada e ignorada?
Não adianta garantir acesso às escolas, se esse direito é quase sempre desrespeitado com as piores atitudes preconceituosas. O mercado de trabalho, também não é ideal, enquanto as pessoas procuram apenas por uma vaga, e trabalham por necessidade, sem que se preocupem com capacitação, crescimento e qualidade.
Assim como o direito à saúde é pouco, já que as opções terapêuticas e de alto custo são negadas. Não há acesso à rede de saneamento básico e faltam transportes públicos acessíveis. E, tudo isso, são apenas pequenos exemplos das barreiras sociais.
Sendo assim, os obstáculos presentes em nossa sociedade, só podem ser contidos pela própria sociedade civil que deve ter novas atitudes. A comunidade precisa se unir e lutar por mudanças, pois só assim os governos estabelecerão novas e adequadas políticas públicas.
A essência da maternidade, e as delícias dela residem nisso: na felicidade de imaginar que uma nova vida está pronta para um mundo de possibilidades, em contraste com as dores da existência das barreiras que as mães precisam enfrentar para que seus filhos tenham direito à educação, saúde e saneamento básico.
Problemas esses, que as mulheres, ao se tornarem mães, não deveriam ter com que se preocupar. Por isso, que a alegria da maternidade, muitas vezes está apenas em “acreditar” que a realidade futura será inclusiva, melhor para seus filhos. E por isso também, as mães seguem em frente e trabalham por isso.
Não é sem dor que descobrimos quais são as alegrias da maternidade.
*Monica Rosenberg é mãe, advogada, autora do livro “Somos todos corruptos? Pequeno manual do ético-chato e uma das fundadoras do Instituto Não Aceito Corrupção.