Programa segue funcionando em estados que fizeram acordo com Policias Militares
Raphael Preto Pereira* Publicado em 12/07/2023, às 15h30
O programa das escolas cívico-militares, que teve seu fim anunciado oficialmente hoje (12) com um ofício assinado pelo Ministério da Educação, terminou com dinheiro preso e parado sem a possibilidade de execução e denúncias de abuso de autoridade por parte dos profissionais do exército e policiais estaduais que trabalhavam como monitores nas escolas e acompanhavam a gestão escolar das unidades de ensino. O programa também teve 98 milhões de reais empenhados no orçamento do Ministério da Educação, mas utilizou apenas 245 mil para este fim.
A professora Thaísa Magalhães, que deu aula em uma escola cívico militar de Brasília, afirmou que os alunos sofriam com falta de estrutura e que, inclusive, faltava material: “A gente pegava um monte de livros e carregava esses de outras escolas, com a ajuda dos alunos, pois a gente não recebia livros."
Criado logo no início da gestão do presidente Jair Bolsonaro, as escolas cívico-militares eram a principal bandeira do ex-mandatário para a educação. Mas elas tiveram uma atuação tímida e foram implementadas em apenas 202 escolas. No Brasil, há 138.000 escolas de educação básica.
Em uma entrevista exibida há um mês, o ministro da educação, Camilo Santana, afirmou que o programa estava extinto. A manifestação oficial só aconteceu agora.
A proposta procurava imitar o modelo das escolas militares, que são geridas pelo exército e nas quais são matriculados preferencialmente oficiais das forças armadas e da Polícia Militar. Mas há diferenças sensíveis entre os dois modelos.
No primeiro caso, elas são completamente geridas pelas forças armadas e de segurança, que têm responsabilidade pelo seu currículo e há mais dinheiro para gastar com cada uma, já que existem menos escolas e a verba sai do orçamento específico das forças armadas ou da PM, o que não acontece no caso das escolas cívico-militares, onde o dinheiro sai única e exclusivamente do Ministério da Educação.
No segundo caso, o dinheiro saía unicamente da pasta responsável pela educação e era usado para a complementação da verba utilizada para aumentar o salário de quem é convocado para trabalhar nas instituições. Essas pessoas eram obrigatoriamente oficiais do exército.
Um profissional contratado, por exemplo, para auxílio da gestão escolar podia receber um acréscimo de, no mínimo, 8.343 e de, no máximo, R$ 9.152 reais à sua remuneração da reserva. O salário de um diretor de escola no Estado de São Paulo é de R$ 4.107.
Para chegar ao posto, o candidato à diretor precisa ter no mínimo 8 anos de efetivo exercício do magistério, além de licenciatura plena ou pós-graduação em pedagogia.
Um militar que exercesse a função de inspetor de alunos, por exemplo, teria um incremento no salário de R$ 4.120. Um inspetor de alunos na rede estadual de São Paulo recebe pouco mais de mil reais.
Thaíssa também ressalta que os professores eram obrigados a discutir questões pedagógicas da escola com os oficiais do exército. “Isso acontecia enquanto eles estavam com arma na mão. E essas coisas viravam processo administrativo contra nós. E nós ganhamos todos. Mas não sabemos o que aconteceu com as pessoas que fizeram os processos administrativos contra nós. A gente vive sobre um conjunto de leis que é a constituição. Os militares seguem outro conjunto de regras, que é importante para que eles cumpram a função deles, mas fora da escola” afirma a professora, que também diz que houve casos em que estudantes eram colocados em pé durante uma hora por castigo por chegarem atrasados na escola: “As discussões aconteciam por causa desses absurdos”. A denúncia foi feita em uma audiência pública que discutiu a questão das escolas militares em maio.
Alguns estados realizaram parcerias com a polícia militar para manter esses programas funcionando em âmbito estadual. Essas escolas não foram atingidas pela decisão do governo federal.
*Raphael Preto Pereira é jornalista