Psicoterapeuta ressalta a importancia do diagnóstico da dislexia para gerar uma melhor qualidade de vida para a criança
Helen Mavichian* Publicado em 19/06/2023, às 10h00
Entre os diferentes transtornos de aprendizagem que existem, a dislexia é um transtorno específico que impacta o desenvolvimento da habilidade de leitura, o que acarreta também prejuízos na escrita. Segundo dados do Instituto ABCD, organização social que tem como propósito promover e disseminar impactos positivos na vida de brasileiros com dislexia, no Brasil, há cerca de 8 milhões de pessoas que têm dislexia.
Isso significa que aproximadamente 4% da população brasileira tem um transtorno de origem neurobiológica que se caracteriza por dificuldades na precisão e na fluência da leitura de palavras e também habilidades reduzidas de decodificação escrita ou até mesmo para soletrar palavras. Essas dificuldades resultam em um déficit no processamento fonológico, que geralmente está abaixo do esperado em relação às demais habilidades cognitivas. Em outras palavras, a dislexia é um transtorno de aprendizagem que gera dificuldade de processar a informação, seja ela qual for, de forma rápida e específica.
Muitos pais procuram especialistas, médicos e psicólogos preocupados com seus filhos por apresentarem dificuldade de aprendizagem, acreditando que a criança é apenas desatenta e tem "má vontade" de prestar atenção nas aulas, ler e realizar as tarefas de casa. Porém, com essa preocupação, às vezes podem deixar de olhar com a devida atenção a outros sinais que podem ocasionar dificuldades no aprendizado, na compreensão e na escrita.
Recentemente, no meu consultório, recebi um casal que estava muito preocupado com sua filha pois ela apresentava muita dificuldade na escola. Os pais suspeitavam que ela tinha Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) ou Dislexia. Após analisar o contexto em que a criança estava vivendo, iniciei uma avaliação neuropsicológica e apliquei diversos testes.
Algumas sessões depois, cheguei a conclusão de que a paciente estava apenas sofrendo alguns efeitos da pandemia, em que a educação e o acompanhamento escolar e profissional ficaram defasados, fazendo com que a criança estivesse com dificuldades de acompanhar sua turma. O contexto de sua casa também não era favorável ao contexto, porque os pais não tinham disponibilidade para realizar tarefas junto à criança e nem estimulavam os estudos, sendo que a paciente vivia uma fase de desenvolvimento e precisava muito desse apoio. Ou seja, há casos que se não forem bem analisados, podem levar a diagnósticos equivocados.
Esse exemplo deixa claro que a dislexia muitas vezes pode ser confundida com outros fatores ou estar associada a outros transtornos, como o TDAH, mas, na verdade são transtornos diferentes. O TDAH afeta as habilidades de atenção do indivíduo e a dislexia está ligada especificamente às habilidades de linguagem e escrita. Ambos, quando não diagnosticados na infância, podem trazer dificuldades na idade adulta. É comum que essa confusão exista, uma vez que 70% das pessoas com TDAH acabam tendo alguma dificuldade na leitura e escrita. É claro que crianças com diagnóstico de TDAH também podem ter dislexia, mas não é uma regra. Por isso, cada caso deve ser avaliado de forma multidisciplinar.
Segundo o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, conhecido como DSM-V, para diagnosticar a dislexia é necessário identificar sintomas como:
Apesar da alta ocorrência, a dislexia ainda é subdiagnosticada no Brasil, ou seja, acredita-se que muitas pessoas possuem o transtorno, mas não receberam o diagnóstico, portanto, desconhecem sua condição. Isso se deve ao limitado conhecimento acerca de seus sintomas e manifestações clínicas, o que contribui para que muitos estudantes sejam rotulados de preguiçosos, "burros" e inaptos, ceifando assim suas oportunidades de aprendizagem. É importante investigar para entender melhor o caso da criança e fazer um estudo aprofundado.
Na dúvida, uma avaliação neuropsicológica é sempre a melhor alternativa para obter um diagnóstico mais assertivo e, assim, gerar mais qualidade de vida para todos, crianças, adolescentes e seus familiares.
* Helen Mavichian é psicoterapeuta especializada em crianças e adolescentes e Mestre em Distúrbios do Desenvolvimento pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Mais informações em https://helenpsicologa.com.br/