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Carta de uma psiquiatra para você, na véspera do Enem

Na véspera do Enem, saiba que tudo o que você sente é legítimo

Maria Carol Pinheiro Publicado em 08/11/2025, às 06h00

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Sentir ansiedade antes do Enem é normal e não é fraqueza - Foto: Canva Pro

Na véspera do Enem, muitos estudantes enfrentam uma mistura de emoções intensas, refletindo anos de preparação e expectativas familiares, o que pode gerar ansiedade e estresse significativos.

A pressão psicológica pode impactar negativamente o desempenho, com sintomas físicos como insônia e dores de cabeça, tornando essencial o cuidado com a saúde mental durante esse período crítico.

A psiquiatra Maria Carol Pinheiro recomenda que os estudantes se permitam descansar, organizem-se e busquem apoio emocional, enfatizando que a prova é apenas uma parte de suas trajetórias e que cuidar da mente é fundamental para o sucesso.

Resumo gerado por IA

Caro(a) estudante,

Hoje, escrevo diretamente para você que carrega no peito um mundo de expectativas e dúvidas. Talvez agora as emoções misturem coragem, medo, esperança, cansaço e um silêncio cheio de perguntas. O peso dessa véspera, eu sei, é imenso. O Enem não é só uma prova: para muita gente, representa anos de luta, sonhos de família, desejo de pertencimento e de futuro. É legítimo sentir o coração mais apertado, o corpo inquieto, a mente acelerada. Isso não é fraqueza, é humanidade. Nosso corpo carrega memórias, carrega afetos, carrega nossa história.

Você já reparou na força que existe em quem persiste mesmo cansado? Em quem tenta, apesar do medo de errar? A jornada até aqui foi cheia de desafios: imagino que perdeu festas, adiou desejos, enfrentou ansiedade, se engasgou de conteúdo e expectativa. Suportar tudo isso é, por si só, admirável. E agora, na véspera da prova, o corpo entra em estado de alerta: é a biologia ativando mecanismos de sobrevivência, liberando hormônios do estresse, como o cortisol. Até certo ponto, isso te mantém vigilante; mas, se passa do limite, pode consumir energia e sabotar sua memória, sua confiança e até seu sono.

É preciso reconhecer: provas que avaliam sonhos são espelhos que mostram suas dúvidas mais fundas. O medo do fracasso, de decepcionar, de não corresponder, essas dores rasgam, silenciam, isolam. Mas deixe-me repetir, com carinho: você não está só. Milhares sentem o mesmo agora, e não há vergonha alguma nisso, aliás, o verdadeiro perigo é naturalizar o sofrimento psicológico, achar que precisa aguentar “no braço” e negar o peso da ansiedade ou do desânimo. Saúde mental não é luxo, é condição para amadurecer, aprender e superar limites.

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Como psiquiatra, falo com a autoridade da ciência e a escuta de quem já atendeu muitas pessoas em situações críticas. O excesso de ansiedade não só rouba tranquilidade como prejudica o desempenho intelectual. A mente carregada de medo aprende menos, raciocina pior e, para piorar, pode provocar sintomas físicos: dores de cabeça, insônia, desconcentração. Por isso compartilho orientações: nesta véspera, permita-se parar. Não revise conteúdos novos. Organize seus documentos, a roupa que vai usar, separe o lanche (não esqueça da água!). Tente fazer algo prazeroso, nem que seja por alguns minutos: ouvir música, conversar com alguém querido, assistir a um filme leve, rituais assim acalmam o corpo, trazem de volta um sentido de proteção e restituem o chão sob os seus pés.

E se o desespero ameaçar transbordar, lembre-se: tudo o que sente é legítimo. Procure apoio: não silencie sua dor. A saúde mental precisa ser prioridade, inclusive durante a travessia de grandes desafios. Assim como se cuida de uma gripe ou de um machucado, cuide da mente com o mesmo zelo. Buscar ajuda não é fraqueza; é ato de coragem e de respeito consigo mesmo. Não se cobre perfeição, acredite: ninguém é perfeito. Valorize pequenas conquistas, reconheça o esforço, celebre sua trajetória.

A prova é só um capítulo da sua história, não o desfecho. Você é mais que uma nota, mais que um rendimento, mais que um resultado. Seja gentil consigo nesta véspera. Permita-se o descanso. Acolha as emoções, compartilhe o que sente, preserve o que é seu. Você está vivendo algo muito importante, e merece respeito: inclusive (e sobretudo) o próprio. Confie: viver é também recomeçar, independentemente do placar.

Com toda sensibilidade, admiração e apoio,

Maria Carol Pinheiro

Psiquiatra e psicoterapeuta Maria Carol Pinheiro
Psiquiatra e psicoterapeuta Maria Carol Pinheiro

*Maria Carol Pinheiro é psiquiatra, psicoterapeuta e Coordenadora da disciplina de Saúde Mental na Escola da pós graduação em Neurociência Aplicada à Educação da Santa Casa de São Paulo.

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