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Condomínios e a Lei Maria da Penha: o papel do síndico profissional na proteção de vítimas de violência doméstica

Já existe uma lei em São Paulo que determina regras num condomínio para que a violência doméstica seja denunciada

Giovanni Gallo* Publicado em 14/10/2024, às 06h00

A sociedade não pode ser conivente com a violência doméstica
A sociedade não pode ser conivente com a violência doméstica

A violência doméstica é um problema social de longa data, que ganhou ainda mais visibilidade com o isolamento social durante a pandemia de COVID-19. Os dados indicam que, com o confinamento, muitas vítimas se viram presas em casa com seus agressores, e essa realidade se refletiu em diversos ambientes, incluindo os condomínios residenciais.

Diante desse cenário, surge a necessidade de discutir o papel do síndico profissional como uma figura crucial na proteção dessas vítimas e na aplicação da Lei Maria da Penha dentro dos limites de sua competência.

O crescimento dos casos de violência doméstica em condomínios

A pandemia trouxe à tona a vulnerabilidade de mulheres que sofrem violência doméstica. O aumento de registros de agressão em ambientes residenciais evidenciou que, muitas vezes, as agressões ocorrem dentro de casa, onde a vítima deveria se sentir segura.

Nos condomínios, essa realidade é ainda mais alarmante, já que os vizinhos, síndicos e demais moradores estão diretamente expostos a situações de conflito que, em alguns casos, podem se tornar evidentes. De acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, o número de denúncias de violência doméstica aumentou durante os períodos de quarentena. Nos condomínios, essa realidade é percebida de forma mais próxima, uma vez que o convívio entre moradores torna mais difícil para as agressões passarem despercebidas.

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No entanto, o que muitos ainda não sabem é que o síndico pode, e deve, ter um papel ativo na proteção das vítimas.

O papel do síndico e a Lei Maria da Penha

A Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006) é um marco jurídico na proteção das mulheres contra a violência doméstica e familiar no Brasil. Embora o síndico não tenha competência jurídica para intervir diretamente em conflitos familiares, ele pode agir como um facilitador de ações que envolvem a proteção das vítimas. De acordo com o Código Civil Brasileiro, o síndico tem a função de zelar pelo bem-estar dos condôminos, garantindo a ordem e a segurança dentro do condomínio.

Assim, ao perceber qualquer indício de violência doméstica, o síndico deve agir de forma proativa, promovendo a comunicação entre os moradores e, se necessário, acionando as autoridades competentes.

Nesse contexto, a atuação do síndico é respaldada pela Lei Maria da Penha, que incentiva a denúncia de crimes de violência doméstica por qualquer pessoa que tenha conhecimento das agressões.

Como o síndico profissional pode atuar?

O síndico profissional tem um papel crucial, que vai além da administração financeira e estrutural do condomínio. Ele pode desempenhar uma função de liderança comunitária, ajudando a criar um ambiente seguro para todos os moradores, especialmente para as vítimas de violência doméstica.

Algumas ações proativas que o síndico pode adotar incluem:

  1. Fomentar campanhas de conscientização: o síndico pode organizar palestras, debates e distribuir materiais informativos sobre violência doméstica e os direitos das vítimas, destacando a importância da denúncia.
  2. Criar canais de denúncia anônimos: o estabelecimento de canais de comunicação que permitam que vizinhos ou a própria vítima denunciem, de forma segura e anônima, situações de violência pode ser um grande avanço na proteção.
  3. Manter parcerias com órgãos de proteção: o síndico pode se aproximar de delegacias especializadas, centros de apoio à mulher e ONGs para garantir que, em casos de emergência, exista uma resposta rápida e eficaz.
  4. Monitorar os espaços comuns e facilitar a comunicação: os síndicos podem, com o consentimento dos condôminos, melhorar a vigilância em áreas comuns e estar atentos a comportamentos suspeitos ou agressivos, facilitando a comunicação com a polícia ou com os serviços de proteção quando necessário.
  5. Proteger a vítima de represálias: em casos onde há uma denúncia formal, o síndico pode ajudar a criar estratégias de segurança, como melhorar o monitoramento, orientar a vítima sobre possíveis saídas de emergência e manter discrição para evitar represálias por parte do agressor.

O desafio do síndico: agir sem interferir

Uma das maiores dificuldades enfrentadas pelos síndicos é saber até que ponto podem atuar sem violar a privacidade dos condôminos ou ultrapassar os limites de sua função. Embora o papel do síndico seja crucial na criação de um ambiente seguro, ele não pode agir como uma autoridade judicial ou policial.

No entanto, isso não o isenta de agir em situações de violência doméstica que ocorram em áreas comuns ou que impactem o bem-estar coletivo do condomínio. Portanto, é fundamental que o síndico profissional esteja preparado para lidar com essas situações, compreendendo os limites de sua atuação, mas, ao mesmo tempo, agindo de forma a promover a segurança e o respeito à lei.

Isso pode ser feito por meio de treinamentos, formações e parcerias com instituições que atuam diretamente na proteção de mulheres vítimas de violência.

Conclusão

O aumento dos casos de violência doméstica em condomínios exige que a sociedade se mobilize, e o síndico profissional pode ser um elo importante nessa luta. Sua atuação, quando bem orientada e proativa, pode fazer a diferença na vida de muitas mulheres, proporcionando um ambiente mais seguro e incentivando a denúncia de agressores.

Mais do que nunca, é necessário que os condomínios se tornem espaços de proteção e respeito, onde a aplicação da Lei Maria da Penha seja uma realidade acessível a todas as vítimas. Nos condomínios que administramos, o crescimento de denúncias de agressão à mulheres foi de 55% entre 2021 e 2024, o que reforça a necessidade de alertarmos esses tipos de casos.

A Lei 17.406 de 2021, em vigor no Estado de São Paulo, impõe a obrigação aos síndicos de condomínios residenciais e comerciais de comunicar os órgãos de segurança pública sempre que houver indícios ou a ocorrência de violência doméstica e familiar contra mulheres, crianças, idosos ou adolescentes.

Essa Lei visa assegurar que esses casos não passem despercebidos e que as vítimas recebam a proteção necessária. Desde a implementação dessa Lei, investimos em treinamentos para os síndicos e funcionários, orientando sobre a identificação de sinais de violência e o procedimento correto para reportar esses casos às autoridades competentes.

*Giovanni Gallo é síndico profissional formado em engenharia e administrador da G2A Gestão de Condomínios