Veja uma lista de fatores selecionados a partir de recomendações do Ministério da Educação que indicam a qualidade da Educação Infantil
Damaris Gomes Maranhão* Publicado em 04/10/2022, às 06h00
Vídeos que circularam nas redes de bebês com braços e tórax enrolados em lençóis em cadeirinhas, sob uma bancada de um trocador, em uma escola privada na cidade de São Paulo, deixaram familiares e profissionais perplexos. Os fatos estão sendo investigados pela polícia, uma vez que a mesma escola já tinha registro de uma morte súbita de um bebê de três meses no ano de 2010. Para evitar fatos semelhantes, é preciso que os familiares de crianças menores de seis anos conheçam os indicadores de qualidade dos cuidados no contexto da Educação Infantil.
A Educação Infantil é composta pelo que no passado denominávamos de "Creches e Pré-escolas". A primeira etapa, que atende os menores de três anos e onze meses, não é obrigatória para todas as crianças, mas é um direito delas e dos pais que desejam compartilhar cuidados e educação dos seus filhos com os professores. A segunda etapa, para maiores de quatro anos, é de frequência obrigatória para todas as crianças desde 2014. Mas todo serviço educacional, seja denominado de Berçários, Creches ou Escolas de Educação Infantil, deve ser autorizado e fiscalizado pela Secretaria de Educação e Vigilância Sanitária de cada município.
O cuidado é uma atitude que se desdobra em procedimentos para identificar e atender as necessidades de cada bebê e criança, permeando as interações e brincadeiras, eixos dos diversos Campos de Experiência previstos na Base Curricular Nacional Comum da Educação Infantil.
Embora o cuidado profissional deva estar embasado em saberes e competências construídos, integrando-se os saberes e fazeres orientados pelas ciências da saúde e pedagógicas, a sociedade muitas vezes considera que basta o senso comum, sobretudo os cuidados corporais dos bebês como troca de fraldas, supervisão do sono, alimentação e uso do sanitário pelos maiores.
Algumas escolas e municípios atribuem esses cuidados aos auxiliares, ou seja, a uma categoria com menor escolaridade, como estratégia de economia dos custos da mão de obra, por ser menos qualificada, ou porque alguns professores ainda consideram o cuidado corporal como algo que não lhes compete. Mas essa atitude é equivocada, pois durante os procedimentos dos cuidados com os bebês, eles têm oportunidade de ter uma atenção individualizada no contexto coletivo.
A participação da criança no cuidado do próprio corpo contribui para a consciência corporal, base de sua identidade simbólica. As crianças, desde que nascem, aprendem pela percepção, atenção, imitação, repetição, imaginação, pensamento e linguagem, as chamadas funções intelectuais superiores, durante as interações com adultos e crianças de várias idades. Os primeiros jogos simbólicos revelam como elas valorizam e imitam os atos de cuidados, observando e imitando os adultos e crianças com quem convivem e que observam - como ninar e alimentar um boneco, dar comida na boca do amigo, cozinhar ou usar um objeto, conforme sua experiência sócio-histórica-cultural.
Toda escola de Educação Infantil, pública ou privada, deve ter um ambiente adequado aos bebês e crianças que se propõem a educar e cuidar, por meio de profissionais formados e atualizados, garantindo os direitos de aprendizagem previstos na Base Curricular Nacional Comum da Educação Infantil (BCNCEI). Os diversos Campos de Experiências previstos na BCNCEI são permeados por atitudes e procedimentos de cuidados que visam o acolhimento, a segurança psicofísica, o conforto, a nutrição, a alternância de momentos de vigília e sono, a exposição regulada ao sol, a movimentação livre, exploração e brincadeiras em áreas, externas e internas, seguras conforme faixa etária e necessidades específicas.
Em 2010, foi publicado pelo MEC o texto "Saúde e Bem Estar das Crianças na Educação Infantil: uma meta para educadores, familiares e profissionais de saúde", elencando 19 Indicadores que todos os familiares das crianças precisam checar nas escolas de suas crianças.
Considerando esses indicadores, as escolas de educação infantil demandam uma arquitetura interna e externa que possibilite as interações e brincadeiras em ambientes seguros e confortáveis, ricos em experiências e permeados pelos cuidados com base científica, e não apenas no senso comum ou cultura institucional. Com base nesses indicadores, sugere-se que os familiares e profissionais avaliem:
1. Os profissionais da escola têm uma clara e eficaz comunicação com a família? A família conhece o ambiente e os profissionais responsáveis pelo seu filho na escola? Há um sistema de registro eficaz sobre os cuidados recomendados pela família e pelos profissionais que acompanham a criança? Esses registros são arquivados e podem ser recuperados se necessário?
2. Os professores consideram as necessidades pessoais das diversas crianças conforme seu potencial de desenvolvimento e demandas?
3. Os professores acompanham o processo de crescimento e desenvolvimento em parceria com os familiares e profissionais de saúde que assistem as crianças, identificando necessidades especificas que requeiram intervenção?
4. Os professores auxiliam e ensinam as crianças a cuidar de si, do outro e organizam os ambientes de forma que potencialize o desenvolvimento pleno de forma que a autonomia seja construída sem risco à integridade psicofísica?
5. Os professores alimentam os bebês conforme prescrição do pediatra que a acompanha e informações dos familiares, conforme necessidades nutricionais, afetivas e de aprendizagem de novos paladares e consistências, com base na recomendação para o processo de desmame e nas normas de higiene para ambientes coletivos?
6. Os professores acolhem as mães de lactentes e a escola tem um ambiente e local adequads para aleitamento e armazenamento de leite materno?
7. Os profissionais organizam as refeições em ambientes higiênicos, seguros, confortáveis, belos e que possibilitem a autonomia, a socialização e a boa nutrição a todos os grupos etários? Ajudam as crianças que recusam alimentos e conversam com os familiares sobre possíveis abordagens para aquelas com dificuldades para se alimentarem?
8. Disponibilizam água potável e utensílios limpos individualizados para que as crianças possam beber água potável quando desejarem e sejam incentivadas a fazê-lo durante todo o dia?
9. Oportunizam o banho de sol até as 10 horas e após as 15 horas em espaços seguros e confortáveis também para os bebês?
10. Preocupam-se com o conforto da criança, ensinando-as a adequar o vestuário e calçados ao clima, atividades e ambientes?
11. Consideram as necessidades de sono de cada criança em ambiente seguro, confortável, individualizados com espaçamento entre berços ou colchonetes?
12. Mantem-se vigilância constante durante esses momentos, socorrendo prontamente aqueles que eventualmente possam apresentar sinais de desconforto respiratório?
13. Evitam deixar os bebês contidos em cadeirinhas ou outros dispositivos, possibilitando o livre movimento em ambiente estimulante, limpo e seguro?
14. Mantem as salas ventiladas e alternam atividades internas e externas evitando o confinamento?
15. Atendem as recomendações sanitárias considerando 2,5 metros quadrados de área interna de sala para menores de dois anos e 1,5 metro quadrados para as maiores de três anos? A razão adulto/criança segue as recomendações sanitárias e pedagógicas conforme a faixa etária? Há pias adequadas às crianças e aos profissionais para higiene das mãos?
16. Os trocadores estão localizados próximos à pia e são confortáveis e seguros? As técnicas e atitudes durante a troca de fraldas seguem as recomendações pedagógicas e sanitárias?
17. Registram e oferecem à criança cuidados ou medicamentos prescritos pelo médico conferindo a receita e a autorização assinada pela família, nas situações em que haja necessidade específica? Nesse caso a pessoa responsável confere as cinco certezas: o medicamento certo, a criança certa, a via certa, a dose certa, o horário certo?
18. Os profissionais da escola são capacitados para o Suporte Básico de Vida, conseguindo observar, identificar, pedir ajuda, intervir, acionar e se comunicar com a família e com o SAMU, nas situações em que reconhecem que a criança apresenta alguma alteração grave no estado de saúde, como insuficiência respiratória, engasgo, convulsão, trauma? A escola tem protocolos para orientar os profissionais no caso de observarem crianças com alterações na temperatura, sangramento nasal, escoriação, picada de inseto, diarréia, vômito ou outro sinal ou sintoma comum na faixa etária atendida?
19. O gestor notifica o Serviço de Vigilância Epidemiológica ou a Unidade Básica de Saúde do território no caso de suspeita de surto de doenças transmissíveis na escola, ou seja, dois casos na semana correlacionados, conforme Legislação Sanitária?
20. As brincadeiras e interações ocorrem em ambientes seguros e adequados à faixa etária? Os brinquedos e superfícies são higienizados e mantidos íntegros?
21. As famílias são informadas sobre o currículo, aprendizagens e desenvolvimento das crianças conforme a BNCCEI?
Concluindo, a educação infantil de qualidade é dever do Estado e direito de todas as crianças. Compete aos pais, ou outros familiares responsáveis pelas crianças, acompanharem esses serviços e buscar o acesso às informações desde a matrícula.
Ref:
1. https://periodicos.ufsc.br/index.php/zeroseis/article/view/70816.
2.http://portal.mec.gov.br/docman/dezembro-2010-pdf/7157-2-5-artigo-mec-saude-bemestar-criancas-damaris/file
*Damaris Gomes Maranhão é enfermeira Especialista em Saúde Pública UNIFESP/USP, Dra em Ciências da Saúde pela UNIFESP, Professora do Instituto Superior de Educação Vera Cruz, Consultora do CEDUC e Formadora no Instituto Avisalá, Mãe do Bruno e da Melissa, avó da Clara e do Pedro.