Mariana Kotscho
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» DIA DO AUTISMO

Em um mundo onde a maternidade muitas vezes é retratada de maneira idealizada, uma mãe resolve dar voz ao personagem principal: aquela que cuida

Conheça a história de Patrícia Lima, uma mãe atípica que resolveu criar um podcast para falar com mães e dividir também suas experiências com a maternidade

Redação Publicado em 02/04/2024, às 06h00

Patrícia e o filho Miguel
Patrícia e o filho Miguel

Meu nome é Patrícia Lima, tenho 42 anos, nasci em São Paulo, capital, sou jornalista, mãe de dois meninos, meu caçula de 7 anos é autista.

Meu primeiro filho nasceu quando eu tinha 28 anos, foi uma gravidez tranquila e planejada. Murilo foi uma criança calma, me lembro que ele parecia um boneco, do jeito que colocávamos para assistir TV ele ficava.

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O tempo passou e depois de 7 anos engravidei novamente. Miguel veio ao mundo com 37 semanas no dia 19 de agosto de 2016. Naquele dia fui ao hospital fazer um exame, uma amiga me levou. No decorrer do procedimento, para minha surpresa e medo, o bebê não respondia, a enfermeira ligou rapidamente para a médica que me acompanhava e então foi decidido que fariam uma cesariana. Meu mundo caiu, eu estava sozinha, naquela época minha irmã trabalhava próximo ao local e chegou rapidamente. Mas a minha agonia era tamanha, meu marido estava longe, e talvez não chegaria a tempo de acompanhar o nascimento do nosso filho.

Na sala de parto os médicos me preparavam para dar à luz ao meu pequeno, em outra dependência minha irmã se arrumava para me acompanhar nesse momento. Enquanto isso o corpo médico tentava me distrair dizendo: vamos arrumar um marido para acompanhar você, nos fale como prefere? E de repente para minha surpresa a porta do centro cirúrgico se abre, pensei que fosse minha irmã, eles brincaram: serve esse moço? Era meu marido, ele conseguiu chegar a tempo, e minutos depois com 3.130 kg e 45 centímetros, nascia nosso Miguel.

Três dias depois voltamos para nossa casa com o novo integrante da família. Depois de 7 anos, começávamos tudo novamente.

O tempo foi passando, quando o pequeno tinha 11 meses eu arrumei um emprego. Que sonho, conseguira uma oportunidade na minha área. Fui contratada como assessora de imprensa e fui trabalhar com uma das minhas grandes paixões: o futebol. Para o meu pai foi um orgulho, afinal ele era responsável pelo meu amor pela bola. Três meses antes da minha contratação, tínhamos descoberto que ele estava doente e tive a pior notícia da minha vida: ele estava com câncer. Naquele momento um emprego foi um divisor de águas, era uma forma de distrair minha cabeça.

Quando Miguel completou 1 ano, eu e meu marido notávamos apenas alguns detalhes, seu contato visual não era constante, mas até aí, não tinha nada de muito importante. Ele demorou um pouco para andar comparado ao irmão, somente com 1 ano e 3 meses. Mas fomos seguindo.

O ano de 2017 foi muito difícil, meu pai lutava contra o câncer, os seis primeiro meses de procedimento foram um sucesso e em dezembro daquele ano comemorávamos sua melhora. Tudo estava perfeito.

 Em maio de 2018, a doença veio com tudo, e novamente voltamos à estaca zero. Ele piorou muito. No dia que o Brasil foi desclassificado pela Bélgica, eu internei meu pai e 17 dias depois, no dia 23 de julho, ele partiu. Meu mundo caiu, eu perdia meu ponto de equilíbrio, foi o dia mais difícil da minha vida.

Já em 2019, enquanto trabalhava e vivia o luto, o tempo foi passando. E o que chamava atenção no Miguel era o fato dele não ter uma comunicação clara, era silábico, mas tinha uma inteligência incrível.  Conhecia cerca de 50 bandeiras, alfabeto, números, formas geométricas, era diferente das demais crianças, era frenético, eu ficava exausta, ele não parava.

A agitação motora do Miguel era cada vez mais intensa, a escola me sinalizou que ele não interagia com as demais crianças, até que, já decidida a levá-lo ao médico em uma das minhas crises de estresse, uma prima me disse: tenha paciência, fique calma, vai que ele tenha algo. No fundo, eu sabia que tinha. Meu marido não aceitou o fato de termos que levá-lo ao neurologista, na cabeça dele e de algumas pessoas ele era apenas inteligente e hiperativo.

Era março de 2020 quando o levamos ao consultório do neurologista, foi uma consulta longa. Após uma anamnese intensa e muita observação veio a notícia: seu filho é autista, ele vai precisar fazer um acompanhamento multidisciplinar. Saímos de lá sem voz. Na cabeça do meu marido, depois de três meses ele ficaria bom. Eu disse: é uma condição e não uma doença. No dia seguinte, já no meu trabalho, eu chorei, chorei e pensei: como será daqui pra frente? Entretanto, levantei a cabeça e resolvi agir, afinal, eu tinha a escolha de entrar em outro luto, dessa vez por conta da condição do meu filho, mas eu preferi me munir de informação para ajudá-lo

mãe e filho
Abraço de mãe e filho

Em 2020 o mundo parou por conta da Covid, mas nosso filho não podia esperar e em julho, depois de muita dor de cabeça com o convênio, recebemos a liminar que ele poderia iniciar o tratamento no local que indicamos.

Quando chegamos na clínica multidisciplinar, era tudo muito novo, eu não sabia o que me esperava. Depois que deixei o Miguel na sala de uma das terapeutas que iria avaliá-lo, eu fui à sala dos pais. Lá encontrei uma mãe que, assim como eu, estava acompanhando seu filho. Ela se apresentou e me disse: essa é nossa vida, estou nessa jornada há cinco anos. Ficamos amigas, ela foi a primeira pessoa que me deu a mão. Depois nós duas nos aproximamos de outra mãe, e somos muito ligadas.

A evolução do Miguel é incrível, ele ama música, toca teclado, bateria e adora ir a concertos. Juntos, eu, meu marido e nosso primogênito aprendemos a lidar com as desregulações dele e a compreender que nós é que precisamos entendê-lo.

 Com o tempo fui fazendo amizade, e sempre ouvindo histórias. Na sala dos pais, sempre compartilhamos alegrias, conquistas, informação e nossas experiências.

Foi aí que pensei: vou fazer um podcast para falar com mães que assim como eu tem muita história para contar, afinal, somos muitas.  Falei com um amigo, e ele topou me dirigir. Foi aí que nasceu o Mães Atípicas-Somos Muitas.

Quando eu entrei nesse universo, me deparei com muitas pessoas falando sobre o assunto, mas quase não via a figura mais importante desse quebra-cabeça: a mãe.

Por meio de histórias pessoais, conselhos práticos e troca de conhecimento com profissionais da área, o serviço de streaming aborda uma ampla gama de tópicos, e repercute ao personagem principal: aquela que cuida. Mais do que apenas compartilhar experiências e informação, promove uma comunidade de solidariedade e resiliência entre as famílias.

Ao desafiar os estereótipos da maternidade e celebrar a diversidade, o podcast é uma oportunidade de entrar nesse mundo, onde as famílias especiais possam ser compreendidas de forma digna na sociedade: sem preconceitos, com uma visão mais humana, cercada de amor. E de fato, a cada episódio, entre lágrimas e sorrisos, as mães têm suas narrativas compartilhadas que ajudam muitas de nós.

O canal Mães Atípicas - Somos Muitas, está disponível nas principais plataformas, é um espaço totalmente acolhedor para mães que enfrentam desafios únicos na jornada do maternar.

Para conhecer o podcast acesse o Instagram