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Nem toda dificuldade é a Dislexia: o que é e como identificar?

Diretora-presidente do Instituto ABCD explica o que é dislexia e ressalta a importância do diagnóstico

Juliana Amorina* Publicado em 04/07/2023, às 13h00

4 em cada 10 crianças do segundo ano do ensino fundamental estavam alfabetizadas no país em 2021
4 em cada 10 crianças do segundo ano do ensino fundamental estavam alfabetizadas no país em 2021

A educação no Brasil está mergulhada numa das crises mais profundas já observadas na história. De 2020 para 2021, a proporção de crianças de 6 a 14 anos matriculadas ou que concluíram o ensino fundamental baixou de 98% para 95,9%, de acordo com o relatório do 4º ciclo de monitoramento das metas do Plano Nacional de Educação, divulgado pelo Inep. Quando o assunto é alfabetização, os dados são ainda mais alarmantes. Estudo recente divulgado pelo Ministério da Educação (MEC) mostrou que somente quatro a cada 10 crianças do segundo ano do ensino fundamental estavam alfabetizadas no país em 2021. 

Existem diferentes critérios para determinar quando um aluno está de fato alfabetizado. Esse é um ponto que mereceria uma nova conversa, mas para alcançar o nosso objetivo, vamos nos basear na definição adotada atualmente pelo MEC: um estudante alfabetizado é aquele que se apropriou do princípio alfabético, conseguindo compreender e organizar as relações entre as letras e seus respectivos sons na língua portuguesa e, em posse desse conhecimento, é capaz de ler pequenos textos e de localizar informações na superfície textual. Ou seja, a alfabetização é um processo que depende da escolarização e do ensino formal. 

Mas veja bem, não estamos falando de um problema novo.  Historicamente, o Brasil tem grande dificuldade na temática da alfabetização. Para se ter uma ideia, em 2016, o MEC avaliou 2,7 milhões de crianças do 3º ano do ensino fundamental I, com o objetivo de compreender o nível de conhecimento em português e matemática e o diagnóstico foi alarmante, mesmo antes da pandemia: 54,7% das crianças apresentavam nível insuficiente de proficiência em leitura aos 9 anos de idade. Isso significa que elas estavam partindo para o 4º ano sem conseguir identificar simples relações de causa e efeito em textos curtos. O resultado destaca que o péssimo desempenho acadêmico dos alunos brasileiros matriculados no ensino médio e observados em avaliações internacionais já estão presentes desde o período de alfabetização. E não pára, por aí, de acordo com projeção realizada pela Todos Pela Educação, se considerarmos o ritmo do avanço dos estudantes nas últimas avaliações oficiais realizadas,  o Brasil levaria 76 anos para que todas as crianças estivessem proficientes em leitura ao terminarem o 3º ano.   

Não podemos nos manter nesse caminho, mas também precisamos tomar cuidado com análises que irão fundamentar as novas rotas traçadas e, considerando todo esse contexto, é importante deixar extremamente claro o que a ciência já vem indicando há algum tempo: nem todo problema educacional é um transtorno específico de aprendizagem. A alfabetização depende do ensino formal, de habilidades linguísticas e cognitivas, adquiridas durante a primeira infância e, é natural que dificuldades apareçam no processo. Algumas dessas dificuldades são devido a influências externas que atrapalham o processo de aprendizagem, como questões emocionais, abordagens pedagógicas, problemas familiares, alimentação inadequada ou ambiente desfavorável. Contudo, existem alunos que, apesar de vivenciar condições ideais para a aprendizagem, não conseguem ser alfabetizados. São essas crianças que podem ter um transtorno específico da aprendizagem, como a Dislexia,  uma condição do neurodesenvolvimento que afeta a aprendizagem e o processamento de informações. Ao contrário das dificuldades passageiras, o transtorno específico da aprendizagem é persistente e suas características vão acompanhar essa pessoa ao longo da vida.

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Quando é Dislexia? 

A Dislexia é um transtorno específico da aprendizagem de origem neurobiológica, caracterizado pela dificuldade em associar as letras com os sons que elas representam, impactando o reconhecimento preciso das palavras, a habilidade de decodificação e a escrita. As dificuldades geralmente surpreendentes quando comparado a outras habilidades cognitivas e ao acesso à aprendizagem. Consequências secundárias podem incluir dificuldades na compreensão de texto e limitada leitura, o que impede o desenvolvimento do vocabulário e do conhecimento geral. 

No Brasil, mais de 7,8 milhões de pessoas, o que corresponde a aproximadamente 4% da população, têm dislexia e enfrentam dificuldades na leitura. Nos adultos, a dislexia continua afetando a habilidade de ler e escrever corretamente do indivíduo. 

O acesso ao diagnóstico é fundamental e decisivo para obter maiores chances de sucesso ao lidar com o transtorno de forma eficaz, pois quanto mais tardio maiores o impacto na aprendizagem e, com frequência, consequências emocionais. 

Os primeiros sinais aparecem na fase de alfabetização e os mais comuns incluem dificuldade em aprender as letras e a sequência do alfabeto, seguido pela persistência de erros na escrita como troca, inversão, omissão ou acréscimo de letras e sílabas e dificuldades de leitura. Justamente por isso, o professor é um importante aliado neste processo: é ele que pode identificar quais alunos estão enfrentando dificuldade em aprender o nome das letras, fazem inversão de sílabas na hora de ler ou escrever, confundem palavras que soam parecido, apresentam lentidão na leitura, entre outras e, por ser um especialista em aprendizagem, analisar se essas dificuldades são persistentes e resistentes a propostas de intervenção especializada. 

Muito além de alfabetizar

Com o papel decisivo na vida dos alunos com transtornos específicos da aprendizagem ou não, a escola e o professor devem estar preparados para acolher todos os alunos.

A escola é o ambiente ideal para desenvolver habilidades de leitura, escrita e cálculo. Abordagens educacionais baseadas nas melhores evidências e estruturadas para serem acessíveis vão impactar positivamente todos os alunos. Mas o currículo escolar é somente uma parte no desenvolvimento do aluno. Nesse contexto, a escola desempenha um papel crucial na inclusão e uma sensação de pertencimento para aqueles que possuem uma maneira diferente de aprender. Ao adotar uma perspectiva realmente inclusiva e fornecer recursos adequados, as escolas podem transformar a vida do aluno, permitindo que elas superem as barreiras impostas pela sociedade e alcancem seu pleno potencial. A educação verdadeiramente inclusiva é a chave para construir uma sociedade mais equitativa, onde todos tenham a oportunidade de desenvolverem-se e contribuir de maneira significativa

Acompanhe a nossa coluna mensal. Na próxima eu conto para você mais detalhes sobre a Dislexia e sobre como o Instituto ABCD vem colaborando para construir um caminho de inclusão para crianças e adultos com Dislexia. 

Juliana Amorina
Juliana Amorina

*Juliana Amorina é diretora-presidente do Instituto ABCD