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Livres para sonhar? Especialistas analisam a violência baseada em gênero e seu impacto na comunidade escolar

Resultados mostram lacunas no combate à violência de gênero e a necessidade de formação para educadores nas escolas.

Redação Publicado em 22/12/2025, às 06h00

Mulher em frente a homem com o punho fechado esconde e protege o rosto
A liberdade para sonhar só será possível quando meninas e adolescentes se sentirem seguras para falar sobre situações de violência. - Foto: Canva Pro

A pesquisa 'Livres para Sonhar?' revela a percepção da comunidade escolar sobre a violência de gênero, destacando que meninas só poderão sonhar livremente quando estiverem protegidas de violências nos ambientes que deveriam ser seguros.

Os dados obtidos mostram que a violência de gênero é uma realidade alarmante nas escolas, e a resistência institucional em abordar esses temas, além da falta de preparo dos educadores, agrava a situação.

Propostas para combater a violência incluem formação continuada para professores, revisão de currículos e criação de espaços seguros para alunos, com o objetivo de transformar as escolas em ambientes acolhedores e saudáveis.

Resumo gerado por IA

Durante a divulgação dos resultados da pesquisa “Livres para Sonhar? Percepções da comunidade escolar sobre violência contra meninas”, realizada pela Serenas no dia 3 de novembro, em São Paulo, especialistas presentes compartilharam seu conhecimento sobre a violência baseada em gênero (VBG) e suas percepção acerca dos resultados trazidos pelo levantamento, que procurou trazer respostas para algumas indagações: Como estudantes percebem violência baseada no gênero na escola? Como professores e gestores reconhecem essas situações? Quais práticas de prevenção já estão em curso nas escolas? Como o sistema educacional pode fortalecer sua capacidade de resposta e cuidado?

Ficou claro que meninas e mulheres só serão verdadeiramente livres para sonhar quando estiverem livres das violências que acontecem justamente nos espaços onde deveriam se sentir protegidas. As análises, que reforçaram essa argumentação, foram apresentadas a um público formado essencialmente por educadores, assistentes sociais, líderes de comunidades, agentes do sistema educacional e do terceiro setor. Ao fim da apresentação, todos foram convidados a contribuir e participar de ações que transformem os dados da pesquisa em resultados práticos.

Em sua fala de abertura, a diretora e cofundadora da entidade Amanda Sadalla contou a trajetória da Serenas e apresentou as motivações para a realização do estudo. “A Serenas nasce a partir da minha experiência dentro de escolas, vendo meninas que sofrem violências tanto dentro quanto fora da escola e me perguntando como essas meninas podem ter direito ao pleno desenvolvimento quando em casa elas sofrem violência sexual, quando a gente sabe que as meninas são as principais vítimas de estupro no nosso país, quando no caminho para a escola elas sofrem violência no transporte e quando na escola elas sofrem discriminação e também violência por serem meninas”, disse Amanda.

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“Por isso o ‘Livres para sonhar?’, com interrogação. Porque a violência de gênero e a discriminação dizem para essa menina que ela não tem direito ao sonho. E a nossa provocação é que essa menina tem, sim, direito a sonhar, mas para isso ela precisa estar protegida das violências baseadas no gênero, assim como do racismo, da LGBTfobia e das tantas outas discriminações que impactam o dia a dia das meninas em nosso país”, complementou.

Já o detalhamento dos dados obtidos sobre a VBG foi explicado por Débora Lira, especialista em políticas públicas e de gênero, e uma das coordenadoras técnicas do projeto.

O evento contou com um painel mediado pela educadora e psicanalista Carolina Delboni, que conduziu a interação entre Luciana Temer, presidente do Instituto Liberta, o professor Mário Augusto, psicólogo e especialista em educação antirracista, e Graziela Santos, coordenadora de Políticas Educacionais na Serenas.

Luciana destacou a importância da pesquisa ao traduzir o cenário de violência em números: “Aqueles que trabalham o tema da violência no ambiente escolar já tinham a percepção da realidade trazida pela pesquisa, mas a mera percepção não serve como argumento. O grande mérito desse trabalho foi apresentar dados reais que podem embasar propostas a serem levadas aos gestores e tomadores de decisão capazes de implementar políticas públicas de combate e prevenção à VBG”.

Para Mário Augusto, a liberdade para sonhar só será possível “quando houver espaço de fala e de escuta, isto é, quando meninas e adolescentes se sentirem seguras para falar sobre situações de violência e encontrarem na escola o acolhimento necessário”.

Graziela trouxe contribuições principalmente sob o recorte do racismo estrutural e a dupla carga de violência e preconceito que as meninas pretas enfrentam, em razão do gênero e da cor da pele.

As falas dos especialistas também corroboraram a existência das lacunas identificadas pela pesquisa que impedem que as escolas brasileiras combatam e previnam eficazmente a VBG e se tornem, de fato, espaços saudáveis e acolhedores. Entre as dificuldades, destacam-se a resistência institucional em abordar temas considerados “sensíveis” e falta de preparo, apoio e diretrizes claras para que educadores se sintam seguros e amparados para enfrentar a VBG.

A pesquisa também inclui algumas propostas para o combate e prevenção à VBG como formação continuada para professores; revisão de currículos e materiais didáticos para incorporar temas como equidade de gênero, diversidade e promoção de relações saudáveis; criação de espaços seguros que encorajem a participação dos alunos; geração e uso de dados sobre clima escolar e violências de gênero, para guiar políticas públicas baseadas em evidências; entre outras.

Para realizar o estudo “Livres para sonhar?” a Serenas contou com a Plano CDE, empresa especializada em pesquisas que entrevistou mais de 1.400 pessoas nas cinco regiões do país, combinando entrevistas em profundidade com gestores públicos e escolares, grupos focais com professores e estudantes, além de um questionário online respondido por docentes. Contou também com financiamento do Instituto Beja e do Instituto Machado Meyer e apoio institucional da plataforma Associação Nova Escola. Já o lançamento da pesquisa contou com apoio institucional do Instituto Liberta.

Para acessar a íntegra da pesquisa, clique AQUI.

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