Carta aberta da Rede Nacional de pesquisas em saúde mental de crianças e adolescentes

Em carta aberta, a rede lamenta a resistência de terem sido nomeadas para o Conselho Nacional de Educação pessoas de movimentos sociais

Rede Nacional de Pesquisas em Saúde Mental de Crianças e Adolescentes Publicado em 13/08/2024, às 13h00

A inclusão não pode ser só na teoria, precisa ser na prática -

No dia 5 de agosto, o presidente Lula nomeou 13 novos membros para o Conselho Nacional de Educação (CNE). A Rede Nacional de Pesquisas em Saúde Mental de Crianças e Adolescentes (Rede-PqSMCA) comemora a inclusão de representação direta da sociedade civil no sistema consultivo do ordenamento das decisões governamentais, o que amplia a base do funcionamento democrático do país.

O exercício democrático, sabemos, não exclui o tensionamento e disputas políticas no campo das ideias e, por essa razão, a distribuição dos assentos no interior do CNE assume relevância. 

Mas, o que configura a diversidade nesse caso? Como pesquisadores, membros da comunidade acadêmica e engajados na produção científica, essa pergunta nos interessa.

 

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Consideramos que para pensar a educação em um país construído sobre as diferenças e desigualdades que nos marcam, a variedade racial e territorial deve ser considerada em todas as instâncias decisórias que compõem a construção das políticas públicas, principalmente aquelas que se referem à produção do cuidado e da proteção social, com destaque, nesse caso, para as de educação.

A disputa que se armou nas redes sociais em torno da nova configuração do Conselho, sob alegação de que títulos acadêmicos equivalem à produção de ciência, tensiona a disputa política.  Nós, integrantes da Rede Pq-SMCA, reconhecemos como ciência a composição dos saberes na construção do conhecimento, e nesse sentido, a interlocução entre diferentes experiências e perspectivas de relações com a realidade, sustenta a composição e complementariedade constitutivas de todo raciocínio que se pretenda científico.

Entendemos que nossa contribuição, como pesquisadores e cientistas, deve compor o debate, e não encerrá-lo, porque consideramos que o saber produzido a partir de outras posições, que têm lugar na organização e no funcionamento social, assumem relevância na proposição de garantia e acesso ao direito fundamental que é a Educação. São essas posições que informam, por exemplo, como as populações para as quais pretendemos produzir cuidado, articulam suas demandas e, principalmente, constroem saber sobre elas.

Nesse mesmo gesto de reconhecimento, como pesquisadores no campo da saúde mental e das infâncias e adolescências, e comprometidos com a coisa pública, saudamos a nomeação de Givânia Maria Silva, professora quilombola, pesquisadora e integrante da Rede Ativistas do Fundo Malala no Brasil, e de Mariana Rosa, mulher com deficiência, mestranda em Educação, educadora popular e ativista na defesa dos direitos das pessoas com deficiência. A presença dessas representantes no CNE reconhece o valor do conhecimento produzido a partir de suas experiências na implementação e efetivação de Políticas Públicas - expertise essa que, obviamente, não se constitui exclusivamente desde a academia.

No âmbito político, avançamos mais firmes quando os gestos são tecidos na composição de saberes diversos, territorializados e racializados. E esse é também o posicionamento ético que sustenta a produção científica: nenhuma ciência será capaz de produzir conhecimento à revelia dos territórios e das experiências que aborda. Relacionar-se com a experiência, no âmbito das ciências políticas e do cuidado, necessariamente inclui a escuta qualificada dos Movimentos Sociais. Essa tese, além de já ser largamente justificada pela ciência, condiciona a abrangência da sua incidência política sobre as populações.

Entendemos que a experiência que ordena os Movimentos Sociais, como representantes da sociedade civil, estrutura o pensamento no âmbito específico das pautas que discutem, mas não só, pois sua experiência também serve para interrogar a perspectiva de manejo com outras pautas, e, sabemos, não se faz ciência sem boas perguntas, principalmente sem aquelas que têm origem na experiência viva das pessoas. 

Não queremos ocupar todas as cadeiras do Conselho com acadêmicos porque é isso que a ciência nos ensina: a composição no campo do saber sustenta a possibilidade de efetivação da proteção social.

Saudando Givânia Silva e Mariana Rosa, afirmamos nosso compromisso com a produção de conhecimento, da ciência e das políticas públicas. A defesa da pluralidade amplia nossas leituras de mundo e de ações sobre ele, contribuindo para formulação de políticas públicas sensíveis e consequentes às reais necessidades da população. Que o CNE cumpra sua função !!

 

 

 

 

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