Mariana Kotscho
Busca
» SAÚDE DA MULHER

Agosto Dourado: aleitamento e HIV

A transmissão vertical pelo aleitamento materno é um realidade que pode ser evitada, caso sejam seguidas todas as orientações médicas

Redação Publicado em 07/08/2024, às 06h00

O leite materno é alimento fundamental para o bebê
O leite materno é alimento fundamental para o bebê

Agosto, também conhecido como "Agosto Dourado", é o mês dedicado ao incentivo e conscientização sobre o aleitamento materno, ressaltando os inúmeros benefícios dessa prática para a saúde do bebê e da mãe. No entanto, muitas mães vivendo com HIV/Aids enfrentam a impossibilidade de vivenciar esse momento de conexão com seus bebês, uma vez que são orientadas a não amamentar para evitar a transmissão vertical do vírus.  

De acordo com o segundo volume do Boletim Epidemiológico Saúde da População Negra, entre 2011 e 2021, o número de casos de HIV detectados em gestantes pardas e pretas aumentou anualmente, passando de 62,4% em 2011 para 67,7% em 2021. Observou-se uma maior proporção desses casos entre as gestantes com idade entre 15 e 29 anos, que representaram 69,6% das notificações.  

Durante a gestação e o parto, há o risco de transmissão do HIV, assim como de outras doenças. É importante destacar que o HIV pode ser transmitido através da amamentação. Diante dessa realidade, a infectologista dos Hospitais Samaritano e Indianápolis, Dra. Rafaela Arvai Pereira, enfatiza que orientar as mães a não amamentar em caso de infecção é uma medida de proteção ao bebê.  

Veja também

"Médicos prescrevem medicamentos para a mãe não produzir leite, evitando o ingurgitamento mamário, a mastite ou outros problemas, e recomendamos o uso de fórmula láctea", explica a infectologista. Essa fórmula é fornecida gratuitamente pelo governo, assegurando o acesso a uma alternativa segura e adequada para a alimentação do recém-nascido.  

Diagnóstico durante a gestação  

No Brasil, a notificação de gestantes, parturientes e puérperas com HIV é obrigatória desde o ano 2000, com o objetivo de prevenir a transmissão vertical da infecção de mãe para o bebê. Contudo, o boletim epidemiológico revela que, em 2021, mais de 70% das notificações de AIDS em crianças com menos de 14 anos eram de pessoas negras, sendo 6,3% pretas e 64,9% pardas. Além disso, o documento destaca um aumento de 12% na proporção de pessoas pretas e pardas testadas para HIV ou AIDS, que passou de 50,3% em 2011 para 62,3% em 2021.

Nesse contexto, é essencial que as gestantes realizem testes para HIV, sífilis e hepatites durante os três primeiros meses de gestação, nos três últimos meses e em casos de exposição de risco e/ou violência sexual, respectivamente. Além disso, o teste para HIV deve ser realizado no momento do parto, independentemente de exames anteriores.  

Para as gestantes diagnosticadas com HIV durante a gestação, é recomendado o início imediato do tratamento com medicamentos antirretrovirais, que deve se estender por toda a gestação e, se orientado pelo médico, também no momento do parto. Essa abordagem visa prevenir a transmissão vertical do HIV para o bebê.  

"É de extrema importância que todas as pessoas vivendo com HIV, incluindo as mães, tomem os medicamentos antirretrovirais diariamente, de preferência no mesmo horário e também sem pular nenhum dia, uma vez que essa disciplina resulta em uma carga viral indetectável, o que significa intransmissibilidade", ressalta Dra. Rafaela. O recém-nascido também deve receber o medicamento antirretroviral (xarope) e ser acompanhado regularmente por um profissional de saúde.  

Prevenção e cuidado para o crescimento saudável do bebê  

É fundamental enfatizar que mulheres com diagnóstico negativo para o HIV durante o pré-natal ou parto devem utilizar camisinha (masculina ou feminina) nas relações sexuais, inclusive durante o período de amamentação, como medida preventiva para evitar a infecção e garantir o crescimento saudável do bebê.  

A presidente do Projeto Criança Aids (PCA), ONG de São Paulo que atua com crianças e famílias de crianças que vivem com HIV/Aids, Adriana Galvão Ferrazini, frisa que o ato de não amamentar é uma prova de amor e de direito à vida.  

“Mulheres amamentando podem ser infectadas e só ter conhecimento do fato quando já estiverem doentes da Aids, quando os sintomas das comorbidades aparecem nelas e em seus filhos também infectados, através do leite materno”, salienta Adriana. “Por isso a importância da testagem periódica para o vírus HIV, do uso de preservativos masculino ou feminino e da PrEP (profilaxia pré-exposição), durante a amamentação“  .

Casos em crianças  

Os dados oficiais divulgados pelo Boletim Epidemiológico de HIV/Aids revelam que os casos de HIV em crianças menores de 5 anos de idade têm se mantido estáveis nos últimos dois anos. Entre 2019 e 2021, a taxa de detecção nessa faixa etária registrou uma significativa queda de 35,4%, passando de 1,8 para 1,2 casos por 100 mil crianças.

“Em nossa ONG temos diversos casos de crianças que foram infectadas através do aleitamento materno e infelizmente a descoberta do ocorrido foi tardia, algumas dessas crianças já têm sequelas irreversíveis por conta das doenças causadas pela Aids”, pontua a presidente do PCA.  

O "Agosto Dourado" é um momento oportuno para reforçar a importância da não amamentação em casos de infecção por HIV/Aids e promover a conscientização sobre a prevenção, o diagnóstico precoce e o cuidado adequado para as mães e seus bebês. A adoção de medidas preventivas e a busca por assistência médica qualificada são fundamentais para garantir a saúde e o bem-estar de todos.  

Sobre o PCA  

O Projeto Criança Aids (PCA) é uma Organização Não Governamental (ONG) sem fins lucrativos que atende famílias em vulnerabilidade social responsáveis por crianças e adolescentes vivendo e convivendo com HIV/AIDS.  

O PCA atua desde 1991 no auxílio e no resgate da dignidade das crianças e seus familiares. Por meio de uma equipe de assistentes sociais, o Projeto visita regularmente as casas de todas as famílias responsáveis para conferir a frequência escolar, condições de saúde e moradia, além de ofertar cestas básicas mensais com produtos de higiene pessoal, limpeza doméstica e alimentos.

Atualmente, o Projeto atende cerca de 40 crianças, propiciando acolhimento e reflexão voltadas para o resgate psicossocial e educativo realizados por equipe interdisciplinar composta por: psicólogo, assistente social, farmacêutica, enfermeira, pedagoga, psicopedagoga e estagiários das áreas afins.