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A Urbanização no Brasil: desafios e caminhos para enfrentar o déficit habitacional

A necessidade de políticas públicas para resolver o problema de déficit habitacional no Brasil é urgente

Caio Belazzi* Publicado em 11/06/2024, às 06h00

Caio Belazzi, CEO da Alpop
Caio Belazzi, CEO da Alpop

Esse movimento no Brasil ocorreu de forma acelerada e desordenada, fruto de um enorme êxodo rural e da forte imigração de europeus fugindo do desemprego que assolou a Europa na virada do século XIX. O êxodo rural, normalmente associado ao processo de industrialização, teve no Brasil uma causa dupla: tanto a industrialização criou oportunidades de emprego e renda nos centros urbanos, quanto os grandes latifúndios, fortemente mecanizados, empurraram as pessoas do meio rural em direção às cidades.

Para se ter ideia da explosão urbana, entre 1920 e 1960, a população do Brasil cresceu 131%, saltando de 30,6 milhões para 70,9 milhões, enquanto a população urbana cresceu 1000% no mesmo período. A partir de 1970, a população urbana ultrapassou a população rural no Brasil.

Todo esse rápido processo, conjugado com a ausência de políticas públicas, levou a uma ocupação desordenada e ao forte desemprego, afetando sobretudo as pessoas de menor renda e empurrando-as para as periferias dos centros urbanos.

Atualmente, é chocante verificar que o Brasil ainda convive com um déficit habitacional da ordem de 6 milhões de unidades. Vale destacar que o déficit refere-se principalmente à inadequação das unidades habitacionais existentes. Essa inadequação é concentrada justamente nas famílias de menor renda, já que 74,5% do déficit está concentrado em famílias que se enquadram na Faixa 1 do Programa Minha Casa Minha Vida.

É evidente que se trata de um cenário bastante complexo e que apenas uma solução não é capaz de endereçar todos os desafios. Afinal, estamos falando de décadas em que saneamento, urbanização, transporte, emprego, renda e segurança caminharam de forma pouco articulada, impactando negativamente as famílias de mais baixa renda.

No entanto, há algumas estratégias e tecnologias que podem ser colocadas em prática. Por exemplo, o mercado de aluguel pode ser uma alternativa para endereçar parte do déficit. Dados recentes mostram que 77% das famílias que tiveram despesa com aluguel possuem renda familiar de até seis salários mínimos. No entanto, a ampla maioria dessas famílias aluga na informalidade e, por consequência, acessa imóveis de pior qualidade, localizados nas periferias dos centros urbanos. Curiosamente, isso ocorre não pela ausência de imóveis vagos, mas pela ausência de modalidades de garantias que permitam às famílias acessarem a locação formal, por meio de uma imobiliária.

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É intrigante notar que as próprias políticas de aluguel social e voucher aluguel enfrentam essa dificuldade. Normalmente, as famílias beneficiadas não conseguem comprovar suas fontes de renda, estão com o nome sujo e, desse modo, não conseguem formalizar o aluguel, muitas vezes retornando para áreas de ocupação, criando justamente o efeito contrário ao objetivo da política pública.

Esse cenário pode ser amplamente alterado com novas tecnologias analíticas, que ampliam o escopo da análise de crédito e se especializam em decifrar o perfil das famílias de baixa renda no Brasil. Além disso, é fundamental a alocação de capitais para desenvolver novas opções de crédito, garantindo, por um lado, as condições adequadas do acervo de imóveis, e por outro, servindo de garantia para imobiliárias e proprietários que hoje concentram as melhores ofertas de imóveis nos centros urbanos.

É possível, portanto, a partir do desenvolvimento tecnológico, da análise de riscos e da alocação de capitais, permitir que essas pessoas possam alugar imóveis melhores, próximos aos pontos de transporte público e à oferta de trabalho, critérios muito importantes para as famílias de menor renda. Ainda, é preciso que as políticas públicas atuem para que os centros urbanos dêem prioridade para habitações de interesse social, diversificando e democratizando o acesso aos centros das grandes cidades.

Na Alpop, acreditamos que o acesso à moradia de qualidade, por meio do aluguel formal, para famílias de renda popular pode ser uma importante contribuição para enfrentar o enorme desafio do déficit habitacional no Brasil. Esse processo deve ser desenvolvido a partir de uma visão onde a tecnologia de análise de riscos e a alocação de capitais permitem que as pessoas de mais baixa renda possam acessar as imobiliárias como os clientes dignos que são.

*Caio Belazzi é CEO da Alpop, fintech imobiliária de impacto social