Entenda a importância da educação financeira para jovens usarem o dinheiro de forma saudável
Luciana Pavan* Publicado em 30/05/2024, às 06h00
A educação financeira é de extrema importância no ambiente familiar, mas infelizmente acaba sendo esquecida, muitas vezes, porque os pais não tiveram essa experiência em suas famílias de origem e, consequentemente, acabam não sabendo como tratar o tema com seus filhos. Entretanto, é preciso encarar esse desafio e realmente educar os mais jovens para o uso saudável do dinheiro.
Costumo dizer que, da mesma forma que adultos leitores geram crianças interessadas por livros, bons exemplos dentro de casa se multiplicam também quando o assunto é letramento financeiro. Recentemente, tive acesso a uma pesquisa do SPC Brasil com um dado alarmante: 46% dos brasileiros não controlam suas finanças. Estamos falando de milhões de indivíduos economicamente ativos sem gestão de algo essencial para suas vidas.
No dia a dia, pode parecer difícil conciliar as tarefas diárias com a gestão das finanças para si — e para os outros, ainda mais se esses “outros” forem crianças. No entanto, para motivar o público a se enveredar por esse universo, costumo elencar três principais benefícios de educar financeiramente os filhos:
Futuro saudável: independentemente se essas crianças vão ou não receber uma herança, saber lidar com dinheiro é uma habilidade importantíssima tanto para a vida pessoal quanto profissional (qualquer que seja a sua profissão). Ressalto essa questão da herança porque muitas vezes há pais que usam isso como desculpa: “Vou deixar meu filho bem, não precisa se preocupar com isso.” É claro que precisa se preocupar, sim. Quantas vezes não vimos herdeiros acabando com todo um patrimônio?
Saúde mental: existem diversas pesquisas que mostram o impacto da desorganização financeira na saúde mental, causando principalmente ansiedade e depressão. Quem não deseja colocar a cabeça no travesseiro, ao fim do dia, sem a preocupação com questões relacionadas a dinheiro?
Futuro saudável dos pais: aqui, estou falando da liberdade financeira que os pais terão na época da aposentadoria caso não precisem ajudar seus filhos financeiramente. E por outro lado, uma segurança emocional de saber que os filhos estão tão bem que poderiam até ajudá-los se for preciso. Ou seja, é bom para os dois lados.
Contudo, seria ingênuo da minha parte dizer que esse modelo de gestão doméstica é uma tarefa simples, ainda mais em um país como o Brasil, onde as pessoas, historicamente, há uma população que viveu épocas de taxa de inflação superior a 80% ao mês. A meu ver, os principais desafios para trazer o tema ‘Educação financeira’ aos lares brasileiros são culturais. Como sempre falo com meus mentorados, não ter tido educação financeira na sua família de origem, escola ou faculdade é um dos principais fatores adversos. Era muito comum as gerações anteriores acharem que dinheiro não era “assunto de criança”.
Há ainda o fator “trauma”, isto é, pode ser que esses pais tenham tido péssimos exemplos de tratamento com dinheiro na família: desonestidade entre familiares, capital perdido em jogo ou brigas ocasionadas por esse pivô. Esse trauma pode ser até mesmo do próprio indivíduo, por ter se endividado e, consequentemente, perdido algo.
É impossível falar de “grana” e não associar com a autoimagem que fazemos de nós mesmos. Não estar em uma situação financeira saudável (como por exemplo, estar endividado ou estar com contas atrasadas) pode impactar a sua segurança e autoestima. “Como vou falar com meu filho sobre isso se não sei fazer certo nem pra mim?” Acredite, essa é uma pergunta muito comum, até mesmo entre pessoas que estão “em dia com as planilhas”.
Praticar infidelidade financeira é outro desafio, no meu ponto de vista. O que é isso? Basicamente, seria mentir (ou omitir) para o cônjuge sobre a sua real situação financeira. Ou seja, se você não fala nem com seu/sua companheiro/a, como vai falar com seu filho? Essa situação, muitas vezes, é ocasionada por vergonha, orgulho ou até mesmo um pensamento de “não preocupar” um ente querido. Mas não funciona, creia em mim. Quando a verdade aparece, é pior. E, no fim das contas, todos teremos que lidar com as adversidades, não é mesmo? Por que protelar?
Por fim, costumo citar um gargalo que é clássico, mas deve ser combatido: não ter boas práticas com seu próprio dinheiro. É o famoso “faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço”. Os pais podem conhecer a teoria, mas não a colocam em prática. E aí, não conseguem conversar com os filhos porque seriam péssimos exemplos.
Para superar esses desafios, o primeiro passo é entender qual é o “calcanhar de aquiles” da sua família, especificamente. Aqui dei alguns exemplos, mas podem haver muitos outros. Cada pessoa da família vem com sua experiência (e traumas!) com dinheiro e isso gera um contexto diferente, que precisa ser olhado separadamente.
Uma vez identificado, recomendo conversar muito (entre os pais primeiro) para entender como vão superar esses desafios. E aí, sim, podem conseguir passar seus ensinamentos de uma forma “independente”, sem transmitir seus traumas ou suas lembranças e emoções negativas sobre o dinheiro. Essa compreensão passa por muita análise e autoconhecimento — e claro, é sempre positivo contar com ajuda profissional, como terapia e mentoria financeira.
*Luciana Pavan é fundadora e idealizadora do 90 Segundos de Finanças