Estudo revela que 70% das mulheres brasileiras são mães, com 55% delas criando filhos sozinhas, as mães solo
Dra. Paula Marin* Publicado em 27/05/2025, às 06h00
O Datafolha aponta que 7 em cada 10 mulheres são mães no Brasil e que mais da metade desse contingente é solo. O retrato exato da maternidade no Brasil é composto por mães solo, viúvas ou divorciadas (55% do total), enquanto 45% vivem com um companheiro ou companheira.
A FGV também vem acompanhando o fenômeno das mães solo e registrou, entre os anos de 2012 e 2022, que o número de domicílios com mães solo cresceu 17,8%, passando de 9,6 milhões para 11,3 milhões.
Os dados das duas pesquisas refletem a realidade da mulher moderna brasileira, a maior inserção no mercado de trabalho e o maior tempo de estudo implicam no adiamento de um possível casamento e de uma possível maternidade.
E somado a esses dois fatores, temos pouco conhecimento sobre planejamento reprodutivo. Passamos a vida toda sendo incentivadas a estudar e a trabalhar. Na escola, no núcleo familiar, no nosso grupo de amigas, a principal preocupação é ‘evitar a gravidez para não atrapalhar o futuro’. E quando ‘o futuro’ chega, tudo o que sabemos sobre planejamento reprodutivo é relativo à contracepção: o que fazer para não engravidar. Esta é uma visão ultrapassada, que já deveria ter sido superada nos consultórios ginecológicos.
A mulher quando decide não engravidar ou adiar a gravidez por qualquer razão deve saber no que essa decisão pode implicar. O planejamento reprodutivo envolve fazer o letramento da mulher sobre contracepção, mas também e principalmente deve trazer conhecimento sobre relógio biológico, reserva ovariana, fertilidade e possibilidades de preservação da fertilidade, dentre muitos outros temas importantes.
Planejamento reprodutivo não é só sobre não engravidar, mas sim engravidar quando a mulher quiser. E para conseguir planejar isso corretamente, conhecimento é necessário.
A fertilidade da mulher declina com a idade. A mulher deveria aprender na escola que a sua reserva ovariana vai decaindo quantitativa e qualitativamente, que as chances de gravidez vão sendo menores com o passar dos anos, principalmente após os 35 anos, que ela poderá precisar de ajuda médica para engravidar e que as técnicas de reprodução assistida não são capazes de resolver todos os casos de infertilidade no futuro.
Todas as mulheres deveriam ter acesso a essas informações no momento correto, que seria no início da vida reprodutiva, e não lá na frente, quando precisarem procurar um especialista em Reprodução Humana Assistida por dificuldade para engravidar. O planejamento reprodutivo deve ser encarado como item essencial na vida da mulher. Mas, infelizmente, como a mulher sabe muito pouco sobre fertilidade, planejamento reprodutivo, ouço muito no consultório: ‘será que perdi a minha oportunidade de ser mãe?.
A maternidade solo, a gravidez monoparental, ou a famosa “produção independente” dos anos 80, surge nesse momento. Quando o tempo passou, a fertilidade está diminuindo e o parceiro ideal ainda não surgiu.
A Medicina Reprodutiva oferece caminhos, soluções. Alguns tratamentos são de aceitação mais difícil, como: óvulos de doadora, útero de substituição, banco de sêmen. Mas se a paciente permitir o emprego de todos os recursos possíveis (e obviamente dentro das normas do Conselho federal de Medicina), a gravidez monoparental pode ser viabilizada.
Mais comumente, as mulheres recorrem primeiro aos bancos de sêmen, que são úteis porque as mulheres podem escolher doadores de sêmen com base em características genéticas, aparência física, etnia, histórico educacional, histórico familiar, perfis de personalidade e hobbies.
Escolher um doador de sêmen é uma decisão muito pessoal. Deve-se levar em conta características físicas. Alguns bancos de sêmen trazem informações adicionais como hobbies, aptidões e profissão.
Uma triagem genética entre a mãe e o potencial doador de sêmen precisa ser feita para garantir que não existam condições genéticas recessivas que podem levar ao desenvolvimento de doenças no bebê.
Depois de escolher o banco de sêmen, é importante considerar qual o tratamento de fertilidade é o mais adequado. As duas principais opções de tratamento são a inseminação intrauterina (IIU) e a fertilização in vitro (FIV). Na IIU, o sêmen do doador é colocado diretamente no útero na época da ovulação, quando as chances de concepção são maiores. Mas dependendo da idade da mulher e de outros fatores de infertilidade existentes, a fertilização in vitro pode ser o melhor tratamento.
Existem muitas razões pelas quais uma doadora de óvulos pode ser necessária para que a gravidez monoparental seja alcançada. As mais comuns são a idade da mulher, baixa reserva ovariana e falência ovariana prematura.
A mulher pode optar por adotar óvulos. A doação pode ser feita de forma anônima, entre parentes de até 4° grau ou a mulher pode ainda optar por um banco de óvulos. Ao encontrar uma doadora de óvulos saudáveis e de boa qualidade, frequentemente observamos resultados melhores nas taxas de natalidade.
Se a mulher é clinicamente incapaz de engravidar, o uso de um útero de substituição, popularmente chamado de “barriga de “aluguel” ou “barriga solidária", a ajudará a realizar o sonho da maternidade. A candidata passará por uma triagem médica abrangente a fim de ser medicamente liberada para ser o útero de substituição.
Segundo os dados da pesquisa da FGV, a maior parte das mães solo do Brasil (72,4%) vive em domicílios monoparentais, sendo compostos apenas por elas e seu(s) filho(s). Ou seja, não moram com parentes ou agregados que teriam o potencial de ajudar nas responsabilidades familiares e na promoção do equilíbrio entre vida pessoal, família e trabalho.
É por causa desse grupo de famílias monoparentais chefiado por mulheres que abandonamos o emprego do termo ‘mãe solteira’. O estado civil da mãe não quer dizer necessariamente que os cuidados com o filho são compartilhados. ‘Mãe solo’ é mais adequado para agrupar as mulheres que enfrentam os mesmos desafios, asmesmas batalhas diárias que qualquer outra mulher para sustentar sua família, sem a presença de um companheiro, e com todas as responsabilidades que a maternidade impõe.
*Dra. Paula Marin é formada pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), com Residência Médica em Ginecologia e Obstetrícia no Hospital das Clínicas da USP. Sócia da Clínica Mater Prime, em São Paulo, clínica de Reprodução Humana onde atende hoje. Dedica-se exclusivamente à área de Reprodução Humana, com foco principal no congelamento de óvulos.