Como empresas podem incluir e reter talentos com excelência
Juliana Amorina* Publicado em 04/12/2023, às 06h00
A crescente conscientização sobre os benefícios de uma equipe neurodiversa, incluindo pessoas com Dislexia, Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) e Transtorno do Espectro Autista (TEA), têm ressaltado a importância desses talentos no mercado de trabalho. Atualmente, cerca de 15% da população mundial tem algum transtorno do neurodesenvolvimento, demandando uma abordagem ajustada e mais inclusiva por parte das empresas. Alguns procedimentos rotineiros adotados no mundo corporativo são exclusivos e passam despercebidos devido à falta de consciência sobre a diversidade do funcionamento cognitivo humano. Apesar de suas diferenças em relação aos chamados “neurotípicos”, pessoas com essas condições têm habilidades igualmente ou até mais vantajosas para certas necessidades do mercado de trabalho.
Empresas têm reconhecido a contribuição das habilidades específicas e valiosas de pessoas com Dislexia, TDAH ou TEA. O relatório "A diversidade vence: como a inclusão é importante", da McKinsey & Company (2020), destaca que equipes consideradas diversas superam as homogêneas em 36% em termos de rentabilidade. No entanto, apesar desses avanços, persistem desafios relacionados à falta de compreensão e estigma em torno dessas condições. Na prática, o processo de exclusão começa na porta das empresas, onde lá se perdem talentos ainda no processo seletivo, justamente por conduzi-lo de forma não inclusiva.
Uma colega e grande profissional do meio, Rute Rodrigues, Diretora de operações da Specialisterne - organização dinamarquesa de impacto social que capacita e inclui pessoas com deficiência para o mercado de trabalho - costuma dizer que a exclusão muitas vezes inicia-se na divulgação das vagas, onde descrições genéricas podem desencorajar candidatos qualificados, como, habilidades de comunicação oral e escrita e de adaptabilidade com muitas mudanças, que são tópicos sensíveis para quem apresenta um funcionamento cognitivo específico. Nesses casos, é válido que os contratantes reflitam o que realmente precisam para a vaga e adotem critérios mais reais para oportunidades ditas inclusivas. O processo de entrevista também requer ajustes, preferindo tarefas específicas em detrimento de dinâmicas em grupo, permitindo uma avaliação mais precisa das habilidades do candidato. Entrevistas tensas e que testam mais a capacidade de venda de um discurso do que a habilidade em uma área de fato poderiam ser facilmente contornados com mudanças simples - bastava que o candidato realizasse tarefas específicas da área ou função almejada.
A etapa de treinamento, crucial para a integração bem-sucedida do profissional, exige uma compreensão aprofundada das características de cada colaborador. As adaptações inclusivas não necessariamente são arquitetônicas e complexas - elas podem ser de acessibilidade comunicacionais, metodológicas, como as aplicadas em formas diferentes de avaliação de desempenho, entre outros, a depender da condição da pessoa.
Já na minha área de expertise, que é a Dislexia, posso dizer que, Tecnologia Assistiva é muito bem-vinda, já que, quando se trata desse transtorno específico da aprendizagem, a pessoa possui dificuldades persistentes e específicas na leitura e na escrita. Então, com essas adaptações simples, todo o cenário muda para um disléxico, permitindo que ele se desenvolva e demonstre o seu potencial por completo na área específica de trabalho requisitada.
Mais a longo prazo, após a adesão desses profissionais nas empresas, outro ponto de atenção é aos métodos de avaliação de desempenho que, adequado às condições de cada um, não devem seguir um mesmo padrão. Nesse caso, a régua para certos critérios deve ser dosada e analisada criteriosamente, sempre visando atingir um cenário de equidade e não necessariamente de igualdade.
A convivência de pessoas diversas amplia a inovação, criatividade e habilidades de resolução de conflitos nas empresas. A promoção de oportunidades equitativas não apenas contribui para o desenvolvimento pessoal, mas também beneficia as organizações ao melhorar a qualidade de ideias, serviços, produtos e experiências. A diversidade enriquece o ambiente de trabalho e impulsiona o sucesso coletivo - na vida e no ambiente de trabalho. Ao abraçar essa faceta, as empresas não apenas cumprem um imperativo ético, mas também ampliam suas perspectivas, promovendo a inovação e construindo equipes mais resilientes e bem-sucedidas.
*Juliana Amorina é diretora-presidente do Instituto ABCD
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