Pode acontecer de o diagnóstico de dislexia não ser feito na infância, por isso é importante estar atento aos sinais na vida adulta
Juliana Amorina* Publicado em 10/06/2024, às 06h00
Frequentemente associada à infância, a Dislexia é uma condição que persiste ao longo da vida, impactando de forma significativa a experiência dos adultos tanto no ambiente de trabalho quanto no dia a dia. O que muitos desconhecem é que o diagnóstico em adultos acaba sendo um processo bastante complexo, muitas vezes subestimado, mas crucial para fornecer o suporte adequado para essas pessoas e para compreensão dos desafios que existem.
Detectar a Dislexia na fase adulta pode ser mais complicado do que na infância, quando as dificuldades de leitura e escrita tendem a ser mais visíveis e, portanto, facilmente identificáveis. Em adultos, essas dificuldades podem ser mascaradas por estratégias compensatórias desenvolvidas com o passar dos anos. Sua descoberta geralmente envolve uma análise multidisciplinar, incluindo testes linguísticos e cognitivos, avaliações de diversas especialidades e entrevistas detalhadas que consideram a história educacional e profissional da pessoa. A participação de profissionais como médicos, neuropsicólogos e fonoaudiólogos é essencial para um diagnóstico certeiro.
Muitos adultos só descobrem que são disléxicos após enfrentar anos de dificuldade em tarefas que exigem leitura e escrita. O diagnóstico tardio pode resultar em um histórico de frustrações e sentimentos de inadequação que afetam negativamente a autoestima e a saúde mental. Aliado a isso, somam-se as dificuldades no mercado de trabalho.
Ou seja, os desafios enfrentados por adultos disléxicos são muitos e variam conforme a natureza das funções desempenhadas. O transtorno da aprendizagem pode comprometer a velocidade de leitura, a compreensão de textos complexos, a escrita coerente e sem erros, bem como a capacidade de seguir instruções escritas mais detalhadas. Em profissões que exigem um alto nível de precisão na leitura e na escrita, como direito e medicina, até em atividades administrativas, esses desafios podem ser particularmente intensos.
No entanto, existem métodos avançados, como tecnologias assistivas, que incluem softwares de leitura e escrita, o que pode facilitar a execução de tarefas cotidianas e contribuir para a adaptação. Além disso, treinamentos específicos sobre Dislexia e outros transtornos da aprendizagem podem ajudar a promover uma maior compreensão e permitir que as pessoas com essa condição tenham uma vida plena, mostrando seu valor para toda sociedade.
Aliado a isso, um novo estudo aponta que pessoas com Dislexia foram importantes para a nossa evolução como espécie. De acordo com pesquisadores da Universidade de Cambridge, no Reino Unido, o cérebro dessas pessoas também é capaz de explorar o desconhecido. Esse 'viés exploratório' tem uma base evolutiva e desempenha um papel crucial em nossa sobrevivência.
Para chegar a essa conclusão, a equipe reexaminou estudos experimentais em psicologia e neurociência que envolviam cognição, comportamento e cérebro. Os resultados foram evidenciados em todos os domínios de análise, do processamento visual à memória. Esta foi a primeira vez que uma abordagem interdisciplinar usando uma perspectiva evolutiva é aplicada na análise de estudos sobre Dislexia.
Apesar dessa nova descoberta, ainda existe outro desafio significativo que é o estigma associado à Dislexia. Muitos adultos costumam hesitar em revelar sua condição por medo de discriminação ou de serem vistos como menos competentes. Isso pode resultar em um ambiente de trabalho hostil e em oportunidades perdidas de avanço na carreira. É importante que as empresas adotem políticas de inclusão e acessibilidade que promovam a diversidade neurodivergente e reconheçam as habilidades únicas que adultos disléxicos podem trazer para o local de trabalho, como pensamento criativo, resolução de problemas e habilidades especiais.
Ou seja, a Dislexia na vida adulta é uma questão que exige maior conscientização e esforços contínuos para garantir que essas pessoas sintam-se acolhidas e recebam o apoio necessário. O diagnóstico precoce, mesmo na idade adulta, pode abrir portas para estratégias eficazes de enfrentamento e para a adaptação do ambiente de trabalho, promovendo um espaço mais inclusivo e produtivo. A sociedade e os empregadores têm a responsabilidade de reconhecer e valorizar a diversidade cognitiva, criando oportunidades para que todos possam alcançar seu pleno potencial.
*Juliana Amorina é diretora-presidente do Instituto ABCD
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