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Diagnóstico de dislexia no SUS

Um guia passo a passo para buscar diagnóstico e tratamento de dislexia no SUS

Juliana Amorina* Publicado em 15/01/2024, às 06h00

A dislexia precisa de acompanhamento adequado
A dislexia precisa de acompanhamento adequado

A dislexia é um transtorno específico da aprendizagem que impacta de forma direta as habilidades de leitura e escrita de um indivíduo. No Brasil, existem muitas barreiras que dificultam o acesso ao diagnóstico e ao tratamento da dislexia, tanto no âmbito público quanto no privado, porém, mesmo com os desafios, as grandes filas de espera e restrições de equipe em alguns municípios, o Sistema Único de Saúde (SUS) oferece recursos para a busca de diagnóstico e tratamento da dislexia.

Como esse processo não costuma ser simples, buscamos neste guia passo a passo, discutir como procurar um diagnóstico de dislexia no SUS, destacando a importância da documentação adequada, da interação com profissionais de saúde e do entendimento do processo de diagnóstico, para tentar amenizar os desafios inerentes a essa jornada.

Por que ir atrás do diagnóstico?

A procura do diagnóstico da dislexia permite a estruturação de uma documentação detalhada das dificuldades e também dos potenciais de cada indivíduo. No contexto escolar, é o documento formal que garante as acomodações e adaptações pedagógicas necessárias. A avaliação permite que o especialista, a escola e a família planejem e acompanhem o processo interventivo e o desempenho do disléxico ao longo tempo, analisando se as recomendações propostas estão sendo suficientes para o desenvolvimento das habilidades de linguagem ou se é necessário rever o processo de acompanhamento especializado e/ou escolar.

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No que se refere a políticas públicas, o registro do diagnóstico permite quantificar quantas pessoas têm essa condição em nosso país. Desta forma, os gestores públicos podem planejar melhor o investimento de recursos nesta área, seja no diagnóstico, seja no ambiente escolar, seja em campanhas de conscientização.

Além disso, o diagnóstico permite ao disléxico entender a origem de sua dificuldade, o que normalmente auxilia em questões emocionais e na autoestima.

Agora, prestes a entrarmos no passo a passo, vamos discutir algumas questões que devem estar no radar de quem está investigando um possível diagnóstico de dislexia. Partindo do princípio de que a dislexia é um transtorno específico da aprendizagem relacionado à alterações no processamento da linguagem e na sua associação com símbolos escritos, devem ser investigadas as habilidades de linguagem oral (como o vocabulário, por exemplo), o processamento fonológico (incluindo a consciência fonológica, a memória fonológica e a velocidade de nomeação), a competência leitora (partindo das habilidades básicas de associação fonema-grafema e decodificação, mas também considerando a fluência e compreensão leitora) e a competência de escrita. Faz parte da avaliação diagnóstica a análise das habilidades cognitivas que, além de apoiar e fundamentar a elaboração da hipótese diagnóstica, permitem a identificação de outras condições que também podem impactar o processo da aprendizagem.

Além da avaliação das habilidades de linguagem e cognitivas mencionadas anteriormente, é fundamental coletar informações detalhadas sobre o desenvolvimento da criança ou adolescente. Esse processo pode envolver diálogos e/ou questionários com a família, bem como a análise minuciosa do histórico escolar do indivíduo.

Ao conduzir uma avaliação abrangente, deve-se examinar habilidades específicas, tais como raciocínio lógico, atenção e memória. Estas são áreas fundamentais que, quando analisadas em conjunto com as habilidades linguísticas, proporcionam uma visão mais completa do perfil cognitivo do indivíduo.

As habilidades matemáticas também desempenham um papel determinante no processo diagnóstico. Alunos com dislexia podem enfrentar desafios ao memorizar e nomear informações numéricas, como a tabuada, pois, apesar de apresentarem habilidades matemáticas adequadas na realização de cálculos e na resolução de problemas, um desempenho inferior pode acabar surgindo por resultado da dificuldade em compreender os enunciados dos problemas devido à dislexia.

Ainda assim, é essencial discernir se as dificuldades observadas são exclusivamente decorrentes da dislexia ou se indicam a presença de discalculia, um transtorno específico da aprendizagem que compromete as habilidades da matemática, que implicam na compreensão de conceitos de quantidade, na realização de cálculos, na resolução de problemas e na compreensão de sequências matemáticas. Esta análise mais aprofundada contribui para uma compreensão mais abrangente das necessidades do indivíduo, permitindo estratégias de intervenção mais personalizadas e eficazes.

Após toda essa análise do perfil de dificuldade do indivíduo a ser diagnosticado, apresento o passo a passo do Guia do Diagnóstico da Dislexia pelo SUS.

Passo 1: Documentação Necessária e Preparação Inicial

Antes de adentrar no processo de busca de diagnóstico, é essencial reunir a documentação requisitada. Certifique-se de ter em mãos a identidade da criança, comprovante de residência e o cartão do SUS. No caso de ausência deste último, oriente-se sobre como obtê-lo na Unidade Básica de Saúde (UBS) mais próxima, popularmente conhecida como "postinho". Recomenda-se ainda levar consigo um eventual encaminhamento escolar ou relatório recente, a fim de fornecer informações detalhadas sobre as dificuldades enfrentadas.

Passo 2: Busque a Unidade Básica de Saúde (UBS)

Localize a Unidade Básica de Saúde (UBS) mais próxima da sua residência. Essa é a primeira etapa para acessar os serviços de saúde disponíveis pelo SUS. Os profissionais da equipe de saúde poderão, então, identificar os cuidados necessários para cada pessoa, direcionando-os para a própria unidade ou encaminhando para outros serviços especializados na rede de saúde. Se possível, agende uma consulta com o pediatra ou médico da família da UBS, proporcionando uma abordagem mais personalizada.

Para aqueles que não sabem a qual UBS recorrer, o telefone 156 é um recurso valioso para obter informações e esclarecimentos sobre a localização e os serviços oferecidos nas unidades de saúde da região.

Passo 3: Diálogo com o Médico

Ao chegar na consulta, estabeleça um diálogo efetivo com o médico. Este é o momento crucial para compartilhar informações relevantes. Caso a criança possua encaminhamento ou relatório escolar, inicie a conversa explicando que a escola identificou dificuldades de aprendizado. Descreva detalhadamente o desenvolvimento da criança, concentrando-se nas dificuldades específicas. É fundamental que o médico compreenda se as barreiras se limitam à leitura e escrita ou se abrangem outras áreas do desenvolvimento, como coordenação motora, alimentação, sono e comunicação.

Adicionalmente, informe ao médico sobre eventuais exames de audição e visão já realizados, bem como quaisquer problemas de saúde ou medicamentos em uso pela criança. Caso exista um histórico familiar de dificuldades semelhantes, esse é o momento de comunicar ao médico. Se houver resultados do EduEdu Dislexia, uma ferramenta educacional aplicável, compartilhe-os para enriquecer a avaliação.

Passo 4: Expectativas para a Consulta Médica

Após a interação inicial, é provável que o médico encaminhe a criança para avaliações mais específicas, conduzidas por profissionais especializados. A equipe pode ser constituída por psicólogo, neuropsicólogo, fonoaudiólogo, médico (pediatra, neuropediatra, neurologista e/ou psiquiatra) e psicopedagogo, que realizarão avaliações mais aprofundadas.

A equipe multidisciplinar traz consigo a vantagem de realizar uma avaliação completa, na qual cada especialista contribui com sua perspectiva única e conhecimentos específicos. Para assegurar o bom funcionamento da avaliação multidisciplinar, é essencial que a equipe se reúna para compartilhar os resultados das avaliações especializadas, alcançando assim uma conclusão abrangente que considere todas as áreas investigadas. Esteja preparado para seguir as orientações dos profissionais e participar ativamente do processo de diagnóstico.

Cada caso é único, e é importante ressaltar que o diagnóstico e tratamento da dislexia podem variar de acordo com as características individuais. Ao seguir esses passos, você estará iniciando o processo de busca de apoio no SUS para entender e lidar com as dificuldades de aprendizado associadas à dislexia. Esteja comprometido e envolvido no processo, pois isso contribuirá significativamente para o bem-estar e desenvolvimento da criança.

O processo de avaliação deve incluir a produção de um relatório com informações relevantes e orientações para a pessoa com dislexia e sua família. Quando se tratar de criança ou adolescente, é importante que a escola também receba um relatório contemplando estratégias de ensino e outras recomendações para atender às necessidades do aluno.

Em conclusão, embora o processo de diagnóstico da dislexia possa ser desafiador e complexo, sua importância transcende as dificuldades enfrentadas. Esta jornada desempenha um papel fundamental na garantia dos direitos, proporcionando as adaptações necessárias, nos ambientes escolares e de políticas públicas, principalmente. Através do diagnóstico, abre-se a porta para a criação e execução de estratégias de aprendizagem mais eficazes, possibilitando que o disléxico alcance seu potencial máximo. Em última análise, investir no diagnóstico da dislexia é investir no empoderamento individual do ser e na construção da autoestima através do autoconhecimento.

*Juliana Amorina é diretora-presidente do Instituto ABCD