A Lei 10.639/03, promulgada há 20 anos, obriga o ensino de História e Cultura Africana e Afro-Brasileira nas escolas
Redação* Publicado em 10/10/2023, às 06h00
Sete em dez Secretarias Municipais de Educação da região Sudeste do Brasil realizam pouca ou nenhuma ação para cumprir a Lei 10.639/03, promulgada há 20 anos, e que estabelece a obrigatoriedade do ensino de História e Cultura Africana Afro-Brasileira nas escolas públicas e privadas. Esses dados foram obtidos por meio de uma análise regional da pesquisa Lei 10.639/03: a atuação das Secretarias Municipais de Educação no ensino de história e cultura africana e afro-brasileira, realizada por Geledés Instituto da Mulher Negra e pelo Instituto Alana, com 1.187 Secretarias Municipais de Educação em todo o Brasil, o que corresponde a 21% dos municípios do país.
A pesquisa completa e seus recortes regionais podem ser obtidos neste link.
Esses dados da região seguem a média nacional, em que 71% das secretarias organizam pouca ou nenhuma ação ligadas ao tema. O Sudeste foi a segunda região do país que mais respondeu ao estudo: 238 secretarias (20% do total de respondentes do estudo).
O Espírito Santo, o estado com maior participação da região, teve 29% de adesão à pesquisa, seguido por Rio de Janeiro (23%); São Paulo (22%) e Minas Gerais (apenas 6%). No levantamento, estados com menos de 20% de municípios respondentes não permitem generalização da análise.
Nesse contexto, o Rio de Janeiro inverte a média nacional, uma vez que 71% das secretarias do estado implementam ações antirracistas (ao contrário da média nacional, em que 71% descumprem a lei). 57% dos municípios do Rio de Janeiro e 26% dos municípios do Espírito Santo afirmam ter regulação sobre o tema, mas ainda investem pouco na realização de ações.
São Paulo é o estado da região que mais negligencia a lei, com 74% de suas secretarias tendo pouca ou nenhuma atuação na garantia da sua efetividade. Minas Gerais teve adesão de só 49 secretarias (6% do total de municípios do estado). Dessas, 67% não implementam a lei e 10% afirmam existir uma regulamentação específica.
Para mais dados sobre cada um dos estados do Sudeste, acesse aqui a ficha técnica com o resumo regional.
A pesquisa mostra, também, que a maioria das ações realizadas por secretarias desses estados para apoiar as escolas no ensino de história e cultura africana e afro-brasileira são orientações sobre medidas a serem tomadas em casos de racismo e orientações sobre práticas pedagógicas e atividades didáticas.
A percepção dos municípios respondentes sobre os desafios para a implementação da lei é a de que há ausência de apoio de governos, organizações e empresas, além da dificuldade dos gestores e profissionais em transpor o que está previsto nos currículos para os projetos das escolas.
Outro desafio identificado na região está no alocamento de recursos específicos para o cumprimento da lei. Ainda que cerca de 40% do território nacional realize investimentos e disponibilize recursos financeiros, apenas 8% das secretarias do Brasil e 10% do Sudeste possuem orçamento específico para implementá-la.
"A Lei 10.639/03 é a principal ferramenta para combater o racismo e para construir uma perspectiva positiva sobre as contribuições da população africana e afro-brasileira na nossa história e cultura, o que contribui para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária”, comenta Beatriz Benedito, analista de políticas públicas do Instituto Alana.
“Nesse sentido, governos, sociedade e escolas devem unir esforços para realizar ações de fortalecimento da administração pública, com o uso de indicadores de raça e cor para formulação e monitoramento de políticas educacionais, como também para a formação de professores e a escolha de materiais didáticos adequados. É um processo complexo e que demanda tempo e esforço imediato desses diferentes atores”.
Como foi feito o estudo | A pesquisa “Lei 10.639/03: a atuação das Secretarias Municipais de Educação no ensino de história e cultura africana e afro-brasileira” foi desenvolvida em duas etapas: quantitativa e qualitativa. Em abril de 2023, foram publicados os resultados da etapa quantitativa.
Os dados desta etapa foram coletados por meio de um formulário de auto preenchimento voluntário, respondido pelas secretarias ao longo de 2022. Participaram 1.187 Secretarias Municipais de Educação, ou seja, 21% de todos os municípios brasileiros, com respondentes nas cinco regiões do país.
Foram verificadas como e se as secretarias respondentes construíram condições para combater o racismo estrutural, quais os passos percorridos, as lacunas existentes e os desafios que compõem o grave cenário da implementação da Lei 10.639/03 nas redes municipais de ensino, principais responsáveis pela educação básica do país. A etapa qualitativa, que investiga a aplicação prática da lei sobre história e cultura afro-brasileira em seis municípios, será divulgada em novembro de 2023.
“Nós esperamos que este estudo contribua para a discussão sobre como a intencionalidade de organização das secretarias para induzir e fortalecer a implementação da lei, por meio do planejamento articulado e contínuo, impacta a atuação das redes escolares no combate ao racismo”, diz Tânia Portella, representante do Geledés.
“Se colocada em prática, a lei pode impactar a vida de todos os estudantes e profissionais da educação, ao trazer referências que dialogam com os saberes de todos os povos e realidades, promovendo mudanças de percepções e comportamentos nas pessoas. Impacta a comunidade escolar, o entorno e com o tempo, se deseja alcançar um conjunto mais amplo da sociedade a partir do conhecimento, reconhecimento e valorização de realidades e abordagens que foram invisibilizadas ao longo da história brasileira”, finaliza.
A pesquisa é uma iniciativa conjunta de Geledés e Alana, encomendada à Plano CDE, recebeu o apoio da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), da União Nacional dos Conselhos Municipais de Educação (Uncme) e da Imaginable Futures.
*Sobre Geledés Instituto da Mulher Negra
É uma organização da sociedade civil que se posiciona em defesa de mulheres e negros, pois são segmentos sociais que padecem de desvantagens e discriminações no acesso às oportunidades sociais em função do racismo e do sexismo vigentes na sociedade brasileira. Posiciona-se também contra todas as demais formas de discriminação que limitam a realização da plena cidadania, tais como lesbofobia, transfobia, bifobia, homofobia, os preconceitos regionais, de credo, de opinião e de classe social.
*Sobre o Instituto Alana
O Instituto Alana é uma organização de impacto socioambiental que promove e inspira um mundo melhor para as crianças. Um mundo sustentável, justo, inclusivo, igualitário e plural. Um mundo que celebra e protege a democracia, a justiça social, os direitos humanos e das crianças com prioridade absoluta. Um mundo que cuida dos seus povos, de suas florestas, dos seus mares, do seu ar.
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