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Mulheres que movem destinos: o empreendedorismo feminino no turismo como potência de transformação

O Instituto Aupaba surge como uma resposta à necessidade de capacitação e apoio para mulheres empreendedoras no turismo

Luciana De Lamare* Publicado em 12/08/2025, às 10h00

Empreendedorismo feminino - Divulgação
Empreendedorismo feminino - Divulgação

Em um país onde 70% das estudantes de cursos técnicos em turismo são mulheres, é surpreendente que apenas 35% dos sócios de empresas turísticas sejam do sexo feminino. Essa contradição escancara não só os obstáculos estruturais que limitam a autonomia das mulheres no mercado de trabalho, como também revela uma urgência: é preciso repensar o que significa empreender — principalmente no turismo.

Muitos ainda associam o empreendedorismo turístico a abrir uma pousada ou se tornar guia de turismo autônoma. Sim, essas são possibilidades legítimas. Mas o setor vai muito além disso: envolve operações empresariais complexas como agências, operadoras, empresas de transporte, plataformas digitais e projetos de impacto socioambiental. E aqui mora a grande questão: mulheres que desejam empreender nesse campo frequentemente enfrentam falta de acesso a crédito, ausência de redes de apoio e, muitas vezes, não conseguem sequer se imaginar fora dos papéis tradicionais que a sociedade ainda lhes impõe.

Na prática, o empreendedorismo feminino esbarra em aspectos culturais profundos: a ausência de educação financeira, a sobrecarga com as tarefas domésticas, a falta de incentivo para sonhar grande. Muitas mulheres vivem entre a novela da noite e um feed repleto de distrações, sem estímulos reais para perceber que podem ser protagonistas de suas histórias. A falta de tempo, apoio e referências concretas torna o ato de empreender não uma escolha, mas quase uma travessia solitária.

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Foi nessa lacuna que nasceu o Instituto Aupaba — uma organização criada por mulheres, com alma feminina e propósito regenerativo. Nossa missão não é apenas capacitar mulheres para atuarem no turismo, mas ajudá-las a compreenderem que sua vida pessoal e profissional são faces da mesma jornada. Não há como separar quem somos do que fazemos. Cada empreendedora é, antes de tudo, sua própria marca, seu território e sua potência.

Empreender em turismo pode — e deve — ser um projeto de vida. Não se trata apenas de rentabilidade, mas de encontrar formas sustentáveis e autorais de viver. Uma mulher pode construir seu caminho como guia, sim, mas também pode liderar projetos de regeneração territorial, criar experiências turísticas sensíveis que valorizem o patrimônio imaterial, desenvolver plataformas, trabalhar com narrativas, hospitalidade afetiva, bioeconomia, redes de saberes. O turismo oferece múltiplas possibilidades para que mulheres realizem seus sonhos e também gerem prosperidade para seus territórios.

Ainda assim, os dados nos alertam: a taxa de empreendedorismo estabelecido entre mulheres é de apenas 13,9%, enquanto entre homens é de 18,4%. Muitas abandonam seus negócios no meio do caminho. Por quê? Porque, sozinhas, não conseguem sustentar uma estrutura que exige planejamento, capital, apoio técnico e confiança. E confiança, vale lembrar, é um ativo que nos é negado desde cedo — nos lares, nas escolas, nos conselhos de empresa.

É preciso transformar a forma como formamos e apoiamos mulheres no empreendedorismo turístico. Um ecossistema de negócios com propósito só será realmente regenerativo se colocar as mulheres no centro — não como beneficiárias, mas como lideranças. Estudos indicam que empresas com mulheres em cargos executivos têm melhor desempenho em indicadores ESG, especialmente em sustentabilidade ambiental. Isso não é coincidência. É visão, é cuidado, é intuição estratégica. É o feminino que transforma.

No Aupaba, acreditamos que promover o empreendedorismo feminino em turismo é plantar autonomia e colher futuro. Um futuro onde mulheres possam criar, estudar, cuidar, gerar renda e ainda assim estar com suas famílias. Onde possam evoluir. Porque, no fim, empreender é isso: um exercício contínuo de evolução. E nenhuma transformação é possível sem mulheres livres para serem o que quiserem.

*Luciana De Lamare é jornalista, mestre em turismo, palestrante e especialista em turismo regenerativo. Fundadora e presidente do Instituto Aupaba — ONG referência em design regenerativo para o turismo e desenvolvimento territorial no Brasil. Saiba mais: www.institutoaupaba.org