Com o tema inclusão e diversidade em alta, qual é o papel da escola para promover a convivência de superdotados?
Roberta Castro* Publicado em 15/01/2023, às 06h00
Ser mãe de um superdotado, uma criança atípica, me permitiu recentemente esta reflexão. Como as escolas se comportam quando são apresentadas e convidadas a incluir em sua instituição uma criança com esse perfil?
Antes de entrar especificamente neste tema, me permitam voltar algumas casas atrás nesse imenso jogo de tabuleiro para contar um pouco sobre a trajetória de mãe de uma criança com inteligência acima da média.
Sou mãe do Filippo Castro Morgado, uma criança de seis anos que aos três era fluente em inglês autodidata. Aos cinco, começou a ler e escrever em Russo e, mais recentemente, tem estudado o idioma do Cazaquistão e Grego, além de resolver raiz quadrada de números complexos e todas as operações matemáticas.
Pippo, como carinhosamente chamamos, aprendeu a ler placas de carro aos 2 anos e percebemos ali que algo diferente havia com o desenvolvimento intelectual dele. Após a busca por esclarecimentos, testes, laudos, consultas com neuropediatras, neuropsicólogos e outros especialistas da área, recebemos o diagnóstico de um QI 134 (normal é de 90 a 110) e a segunda parte desta luta começou.
Como encontrar a escola ideal para potencializar suas fortalezas e auxiliar em suas fraquezas? Sim, porque existem áreas complexas neste perfil de criança, principalmente relacionadas ao lado comportamental que, por serem críticos, metódicos e muitas vezes autopunitivos, se não trabalhadas com atenção, podem ocasionar em sérios problemas de caráter social, por exemplo.
E para nossa feliz surpresa, uma escola aceitou aprender conosco e criar uma jornada positiva de desenvolvimento para o Filippo, promovendo a socialização, incentivando suas áreas de interesse (raciocínio lógico, memória e idiomas) e apresentando novas aptidões, incluindo orientações previstas no laudo técnico. Bingo. Pippo é completamente apaixonado pela instituição, nunca entrou ou saiu chorando de lá e neste ano apresentou melhorias no lado social e alta performance em suas áreas de interesse graças a metodologia ativa presente na escola, que olha para o todo e ao mesmo tempo para o indivíduo e suas capacidades específicas.
Uma grande exceção se eu pegar como parâmetro, por exemplo, as atuais 350 famílias que presto apoio em um grupo na internet. De Norte a Sul do Brasil e de diversos outros países do mundo, o que eu mais leio, ouço e debato no grupo é a dificuldade que as escolas têm de aceitar crianças com este perfil, auxiliá-los com bolsas de estudo para promover e garantir o desempenho acadêmico acima da média deles nas instituições e capacitar seus profissionais para entender e atender essas crianças atípicas.
Exemplos não me faltam: Aline, mãe de gêmeos superdotados de São Paulo, procurou uma escola bilingue da rede particular e a fundadora foi enfática em dizer que não poderia dar qualquer tipo de desconto, porque precisaria contratar profissionais especializados para poder atender as demandas dos garotos, já que a escola nunca havia recebido uma criança com este perfil e se quer sabia como fazer. E foi isso que ela ouviu da maioria das escolas que procurou, que era impossível para a escola investir em uma criança que traria gastos imediatos. Além disso, ela ressalta que existem inúmeras instituições que desconhecem completamente o tema superdotação e não querem se quer cumprir a lei de inclusão vigente, instruindo muitas vezes adaptar os filhos fora da escola.
E tem casos também que a escola apenas coloca a criança em sala, sem qualquer direcionamento especializado sobre o tema. É quando acontece casos como a Beatriz, de Londrina, mãe do Miguel de 5 anos. Ele ficou na sala de crianças com até 4 anos por conta da data de corte. Sem apoio nenhum para a promoção de seu talento superdotado, ele começou a se sentir desestimulado, alterando drasticamente seu comportamento. A mãe contou que ele recusava as atividades por serem fáceis e repetitivas, em um momento triste de seu ócio ele amarrou os colegas na cadeira com fio dental e no retorno às aulas no semestre seguinte começou a apresentar rejeição para entrar na instituição, alergias pelo corpo e dores de cabeça. Um determinado dia, ele subiu no quarto andar do prédio em que mora e tentou pular do parapeito. Desde então, Miguel não frequentou mais aquela escola. Hoje, faz acompanhamento psicológico para recuperar o emocional e seus pais felizmente encontraram uma escola municipal na região que tem um olhar bem avançado para as crianças neuro divergentes, com sala de recursos e uma professora especifica para atender os alunos da educação especial.
É preciso que as escolas mais do que urgente procurem desenvolver seus profissionais para lidar com crianças superdotadas. Não são gênios sem defeitos e inteligentes em tudo, são crianças que precisam de apoio, aprendizado, empatia, educação para um desenvolvimento saudável. A luta de todas as famílias dessas crianças atípicas é justamente tirar essa causa do limbo e fazer com que a sociedade entenda esse perfil como uma potência divina e auxilie para que no futuro elas possam ser grandes profissionais e, mais do que isso, felizes, contribuindo com sua sabedoria para o bem da humanidade, como já fizeram Einstein, Da Vinci, Bill Gates e tantos outros.
*Roberta Castro (@robertacastro80) é jornalista, mãe do superdotado Filippo de Castro e fundadora do Grupo de Apoio à Superdotação “Crescer Feliz” no instagram @crescerfeliz_ahsd.