Desafios para o diagnóstico e acesso ao tratamento da Atrofia Muscular Espinhal 5q (AME-5q) no Brasil por meio do Teste do Pezinho
Vanessa Romanelli* Publicado em 01/09/2023, às 06h00
Doença genética neuromuscular caracterizada pela degeneração de neurônios motores e atrofia muscular, a Atrofia Muscular Espinhal 5q (AME-5q) pode ser detectada por meio da triagem neonatal em bebês. A inclusão desse diagnóstico está prevista na expansão do Teste do Pezinho pelo Sistema Único de Saúde (SUS), dentro do Programa Nacional de Triagem Neonatal (PNTN), de acordo com a Lei Federal 14.154, de maio de 2021.
Essa iniciativa proporciona um grande avanço em relação ao acesso e tratamento precoce da doença, que limita movimentos voluntários e, em casos mais graves, a respiração e deglutição do paciente acometido, resultante da degeneração progressiva dos neurônios motores por alterações no gene SMN1. Porém, o aumento de sobrevida e qualidade de vida do paciente dependem muito de alguns fatores que precisam ser discutidos e implementados de forma ágil e assertiva, como uma rede de profissionais especializados em cuidados interdisciplinares e acesso a medicamentos de forma igualitária em todo o país.
Nas últimas décadas, várias abordagens terapêuticas foram desenvolvidas e demonstraram eficácia na modificação do curso natural da doença. Sem dúvida, o diagnóstico precoce é a melhor oportunidade para um bom prognóstico do paciente. Contudo, atualmente, não há ainda Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas (PCDTs) instituídas, especificamente, para pacientes pré-sintomáticos dentro de um contexto de Programa de Triagem Neonatal Brasileiro.
Os protocolos existentes têm foco em pacientes sintomáticos ou apresentam limitações importantes em relação a critérios de inclusão e exclusão de pacientes pré-sintomáticos com AME-5q. Em um cenário de triagem neonatal, por exemplo, não é possível limitar o acesso a tratamento somente de crianças com histórico familiar da doença. Portanto, a elaboração de um conjunto de normas e regras nesse sentido é fundamental para encaminhamento adequado e tratamento especializado de bebês diagnosticados com a doença.
Outro ponto importante que pode contribuir para o futuro melhor desses pacientes é o apoio de uma equipe altamente especializada para assessorar as esferas do governo - Ministério da Saúde, Secretaria Estadual da Saúde e Secretaria Municipal da Saúde.
Com o objetivo de elucidar o encaminhamento de bebês identificados com AME 5q, na triagem neonatal, em março deste ano, em parceria com a Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo, o Instituto Jô Clemente (IJC), referência nacional na inclusão de pessoas com deficiência intelectual, Transtorno do Espectro Autista (TEA) e doenças raras, lançou o Guia de Orientação para Diagnóstico, Seguimento e Tratamento de Pacientes com AME-5q pré-sintomática, identificados por triagem neonatal. O documento, conhecido como White Paper, foi coordenado pela Drª. Vanessa Romanelli (IJC) e Dr. Marcondes França (UNICAMP), elaborado em conjunto com outros médicos pesquisadores e especialistas na doença do Estado de São Paulo.
Esse documento ajudará a ampliar a divulgação sobre o diagnóstico e acesso ao tratamento da doença no país. Profissionais e gestores da área da saúde que têm acesso ao material poderão encaminhar pacientes detectados por meio da triagem neonatal, de forma mais assertiva e rápida a centros especializados, de acordo com as diretrizes de políticas de saúde do Estado.
Como pesquisadores e atuantes na luta pela qualidade de vida e bem-estar de pacientes com doenças raras, queremos que essa e outras ações nesse sentido sirvam de referência para condutas clínicas em todo o país.
Estamos avançando e, como para tudo na vida é preciso dar o primeiro passo é importante ressaltarmos que o Teste do Pezinho, é o pontapé inicial para a saúde dos recém nascidos!
Sobre o Instituto Jô Clemente (IJC)
O Instituto Jô Clemente (IJC) é uma Organização da Sociedade Civil sem fins lucrativos que há mais de 62 anos promove saúde e qualidade de vida às pessoas com deficiência intelectual, Transtorno do Espectro Autista (TEA) e doenças raras, além de apoiar a sua inclusão social e a defesa de direitos, disseminando conhecimento por meio de pesquisas científicas. Com o pioneirismo e a inovação como premissas, propicia o desenvolvimento de habilidades e potencialidades que favoreçam a escolaridade e o emprego apoiado, além de oferecer assessoria jurídica às famílias sobre os direitos das pessoas com deficiência intelectual.
*Vanessa Romanelli, Ph.D. em Genética, é pesquisadora e supervisora do Laboratório de Biologia Molecular do SRTN do Instituto Jô Clemente