Consumo abusivo de bebidas por mulheres aumentou 42,5% em dez anos no país e as brasileiras já sentem os efeitos deste excesso em sua saúde
Mariana Thibes* Publicado em 19/03/2023, às 06h00
Nas últimas semanas uma análise inédita do CISA – Centro de Informações sobre Saúde e Álcool sobre o impacto do álcool na saúde das brasileiras dimensionou em números o que tem preocupado especialistas de diversas áreas da saúde: os danos do consumo abusivo de bebidas alcoólicas nas mulheres: a cada duas horas, uma mulher morre em razão do uso nocivo de álcool no Brasil e as causas vão desde acidente de trânsito e violência, observado em faixas etárias mais jovens, a cirrose hepática e doenças cardíacas, em mulheres de 35 a 55 anos e mais.
O aumento da ingestão alcoólica por mulheres, tanto em frequência como em quantidade, é um fenômeno mundial. Aliás, a expectativa é que, globalmente, a diferença entre homens e mulheres que bebem diminuirá progressivamente até 2030.
No Brasil, enquanto o consumo abusivo entre os homens apresenta estabilidade, entre as mulheres ele cresceu 42,5%, em média, entre 2010 e 2020. Mas este não é um cenário comum em todo o país. Há Estados que superam esse índice, com aumentos que vão de 44% (Porto Alegre/RS) até 80% (Curitiba/PR).
Para além dos números, precisamos aprofundar outras questões essenciais para encontrarmos espaços de diálogo e avançarmos em políticas públicas de prevenção, orientação e conscientização: por quais razões as mulheres estão bebendo de forma mais prejudicial e como sensibilizá-las para esta conversa?
Ao longo das últimas décadas, observamos uma mudança cultural, reflexo da maior presença e importância das mulheres no mercado de trabalho e sua emancipação financeira e social. Elas estão ocupando os mesmos espaços que os homens, do ambiente corporativo ao bar do happy hour, e hoje há uma maior aceitação do beber entre mulheres.
No entanto, diferente de muitos deles, elas acumulam jornadas triplas – carreira profissional, cuidado com a família e trabalho doméstico. E ainda precisam lidar com assédios (a cada hora, uma mulher sofre assédio no ambiente de trabalho) e desigualdade de cargos e salários.
Para enfrentar as pressões cada vez maiores, muitas mulheres procuraram no álcool um recurso para relaxar. A viralização da hastag #winemom durante a pandemia, com mães postando fotos com taça de vinho no fim do dia como uma espécie de recompensa depois de um dia duro de acúmulo de jornadas, é um retrato desta realidade. Importante destacar que o consumo da bebida alcoólica com esse propósito não ajuda e pode ocasionar ou piorar problemas emocionais e mentais.
Longe de querer julgar se a mulher pode ou não beber, se deve ou não beber ou, muito menos, qualificar a mulher que decide beber, esta é uma discussão prioritariamente de saúde pública.
Por isso, é fundamental que as mulheres entendam os efeitos do álcool em seu corpo para que façam escolhas mais saudáveis. A toxicidade do álcool é maior no organismo feminino em razão de sua composição biológica, como menos quantidade de álcool no corpo e menos enzimas que metabolizam a substância, aumentando muito o risco para certos problemas de saúde, como o câncer de mama, por exemplo.
Essa conscientização deve ter foco nas novas gerações, uma vez que meninas, entre 13 e 17 anos, estão superando os meninos em experimentação e consumo de álcool, segundo pesquisa com escolares brasileiros e o consumo em idade precoce aumenta as chances de desenvolver problemas relacionados ao álcool na vida adulta.
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* Mariana Thibes é socióloga e coordenadora do CISA – Centro de Informações sobre Saúde e Álcool. Possui doutorado em Sociologia pela USP e pós-doutorado em Ciências Sociais pela PUC-SP.
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