Douglas Ribas Jr e Carlos Alberto Santana explicam os regimes de bens de casamento
Douglas Ribas Jr e Carlos Alberto Santana* Publicado em 15/08/2023, às 14h00
O regime de bens pode ser definido como o conjunto de regras relacionadas aos interesses patrimoniais ou econômicos da entidade familiar.
O nosso Código Civil (CC) estabelece os seguintes regimes de bens: (i) regime da comunhão universal de bens – arts. 1.658 a 1.666 do CC, (ii) regime da comunhão parcial de bens – art. 1.667 a 1.671 do CC, (iii) regime da participação final nos aquestos – arts. 1.672 a 1.686 do CC e (iv) regime da separação total de bens – arts. 1.687 e 1.688 do CC.
Esse tema habitualmente desperta atenção em quem tem planos para se casar, já que a vida a dois vai muito além da relação afetiva entre um casal que decide dividir o mesmo teto.
Da convivência com intenção de formar família (ainda que sem filhos), portanto, quer haja casamento, quer haja união estável, advêm relações patrimoniais e é natural que os desdobramentos dessas relações patrimoniais geram efeitos, tanto no caso de separação do casal, como se houver o falecimento de um dos conviventes.
No entanto, os efeitos patrimoniais decorrentes da vida a dois podem também ser verificados em diversas outras hipóteses, como por exemplo, se um dos membros do casal tiver uma dívida. Seja a dívida anterior ao relacionamento, ou contraída na vigência da união entre as partes.
Já abordamos o assunto sob diversos prismas, valendo indicar alguns artigos para quem tiver interesse:
Retomando as explicações sobre regime de bens, basicamente as regras são as seguintes:
i) O regime da comunhão parcial de bens valerá para o casamento e para a união estável se não houver pacto diverso entre as partes ou sendo este nulo ou ineficaz. Nesse regime se comunicam os bens havidos durante o casamento ou união estável, exceção feita a alguns que são considerados pela lei incomunicáveis.
ii) Na comunhão universal de bens se comunicam tanto os bens anteriores, os presentes e aqueles posteriores à celebração do casamento. Há uma comunicação total ou plena dos bens, o que inclui as dívidas passivas de ambas as partes.
iii) No regime da participação final nos aquestos (raramente utilizado), durante o casamento há uma separação convencional de bens e, no caso de dissolução da sociedade conjugal, algo próximo de uma comunhão parcial de bens. Ao final da união, cada cônjuge terá direito à participação naqueles bens para os quais colaborou para a sua aquisição, devendo provar seu esforço patrimonial para tanto.
iv) No regime da separação de bens, não haverá a comunicação de qualquer bem, seja posterior ou anterior à união, cabendo a administração desses bens de forma exclusiva a cada um dos cônjuges, que poderá até mesmo alienar seus bens.
Pois bem, explicados os regimes de bens previstos no Código Civil, vamos ao que se entende pelo regime de bens híbrido, misto ou combinado.
Híbrido, misto ou combinado é o regime de bens adotado pelo casal, sendo por ele constituído mediante a escolha de regras que pertencem a dois ou mais regimes de bens previstos em lei.
Trata-se, portanto, de uma “construção de normas” por parte daqueles que irão se casar ou viver em união estável, contemplando a vontade de ambos, que a partir de um documento chamado pacto antenupcial escolhem as regras que serão aplicáveis para a regulação dos interesses econômicos e financeiros da vida do casal.
A previsão legal para que os interessados venham a eleger regras de dois ou mais regimes bens previstos em lei, “compondo” o seu próprio regime está no artigo 1.639 do Código Civil, que assim dispõe:
Art. 1.639. É lícito aos nubentes, antes de celebrado o casamento, estipular, quanto aos seus bens, o que lhes aprouver.
Dessa forma, é permitido ao casal que tenha seu próprio ‘regime de bens customizado’ de acordo com o que lhe parecer justo e coerente.
Nada melhor do que exemplos para permitir um bom entendimento a respeito desse assunto, assim sendo, exemplificativamente, mediante o regime misto podem os interessados decidir que:
- determinado bem adquirido por uma das partes - antes ou na vigência do relacionamento do casal - não se comunicará para o patrimônio comum, portanto, pertencerá exclusivamente somente a uma das partes;
- determinado bem adquirido por ambas as partes - antes ou na vigência do relacionamento do casal – seja tido como bem particular, portanto, pertencerá exclusivamente a uma das partes;
- determinada despesa mensal do casal (pagamento do financiamento de imóvel, por exemplo), caberá exclusivamente a uma das partes, a despeito de que a propriedade do bem financiado será de ambos, quando liquidado o financiamento;
- determinado bem que provavelmente será herdado por uma das partes se comunicará ao patrimônio comum do casal;
- determinado bem que uma das partes já tinha antes do relacionamento se comunicará ao patrimônio de ambos, a partir de que a união entre as partes eventualmente venha a completar 10 anos;
- no caso de separação ou divórcio, caberá à parte que tem melhores condições financeiras o pagamento integral das despesas correlatas à educação dos filhos pelo prazo de XX anos, permitindo a reinserção ou o crescimento da outra parte no mercado de trabalho, sendo certo que passado o período previsto pelo casal, as despesas em questão passarão a ser divididas igualmente.
Necessário repisar que as hipóteses acima elencadas são meros exemplos, de modo que cabe às partes elaborar regras e condições conforme lhes parecer interessante.
A propósito, oportuno aclarar que até mesmo a aplicação de multa pode ser prevista no documento em questão, pelo que é lícito às partes estabelecer, por exemplo, o pagamento de determinada quantia a título de penalidade mediante a comprovação inequívoca da infração a um dos deveres conjugais previstos no artigo 1.566 do Código Civil, como a obrigação de fidelidade.
Encerramos esse artigo na expectativa de compartilhar conhecimento e acreditando que com diálogo, empatia e bom senso, o regime de bens híbrido pode ser uma opção justa para evitar dissabores e litígios aos que pretendem se casar ou viver em união estável.
*Douglas Ribas Jr. é graduado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) em 1993 e pós-graduado em Direito Processual Civil pela mesma instituição. Cursou Program of Instruction for Lawyers na University of California - Davis. Reconhecido entre os mais admirados advogados de 2015 e 2019 pelo anuário Análise Advocacia, atua em contencioso e consultoria, especialmente nas áreas do Direito Civil, Consumidor, Comercial, Contratos, Imobiliário, Trabalho e Societário.
*Carlos Alberto Santana é consultor da área cível do escritório Douglas Ribas Advogados Associados. Doutor e Mestre em Direito pela Faculdade Autônoma de Direito de São Paulo - FADISP/SP. Pós-graduado em Direito Processual Civil e em Direito Contratual pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC/SP. É Professor de Direito Processual Civil e de Direito Civil. Especialista em Direito Imobiliário e em Sistema Financeiro da Habitação. Escreve nas áreas de Direito Processual Civil e de Direito de Família. Advogado atuante nas áreas do Direito Público e do Direito Privado.
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