Em busca da infância (quase) perdida

Neste dia das crianças vamos refletir sobre o verdadeiro papel da infância e a importância de haver um resgate para que ela não fique perdida

Alessandra Gomes* Publicado em 12/10/2024, às 09h00

Infância saudável é longe das telas -

É incrível ver como as crianças voltam a ser elas mesmas quando se desconectam das telas. Minha filha, de 9 anos, passou por esse processo, o que me fez refletir profundamente sobre o impacto que essa dependência tecnológica pode ter.

Ela, como tantas outras crianças, estava imersa nesse universo digital: influencers, joguinhos e aquele vasto oceano dos algoritmos. Não enxerguei mal nissoincialmente, afinal, essa geração já nasceu conectada, certo? Porém, algo me gerou um alerta e me fez rever a situação: o seu desempenho escolar que começou a despencar.

Aquela criança curiosa e participativa que sempre adorou compartilhar o que aprendia na escola começou a ficar desatenta e, sempre que podia, recorria àquela tela brilhante. Foi aí que decidi me aprofundar. Comecei a ler, a estudar, a procurar dados sobre esse comportamento. Oque encontrei foi assustador! As pesquisas, os estudos científicos, os artigos de especialistas sobre o uso excessivo de telas por crianças já eram devastadores, mas ver os vídeos que comprovavam e materializavam esses comportamentos me deixaram arrasada.

 

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As cenas eram aterrorizantes para qualquer mãe: crianças em pleno sono reproduzindo com suas mãozinhas os movimentos como se estivessem deslizando os dedos sobre uma tela imaginária, evidenciando claramente o impacto dessa tecnologia no subconsciente infantil. Vi dados mostrando perda de habilidades motoras de crianças, enquanto os olhos continuam fixos num mundo digital. Foi aí que me dei conta de que minha filha não estava imune ao problema.

A culpa veio. Como mãe, eu deveria ter visto antes? Como deixei minha filha exposta a esse mar de algoritmos sem controle? Como não consegui perceber? Acho que todas nós, mães ou responsáveis por crianças, passamos por essa autocrítica.

Como profissional de comunicação em saúde, senti a responsabilidade de agir. Não poderia ficar parada. Tinha de contribuir de alguma maneira para evitar que aquela situação continuasse não apenas com minha filha, mas com as crianças, em geral. E foi assim que nasceu a “Infância Livre de Telas”, uma campanha de alerta, desenvolvida em modelo colaborativo com várias instituições e profissionais, como médicos, e que contribuísse para tirar as crianças dessa situação quase que hipnótica, promovendo atividades fora das telas. A campanha inicialmente exibida em peças de mídia out ofhome, como painéis de abrigos de ônibus e de relógios digitais se espalhou pelo Brasil e tem conseguido cada vez mais participantes, inclusive o apoio da minha filha.

Isso porque sentei com ela, expliquei sobre os dados que vi, as informações que obtive, os estudos que li, tudo dentro de uma linguagem que ela pudesse entender o quanto era importante mudarmos aquele comportamento. Comecei a valorizar o tempo “sem fazer nada”. Passei a ver frases como “Mãe, estou entediada de outra maneira. A partir desse “tédio”, desse “ócio” busquei retomar as brincadeiras criativas, as conexões reais, o incentivo àimaginação sem precisar do estímulo constante de um youtuber barulhento.

Hoje, ela mesma defende a causa. Claro, a curiosidade dela pelo mundo digital ainda existe, mas agora está mais direcionada. E o melhor de tudo? O desempenho escolar voltou ao normal em apenas um mês sem telas. Uma recompensa e tanto para uma mãe que sabe a importância dos estudos, do desenvolvimento intelectual, do papel da informação e do conhecimento para se sentir segura e pertencente ao mundo que habita.

Vamos ser realistas: essa geração nasceu conectada e o digital faz parte da vida deles. Mas como comunicadores de saúde, temos a responsabilidade de levar essa mensagem adiante. Precisamos guiá-los, mostrando que o mundo real tem um valor inestimável e insubstituível, assim como esse período da infância, que precisa ser vivido no mundo real em sua plenitude, uma vez que possibilitamos às crianças serem as melhores versões delas mesmas.

 

*Alessandra Gomes é diretora executiva de criação da McCann Health Brasil

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