Entenda como que a leitura pode oferecer um equilíbrio saudável entre o tempo de tela e o desenvolvimento infantil
Sarah Helena de Souza Silva* Publicado em 31/07/2024, às 08h00
O debate sobre o uso das telas vem ganhando cada vez mais espaço entre grupos de pais e de professores, nas escolas e no ambiente familiar. Afinal, para uma geração que viveu o boom da massificação dos smartphones, tablets e computadores sem estar preparada para lidar com seus impactos, é um desafio entender e praticar da melhor forma os limites de seu uso. E se é difícil para nós, adultos, nos controlarmos ao usar telas e redes sociais, por que não seria igualmente difícil, ao nos tornarmos pais e mães, mediar seu uso junto dos nossos filhos?
Recentemente, o psicólogo social Jonathan Haidt, em seu livro "The Anxious Generation – How the Great Rewiring of Childhood Is Causing an Epidemic of Mental Illness", fala e alerta seus leitores sobre os impactos e riscos de uma infância e juventude hiperconectadas. Quando falamos de telas, sem entrar na questão do uso das redes sociais, as preocupações são um pouco diferentes, mas nem tanto. O que aproxima os consensos é o seu mau uso e exposição precoce. Em 2019, a Organização Mundial da Saúde, em seu “Guidelines on physical activity, sedentary behaviour and sleep for children under 5 years of age”, traz as recomendações e restrições de tempo de tela para crianças na primeira infância e tem sido utilizado como documento norteador para pais e professores.
O fato é que o tempo exagerado de telas e a superestimulação causada por ela são prejudiciais à saúde de todos nós, especialmente de crianças e adolescentes. Mas também podemos dizer que é compreensivo esses limites não serem respeitados quando nós mesmos, adultos, passamos um grande período imersos em redes sociais e telas, seja devido ao trabalho, seja por lazer. Como, então, melhorar nosso uso e estabelecer um limite saudável entre o tempo de tela e o tempo de descanso das telas para nós mesmos e nossas crianças?
A leitura, certamente, é uma das melhores opções para o descanso do uso das telas de forma saudável. Assim como as telas, a leitura pode ser levada para todos os lugares e é uma ótima opção para estreitar os vínculos, além de criar um ambiente que possui outro ritmo. Diferente da superestimulação das telas, a leitura, enquanto experiência analógica, traz calma, estimula concentração e foco, trazendo informações na medida certa, dando tempo para o cérebro acomodar e consolidar conhecimentos enquanto se abre para o que lhe parece novo.
Ler para os filhos, mesmo que eles já saibam ler sozinhos, também é a garantia de um momento só de vocês no dia. Ler para uma criança cria uma espécie de redoma entre vocês – o mundo lá fora, os problemas e outras distrações ficam cada vez mais longe a cada virar de páginas, e o que passa a ter foco e importância é só aquele momento, aquela história, aquele universo. A criança passa a se interessar por personagens e acontecimentos diferentes de si mesma, reconhece que existem outras realidades, outros modos de pensar, viver, experimentar e sentir a vida.
Com isso, a criança se expande, conquista vocabulário e repertório cultural, aprende a pensar e a questionar, conhece outros mundos, conquista empatia, tudo isso no aconchego e proteção do lar e da companhia de sua família. Assim se estabelece uma relação positiva entre a leitura e momentos de lazer. Os pais ganham também, podendo conhecer mais de seus filhos, acompanhando-os em sua jornada de conhecimento, aprendendo eles também novas formas de se relacionar consigo mesmos e com seus filhos, consolidando memórias afetivas duradouras e sólidas, por meio da leitura.
Para isso, é muito importante que esta também seja uma escolha dos pais, que a criança também veja os pais deixando o celular de lado para pegar um livro – não porque é importante, porque a ciência diz isso ou aquilo, mas porque também obtém prazer com a atividade. Esse exemplo é extremamente eficaz para que as crianças se sintam impelidas a ler. Ler um livro para uma criança, ter esse espaço de tempo dedicado a ela, renunciando a todo o resto, é uma declaração de amor e cuidado que se concretiza na rotina, estabelecendo vínculos entre ambos e associando a leitura como uma memória afetiva positiva. Esse hábito marca e impacta a criança por toda a sua vida de maneira positiva.
*Sarah Helena é psicóloga e curadora da Leiturinha, maior clube de assinaturas de livro infantis do Brasil
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