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Os desafios do diagnóstico da endometriose

Conheça a história de Michele que por 20 anos passou por desafios, sendo um deles durante a gestação

Michele Aparecida de Castro Vieira Rosa* Publicado em 01/05/2024, às 06h00

Arthur filho da Michele
Arthur filho da Michele

Durante minha adolescência, dos 13 aos 17 anos, sofri muito com fortes dores no período menstrual. Passei por diversos especialistas e realizei vários exames, mas nada era diagnosticado. A dor intensa reduzia meu apetite e, consequentemente, perdi muito peso na época, já que algumas vezes era necessário ir ao hospital para receber medicamento na veia. Sem contar com o afastamento social e da escola, pois eu acabava faltando muitos dias por não suportar a dor.

Aos 17 anos meu quadro clínico acabou se agravando. Não consegui mais sair de casa, pois as dores eram quase que diárias. Realizei uma ressonância magnética de pelve e foram identificadas massas ovarianas em cada um dos ovários e, com isso, fui submetida a uma cirurgia de emergência por suspeita de câncer. Após o procedimento cirúrgico e o exame anatomopatológico foi constatado que, na verdade, tratava-se de endometriomas – cistos formados no córtex ovariano compostos por tecido endometrial. Após o diagnóstico, iniciei o tratamento com o uso contínuo de anticoncepcional. As dores que eu sentia até reduziram, mas nunca cessaram de verdade. Por isso, comecei a buscar especialistas e passei por vários profissionais. Nada mudava.

Em 2021, quando eu estava com 32 anos e casada, comecei a pensar em engravidar e, por orientação médica, iniciei atividade física e melhorei minha alimentação. Em julho de 2022, interrompi o uso do anticoncepcional por orientação do médico especialista. Em setembro desse mesmo ano, eu e meu marido recebemos o tão esperado positivo e foi uma emoção enorme. Eu não imaginava que conseguiria engravidar tão rápido e senti como uma benção. Além disso, acreditava que ao menos durante a gestação estaria livre daquelas fortes dores que me perseguiam desde nova.

Michele durante a gestação
Michele durante a gestação

Com 14 semanas de gestação, voltei a sentir dores fortes e acompanhadas de vômitos. Em dezembro de 2022, com 18 semanas de gestação, as dores se intensificaram e se tornaram mais frequentes e, assim, fui para o ambulatório de pré-natal de alto risco do Hospital e Maternidade Santa Joana, em São Paulo (SP), onde fui encaminhada para internação e pedido de avaliação por um especialista em endometriose da Instituição. Ao ser avaliada, recebi a indicação de realizar uma cirurgia mesmo estando grávida. Então, em fevereiro de 2023, passei pela minha segunda cirurgia, uma videolaparoscopia, mas desta vez gestante. No procedimento foi constatado que as aderências da endometriose estavam entre o útero e o intestino e isso resultou no volvo de sigmoide – condição na qual uma determinada porção do intestino sofre uma torção sobre o seu próprio eixo mesentérico, ocasionando uma suboclusão intestinal. Por causa da gestação e crescimento do útero, não foi possível retirar as lesões de endometriose profunda, mas foi desfeito o volvo intestinal. Entretanto, mesmo com a liberação do intestino, continuei a sentir muitas dores e, por isso, precisei continuar internada até o dia do parto. Muitas vezes, por causa da intensidade das dores, precisei tomar morfina e não conseguia me alimentar muito bem.

Em 6 de abril de 2023, com 34 semanas de gestação, nasceu meu milagre: o Arthur, pesando 1.910 kg e 42 cm. Graças a essa cirurgia consegui segurar a gestação até as 34 semanas e meu filho nasceu saudável, ainda que um pouco prematuro. Após o nascimento do Arthur, as dores não melhoraram e percebi que estavam relacionadas à evacuação. Neste período, precisei de recorrentes internações e altas doses de morfina. As dores eram tão intensas que me impediam de comer e eu ficava com fraqueza. Às vezes eu nem conseguia segurar meu filho no colo.

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Sem melhora na minha saúde, em agosto de 2023, retornei ao mesmo especialista que realizou minha cirurgia na gestação e foi identificado que a endometriose estava ativa na região pélvica e intestinal. Em setembro de 2023, fui novamente internada no mesmo Hospital e passei por um tratamento com uma equipe médica para interromper o uso de morfina e, na sequência, fiz minha terceira cirurgia, mais uma videolaparoscopia, onde todos os focos de endometriose foram retirados, incluindo a parte afetada do intestino grosso.

Os primeiros três meses após a terceira cirurgia foi um período muito difícil para mim, pois tive fortes dores e cheguei a ser internada. Mas no final de dezembro de 2023 comecei, enfim, a me sentir bem melhor e sem dor. Recentemente, fiz uma nova ressonância magnética e não foi identificada nenhuma aderência de endometriose. Parece um sonho receber uma notícia dessa.

Michele com seu filho Arthur
Michele com seu filho Arthur

A endometriose causou em mim muitos danos físicos, emocionais e sociais. A gente se sente sozinha e começa a duvidar do que está sentindo, tanto pela demora do diagnóstico quanto pela falta de orientação médica especializada. É muito difícil. A nossa dor e a nossa voz são invalidadas.

Hoje, agradeço muito à equipe do Centro de Endometriose do Hospital e Maternidade Santa Joana, especialmente o especialista Dr. Ricardo Mendes, que realmente me ouviu e realizou o tratamento adequado para o meu caso. Vivi mais de 20 anos com essa doença e agora posso planejar o futuro, cuidar e curtir meu filho. É libertador poder, enfim, viver livre das dores.