Médica alerta para as consequências do uso do paracetamol para a gestante e o bebê
Dra. Bruna Pitaluga* Publicado em 30/03/2023, às 06h00
O paracetamol, também conhecido como acetaminofeno, é uma das drogas mais
utilizadas em todo mundo. Embora seja considerado um dos analgésicos mais seguros
disponíveis no mercado, ainda há muitas dúvidas sobre seu uso durante a gestação.
O medicamento possui ações analgésicas e antipiréticas.
Seus mecanismos de ação não estão totalmente elucidados. Sabe-se que o paracetamol atua no sistema nervoso central (SNC) inibindo a produção de prostaglandinas, que são mediadores inflamatórios. As prostaglandinas são produzidas a partir do ácido araquidônico, que é liberado das membranas celulares quando as células são danificadas.
O paracetamol é rapidamente absorvido pelo trato gastrointestinal e é metabolizado
no fígado. Cerca de 90% do paracetamol é metabolizado pelo fígado, principalmente
pela via do conjugado com o ácido glicurônico, e excretado pelos rins. No entanto,
cerca de 5% a 10% do paracetamol é metabolizado pela via do citocromo P450 2E1
(CYP2E1), que produz um metabólito tóxico, a N-acetil-p-benzoquinona imina (NAPQI).
A NAPQI é normalmente detoxificada pela glutationa hepática, mas em doses
excessivas de paracetamol, a quantidade de glutationa é reduzida, o que leva à
formação de radicais livres e à hepatotoxicidade.
A gestação é um período crítico em que a exposição a medicamentos pode afetar o
desenvolvimento do feto. Embora ainda se afirme que o paracetamol é seguro durante
a gestação, ainda há dúvidas sobre o seu uso a longo prazo e em altas doses. Estima-se que mais de 50% das gestantes utilizem paracetamol em algum momento durante o
pré-natal.
Estudos indicam que o uso de paracetamol durante a gestação pode estar associado a
um maior risco de problemas de saúde no recém-nascido, como asma e autismo.
Um estudo publicado em 2016 na revista International Journal of Epidemiology avaliou
a associação entre o uso de paracetamol durante a gestação e o risco de transtornos
do espectro autista (TEA) e transtornos de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH).
O estudo incluiu mais de 2.600 crianças com TEA, 4.000 crianças com TDAH e um
grupo de controle de mais de 32.000 crianças sem transtornos de neurodesenvolvimento.
Os resultados mostraram que o uso de paracetamol durante a gestação estava associado a um aumento significativo no risco de TEA e TDAH. As crianças expostas ao paracetamol no útero tinham um risco 30% maior de desenvolver TEA e um risco 20% maior de desenvolver TDAH em comparação com crianças não expostas.
Outro estudo publicado em 2020 na revista JAMA Pediatrics avaliou a associação entre
o uso de paracetamol durante a gestação e o risco de asma na infância. O estudo
incluiu mais de 73.000 crianças e suas mães, e os resultados indicaram que o uso de
paracetamol durante a gestação estava associado a um aumento no risco de asma na
infância.
As crianças expostas ao paracetamol no útero tinham um risco 13% maior de
desenvolver asma em comparação com crianças não expostas. Além disso, o risco
aumentava com a frequência e a duração do uso de paracetamol durante a gestação.
Em 2021, um artigo publicado na Nature Reviews Endocrinology, uma das revistas
médicas mais importantes do mundo, chama a atenção para os dados publicados
associando o uso do paracetamol com transtornos do neurodesenvolvimento e solicita
uma ação dos órgãos médicos quando as recomendações atuais do paracetamol na
gestação.
Embora o paracetamol seja dito seguro para uso durante a gestação, ainda há dúvidas
sobre o seu uso a longo prazo e quais as doses seriam consideradas seguras. Estudos
recentes indicam que o uso de paracetamol durante a gestação pode estar associado a
um maior risco de transtornos de neurodesenvolvimento e asma na infância. A
prescrição de qualquer medicamento durante a gestação deve ser uma avaliação de
risco-benefício. Enquanto estudos robustos não demonstram a segurança na gestação
do uso do paracetamol, a afirmação de que essa droga é segura deve ser revista
imediatamente.
* Dra. Bruna Pitaluga é médica obstetra formada pela Universidade de Brasília – UnB, com mais de 20 anos de experiência profissional. Possui especialização em medicina funcional, pelo Instituto de Medicina Funcional (EUA) e é pós-graduada em Nutrologia pela Associação Brasileira de Nutrologia – ABRAN.