Perdi a guarda de minha filha por 1 mês e hoje ajudo outras mulheres

Entenda como a psicologia forense tem um papel importante na defesa dos direitos das mães e nos processos de guarda

Cecília Pires* Publicado em 25/03/2025, às 06h00

Entenda a psicologia forense -

Tudo começou quando resolvi pedir a separação. Até então, vivia maritalmente com o pai de minha filha. Na época a criança possuía apenas 1 ano de idade.

Na minha cabeça, a separação seria tranquila e harmoniosa visando os interesses da criança. Afinal, o casamento acabou mas os filhos são para sempre. Lembro inclusive de ter sugerido que fizéssemos terapia familiar para que essa separação fosse o menos traumática para a criança. Porém, não foi o que imaginei!

Ainda em minha casa a pessoa passou a entrar com ação. Existem muitos detalhes dolorosos, nos quais não há a necessidade de expor. Nesse relato fixarei a contar minha história e como esses atravessamentos marcaram minha vida e acabei por usar dessa história para ajudar mais pessoas na mesma situação.

Uma semana após meu ex ter saído de casa, havíamos acordado de boca como seria o processo de guarda, convivência e etc. Ficou combinado, sem nenhuma briga ou discussão, que eu continuaria na casa com a criança e faríamos a convivência de forma igualitária para que nossa filha não sentisse os impactos da separação. Foi num desses dias em que ele dormiu com nossa filha, os aguardava no dia seguinte, em casa, para a devolução da criança e para tomarmos café da manhã juntos quando fui surpreendida por um atraso não habitual.

Ao estranhar, enviei uma mensagem via Whatsapp e ainda por mensagem recebi um áudio avisando que não iria vir tomar o café da manhã. A mensagem explicava que no dia anterior havia entrado com uma ação, e no mesmo dia conseguido uma liminar, e que “teria pena de informar dessa forma.” Ele enviou um print de dados do processo constando uma decisão na qual eu passaria a ter visitas assistidas e ele teria então a guarda da criança. Ainda sem entender o que aconteceu e o que estaria escrito em tal processo, para que fizesse o juiz expedir tal liminar, fui ao fórum e me intimei ao processo.

Agora, passei a ler e estudar meu caso de forma minuciosa. Dentre tantas inverdades havia um parecer de uma psicóloga que nunca havia me visto na vida, tal documento colaboraria com sua narrativa, desqualificando minha maternagem e saúde mental.

Nesse momento eu não sabia nem o que fazer; Foi quando minha prima me telefonou e comentou que havia acontecido o mesmo com sua vizinha, e passou o contato dela. Comecei a falar com essa vizinha e ela me contou o que havia passado e foi quando percebi que, infelizmente essas coisas eram “comum”. Relatou que o ex dela havia se vingado dela, por pedir a separação, pegando a guarda das crianças e ela super me tranquilizou e disse que precisaria de um psicólogo forense. Até então, não sabia nada sobre isso. E comecei a buscar formas de me defender. Foram horas de trabalho e pesquisas. Peguei todas as provas e documentos para provar todas as inverdades.

Ao mesmo tempo, meu ex havia estabelecido visitação assistida apenas 3x na semana com horário de apenas duas horas. Que absurdo! Antes aquele bebê de um ano, super conectada com a mãe e necessitando daquele vínculo afetivo estava sendo privada. Quando dava o horário de findar a visitação, ele então avisava e mandava que me retirasse. Todos os dias ouvia minha filha berrar e chorar pedindo por mim, inclusive tenho algumas gravações desse período para mostrar o quão donoso é essa separação forçada e prematura para uma criança de apenas 1 ano. Meu coração estava em pedaços! Mas havia juntado as forças para me defender o mais rápido possível. Aquelas saídas e ouvir a criança chorando e fazendo birra por querer estar com a mãe dela eram de partir o coração!

Alguns familiares que tiveram contato com minha filha durante esse período relataram o quanto ela estava triste e abatida. Não parecendo mais ser a mesma criança. Não há como mensurar o sofrimento de uma criança de 1 ano que é afastada de sua mãe, inclusive o mesmo é extremamente prejudicial para sua construção como indivíduo. A literatura psicológica traz inúmeros volumes a respeito do quão nocivo são esses atravessamentos para o desenvolvimento nos seus primeiros anos de vida.

Entrei em contato com uma excelente psicóloga forense no qual me avaliou, leu todo o meu processo e deu um parecer técnico explicando através da literatura médica com os termos que o juiz compreendesse que não havia nada que desabonasse minha saúde mental e principalmente minha maternagem.

Foi o dinheiro mais bem gasto! Tal profissional tinha domínio técnico para avaliar, ler a questão judicial e ainda rebater com termos jurídicos todos os pontos trazidos. Senti-me muito feliz e satisfeita por até então ter sido vista. A profissional que me acolheu foi ótima e extremamente ética! Lembro ainda que ela falou sobre o parecer eleborado pela outra psicóloga, a pedido do meu ex o quão absurdo era e instruiu-me a fazer uma reclamação no CRP (Conselho Regional de Psicologia). Pediu inclusive que levasse junto com minha reclamação o parecer técnico que ela havia me avaliado juntamente com o fornecido para meu ex-companheio. Para que o próprio CRP vise a gravidade das infrações éticas. E ainda comentou: Mesmo que você tivesse alguma psicopatologia não seria dessa forma que deveriam tratá-la. Vivemos em um país em que a maioria da população sofre com depressão ou ansiedade e nem por isso são retiradas guardas e poderes familiares das pessoas. Frisou inclusive, sobre os prejuízos desse período na construção psíquica de um ser ainda na primeira infância.

O CRP instaurou o processo, meses depois o CFP fez mudanças pertinentes no código de ética no qual proibiria a emissão de pareceres de terceiros e etc. O processo ético ainda está rolando e há meses atrás recebi uma carta do próprio CRP apontando possíveis faltas éticas no parecer dado por essa profissional em questão. Inclusive relata sobre o quão nocivo é essa separação materna na primeira infância.

Assim que consegui todos os documentos, telefonei a uma advogada que trabalhava com questões de gênero e minha única exigência foi: vou passar os dados do processo, mas não acredite em uma só palavra. Tenho todas as provas e documentos que me resguardam. E você tem 48 horas para me defender. Ela pediu para ler e voltaria a conversar. Conversamos. E assim, estabelecemos o vínculo profissional e essa profissional passou a me acompanhar. Hoje sou muito grata e tenho muito carinho por ela.

Veja também

Ao mesmo tempo que toda a bagunça externa acontecia, precisava organizar o meu interno. Até mesmo para não ter mais nenhum prejuízo futuro. Busquei uma psicóloga que acompanhou todo o meu processo (tanto de crescimento quanto ao jurídico que crescia comigo). Foram anos de escuta terapêutica e trabalho com violência de gênero, principalmente a psicológica e a processual que se estabelecia e mexia muito com meu bem-estar e prejudicaria também minha filha que precisava de mim. A psicóloga Camila Vilas Boas foi fundamental para que acontecesse esse despertar e fortalecimento. Todo o processo que passei foi extremamente doloroso no qual houve perda de confiança.

Nossa psicoterapia se estendeu por anos, a admiração por essa profissional só aumentava. Passei a cursar psicologia, fazer diversos cursos e também uma pós em saúde mental. Cursos inclusive internacionais como em Yale e a Universidade de Pennsylvania. Após anos, rompemos nosso vínculo terapêutico e hoje atuamos conjuntamente e fundamos um escritório, Pires e Vilas Boas de psicologia forense. Somos pioneiras na área e hoje atuamos em todo o solo nacional. Nossa missão é trabalhar para que não mais ocorram injustiças processuais e que mulheres não tenham suas vozes diminuídas e crianças afastadas. Atuamos com questões de gênero e auxiliamos na defesa e avaliação de casos como violência psicológica em Lei Maria da Penha e casos de guarda, convivência, adoção e curatela.

Visamos o bem-estar e a verdade a cima de tudo! Atuamos de forma justa e ética. Ajudamos pessoas que tiveram suas saúde mental e bem-estar questionados. Levando o profissionalismo e o código de ética do CRP à risca.

 

*Cecília Pires é terapeuta e co-fundadora do escritório de psicologia forense Pires e Vilas Boas, que luta pelo direito psico emocional de mãe e mulheres nas instâncias jurídicas.

*Com edição de Marina Yazbek Dias Peres

separação guarda compartilhada direitos da mulher Psicologia forense

Leia mais

A importância da cooperação parental na guarda compartilhada


Testamento de guarda aumenta segurança e amparo para os filhos, afirma advogada


Guarda compartilhada com residência alternada: uma alternativa de Solução de Conflitos no Divórcio


Como lidar com a guarda dos filhos quando o casamento acaba


Guarda compartilhada: como evitar a alienação parental