Maria Julia: a flor que brotou em mim e virou estrela

Jaqueline Duarte compartilha o relato da gravidez de sua filha Maria Julia

Jaqueline Duarte* Publicado em 16/08/2022, às 12h45 - Atualizado em 12/10/2022, às 06h00

O apoio, o carinho e o amor ajudaram Jaqueline a se fortalecer -

Nunca gostei muito do significado da expressão “bebê arco-íris”. Ela é dada sempre nos casos de crianças nascidas de mães que antes perderam um filho por um aborto espontâneo ou de forma prematura.  O lado poético disso está no fato de o arco-íris surgir logo após uma tempestade. Essa forma de reagir à dor é legítima e muito compreensível, mas para mim foi diferente.

Hoje, sou mãe do Pietro, de dois anos e meio, e da Laura de um ano e quatro meses. Mas, em agosto de 2018 eu estava grávida da minha primeira filha, Maria Julia. Em uma consulta de rotina, no dia que estava completando 39 semanas de gestação, foi identificado que o pequeno coração dela não estava batendo.

A gestação foi saudável e com o pré-natal em dia. O meu caso foi denominado como óbito fetal de causa não explicada. Ao receber a notícia oficial na sala de ultrassom, o meu esposo estava aguardando no corredor. Ele ouviu o meu choro, entrou na sala e nos abraçamos em dor.

Naquele momento foi como uma tempestade mesmo, se for para dar sentido à representação “arco-íris”. Porém, aqui cabe um clichê: o amor em torno dela era tão intenso e contagiante que eu não conseguia enxergar a sua ida como algo trágico, apesar do seu teor. Maju foi o tempo todo uma explosão de cores na minha vida, e continua sendo. Ela é o próprio arco-íris.

 

Jaqueline e seus filhos Laura e Pietro

 

Acolhida ao conversar com outros pais que também perderam seus filhos prematuramente, percebi um sentimento em comum: o de compartilhar as suas experiências com quem já passou por isso. Como uma troca, mesmo. Pelo que parece (lá vem outro clichê) se colocar no lugar do outro pode ser difícil para algumas pessoas. Por mais que tenham as melhores intenções, acabam dizendo coisas do tipo: “já, já terão outro” ou “poderia ter nascido com algum ‘problema’. Foi melhor assim”.

 

As melhores energias

Apesar de algumas dessas frases serem equivocadas, têm a intenção de confortar. Lembro-me de uma em especial: “Que as melhores energias estejam com você!”. Eu senti de fato essas grandiosas energias me elevarem. Se fosse para descrever o apoio recebido pelos amigos e familiares, eu diria que fui pega no colo.

Os gestos de carinho e amor vieram de todas as partes. Isso foi incrível! Me fortaleceu e só confirmou o que já imaginava: minha Maju era pura luz. Todos sentiram a ida da minha filha. A comoção se transformou em uma corrente de pensamentos positivos para que eu ficasse bem. Foi mágico!

 

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Chorar é preciso

Aceitar a perda e sentir a tristeza foi um passo difícil de assimilar, eu não entendia o porquê, mas eu estava bem, apesar da dor.  Me vi consolando os meus amigos e familiares, e quando viam que eu estava “bem”, eu sentia deles um certo alívio. É claro que sofri e chorei, mas estava bem. Até tirar as faixas dos meus seios.

 

Não pude amamentar

Fiquei três dias na maternidade. Lá foi preciso enfaixar os meus seios para não estimular a produção de leite.  Quando cheguei em casa e fui tomar banho, desenfaixei, e o leite desceu em abundância. Não contive o choro porque não tinha pra quem dar o leite, ela não estava lá.

Hoje tenho dois bebês, e no momento, preciso fazer o desmame, por conta do cansaço mesmo e do desgaste, mas sei que em análise, percebi a minha grande dificuldade de fazê-lo. Afinal de contas, não pude amamentar a Maju. Mas esse assunto sobre desmame fica pra outro momento.

Mães enlutadas, vibro por vocês!

Deixo claro, não há intenção de renegar a morte e nem de dar algum significado religioso. Longe disso. A aceitação da morte é um processo muito particular, mas eu ressignifico isso mandando luz para quem passou por essas perdas – a luz do meu arco-íris –. Que toda dor seja acolhida. Que toda raiva, revolta, desespero, tristeza e saudade também sejam. Mas se há amor, há vida pulsante! Mães, permitam-se viver, apesar do gosto amargo e da aparente falta de sentido, continuem a jornada. Se precisar conversar, chorar, ou ficar em silêncio estarei(mos) aqui, conectadas em amor!

*Jaqueline Duarte é jornalista e mãe.

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