Preocupações sociais, como medo de “dar vexame”, são mais determinantes para adultos jovens não exagerarem no consumo
Mariana Thibes* Publicado em 12/09/2023, às 06h00
Os prejuízos do consumo exagerado de álcool à saúde não fazem parte das preocupações de adultos jovens na hora de beber. O que realmente faz a diferença para moderarem o consumo tem relação direta com questões sociais, como medo de “dar vexame”, ser julgado e “se prejudicar no trabalho”, por exemplo.
A revelação é um dos achados da pesquisa Jovens e o beber com moderação no Brasil, realizada pelo Ipec com homens e mulheres entre 18 e 34 anos, das cidades de São Paulo e Salvador, das classes AB, C e D, considerados “bebedores moderados ou nocivos”.
Para entender o que está por trás desta descoberta, precisamos lembrar que o álcool é parte relevante da sociabilidade dos jovens e dos seus rituais sociais. Isso faz com que haja uma grande pressão dos pares em relação ao ato de beber, e quem não o faz corre risco de ser excluído do grupo ou ficar à margem. A pesquisa mostra que beber sozinho não faz muito sentido para a maioria das pessoas, sendo um prazer compartilhado. No caso dos jovens, há ainda o medo de ser considerado chato pelos amigos caso se recuse a beber.
De forma análoga, quando se bebe demais, os temores também estão relacionados ao que pode acontecer na vida social dos jovens. Entre as razões citadas pelos entrevistados se destacam: falar algo que não devia aos amigos ou colegas de trabalho, ligar para um (a) ex-namorado (a), perder dinheiro ou objetos importantes, estar namorando uma pessoa e beijar outra ou não comparecer a um compromisso de trabalho no dia seguinte.
Ainda no contexto social, outro achado chamou a atenção. Os entrevistados consideraram a ressaca “moral” (o mal-estar subjetivo sentido após uma bebedeira) mais traumática do que a física (os sintomas corporais). A justificativa? A ressaca moral deixa rastros que não duram apenas um dia, podendo comprometer negativamente a imagem diante dos outros e a autoestima. Um dos entrevistados, um homem na faixa etária entre 18 e 25 anos da classe AB, até mesmo declarou que: “particularmente, não penso muito no que vai acontecer com o organismo depois; só a ressaca moral mesmo”.
Não é que os participantes da pesquisa desconheçam os efeitos negativos à saúde. Eles relataram acreditar que os incidentes são mais raros e vinculados a pessoas que bebem em padrões extremamente elevados a longo prazo. E é neste ponto que precisamos avançar em termos de conscientização e prevenção.
Nesta fase da vida não é habitual o raciocínio de longo prazo, portanto, faz sentido que problemas de saúde que aparecem mais tardiamente não estejam no radar dos jovens. No entanto, o que eles desconhecem e que precisamos reforçar é que os efeitos do exagero do álcool também estão atrelados a consequências de curto prazo e infelizmente eles não são tão raros quanto podem parecer.
Outra questão importante é o que esses jovens entendem por exagero na bebida. Beber cinco chopes no happy hour com os colegas do trabalho ou uma garrafa de vinho num jantar ou cinco shots de tequila numa festa, um padrão conhecido na saúde pública como “consumo abusivo de álcool” ou “beber pesado episódico”, não é considerado pela maioria dos jovens como um consumo exagerado de álcool.
Porém, esse padrão pode trazer prejuízos imediatos: intoxicação alcoólica grave, acidentes de trânsito, envolvimento em brigas e casos violência ou afogamento que, aliás, podem até levar à morte. E no longo prazo, esse padrão está associado a mais de 200 tipos de doenças diferentes.
Fazer com essas informações cheguem à população jovem de forma acessível e num formato atrativo para conscientizá-la e engajá-la em comportamentos mais saudáveis é o desafio que temos pela frente enquanto sociedade.
Para quem ficou interessado na pesquisa, ela está disponível gratuitamente para download: clique aqui!
*Mariana Thibes é socióloga e coordenadora do CISA – Centro de Informações sobre Saúde e Álcool. Possui doutorado em Sociologia pela USP e pós-doutorado em Ciências Sociais pela PUC-SP.
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