A campanha Maio Amarelo precisa ir além da conscientização e se tornar parte da educação nas escolas e famílias
Cecília Bellina* Publicado em 16/05/2025, às 06h00
O Maio Amarelo é uma importante campanha de conscientização sobre segurança no trânsito. Utilizando o amarelo – cor que simboliza advertência e atenção – o movimento pretende reduzir o número de mortes e feridos nas vias. No entanto, como especialista que atua há mais de 30 anos com o impacto psicológico do trânsito sobre as pessoas, especialmente no medo de dirigir, é preciso fazer uma crítica realista e necessária: de que adianta uma campanha se o tema ainda está longe de fazer parte da cultura do nosso cotidiano?
A maioria das pessoas sequer entende o que é “trânsito”. Para muitos, a palavra ainda remete apenas ao congestionamento de veículos. Quando, na verdade, trânsito é o ambiente social formado por pessoas, veículos e até animais nas vias públicas. É um reflexo direto do grau de desenvolvimento de um país: onde há educação, há trânsito humanizado. Onde falta educação, há negligência, acidentes e sofrimento – físico e emocional.
Infelizmente, no Brasil, falar de trânsito é quase sempre falar de tragédia. O tema aparece nas manchetes apenas em contextos de acidentes, mortes em feriados, greves de motoristas ou atrasos no transporte público. Mas raramente é abordado como uma questão de cidadania, saúde pública ou educação.
Nos países desenvolvidos, a educação para o trânsito começa cedo, nas próprias escolas. Aqui, nem nas escolas e, muitas vezes, nem em casa. E não é por culpa das famílias – é porque os pais também não foram educados para isso. Como ensinar o que nunca foi aprendido? Ainda mais quando os próprios adultos cometem infrações cotidianas, como falar ao celular ao volante, ultrapassar limites de velocidade ou dirigir embriagados – muitas vezes, na frente dos filhos.
Modelos importam. Crianças aprendem observando. Se os exemplos forem negativos, como podemos esperar um futuro diferente?
Além disso, o poder público falha em sua responsabilidade. Faltam vias seguras, falta fiscalização, falta punição efetiva. Em vez de estruturar campanhas apenas visuais, por que não investir esses recursos em ações práticas de educação e prevenção? Em programas de base nas escolas, melhorias na infraestrutura urbana, capacitação de condutores e valorização da mobilidade ativa?
Estamos andando na contramão do trânsito seguro e humanizado que deveríamos construir. O Maio Amarelo tem um papel importante, mas precisa sair das telas e ocupar os espaços onde a mudança realmente acontece: nas salas de aula, nas ruas, dentro das casas, e principalmente nas políticas públicas.
Trânsito não é apenas um problema de tráfego. É uma questão de cultura. E a cultura só se transforma com educação, exemplo e ação contínua.
*Cecília Bellina é psicóloga especialista em medo de dirigir, com formação em Psicologia Comportamental e Psicologia do Trânsito pela USP. Possui aprimoramento em Terapia Comportamental pelo Hospital das Clínicas e mais de 30 anos de experiência na área. Foi Conselheira do DETRAN e participou da revisão do Código Nacional de Trânsito. Também é autora do livro Dirigir sem medo e criadora de um método inovador para ajudar motoristas inseguros.
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