Como as tecnologias podem fazer a diferença na sociedade do cuidado?

Entenda a sociedade do cuidado e até como a inteligência artificial pode contribuir com isso

Camila Medeiros* Publicado em 19/11/2024, às 06h00

Como a inovação pode ser aliada do cuidado? -

A inovação no setor público, como uma prática transversal, é capaz de transformar realidades. Novas tecnologias têm o potencial de reduzir a burocracia, otimizar gastos e melhorar processos. No entanto, como as inovações podem impactar positivamente o cuidado, essencial para a manutenção e reprodução da vida? Como a Inteligência Artificial (IA), a Internet das Coisas (IoT) e outras tecnologias podem nos auxiliar na prestação de melhores serviços públicos, na proteção das pessoas e na promoção de um bem viver?

Cuidado é uma palavra cotidiana, mas com muitos significados. Envolve saúde, saneamento básico, acessibilidade, educação de qualidade e inclusiva, mobilidade e planejamento urbano. Também se refere às tarefas diárias de todas as pessoas, como a preparação de alimentos, limpeza, apoio a pessoas idosas ou a amamentação de bebês.

Apesar de ser uma parte integrante da vida de todas as pessoas, os trabalhos de cuidado são distribuídos de forma desigual e injusta. Geralmente, o cuidado é assumido pelas famílias, especialmente pelas mulheres, que se responsabilizam de maneira desproporcional e não remunerada, enfrentando sobrecargas de trabalho que comprometem sua autonomia financeira e afetam sua inclusão, permanência e ascensão no mercado de trabalho.

 

Veja também

 

O mercado dos cuidados não é reconhecido como produtivo e é caracterizado por alta informalidade, desregulamentação e falta de mecanismos de fiscalização e proteção para as trabalhadoras do cuidado. As mulheres mais pobres, negras e que vivem em áreas com menor acesso a políticas e serviços públicos, como zonas rurais e periferias urbanas, são as mais impactadas. Estamos em um momento marcado pela diminuição do tamanho das famílias, rápido envelhecimento da população e maior participação feminina em um mercado de trabalho instável e informal. Também enfrentamos uma crise climática, desigualdades sociais cada vez mais evidentes e a urgência da sustentabilidade urbana.

No início de 2023, o cuidado entrou na agenda das políticas públicas do governo federal. Está em andamento a formulação de uma Política e um Plano Nacional de Cuidados, envolvendo 23 órgãos ministeriais e entidades governamentais. Os públicos prioritários da política, no primeiro ciclo de implementação são: pessoas que cuidam (de forma remunerada e não remunerada), crianças e adolescentes (com ênfase na primeira infância), e pessoas idosas e com deficiência que requerem apoio para realizar atividades diárias.

A sociedade dos cuidados representa um novo paradigma para o desenvolvimento econômico, social e ambiental, com o cuidado no centro das preocupações e o reconhecimento da necessidade urgente de corresponsabilização e redistribuição dos trabalhos de cuidado. Estado, famílias e mercados devem enfrentar juntos os desafios do século XXI.

As tecnologias emergentes têm um papel crucial. Ferramentas como IA e IoT podem ser aplicadas para monitorar a saúde de idosos e pessoas com deficiência, garantindo sua segurança e bem-estar. Aplicativos e plataformas digitais podem facilitar a conexão entre cuidadores e aqueles que necessitam de cuidados, além de promover a autonomia financeira e a segurança das cuidadoras informais.

Além disso, tecnologias de automação e robótica podem aliviar a carga de tarefas domésticas e de cuidado, permitindo que os cuidadores humanos se concentrem em aspectos mais emocionais e interativos do cuidado. A digitalização dos serviços públicos também pode tornar o acesso a serviços essenciais mais eficiente e inclusivo, garantindo que todas as pessoas, independentemente de sua localização ou condição socioeconômica, possam receber o apoio necessário.

Quando tratamos de cuidado, inovar não é apenas uma questão de eficiência, mas de justiça social e equidade. Ao integrar tecnologias em serviços públicos e práticas de cuidado, podemos criar uma sociedade mais justa e inclusiva, onde o cuidado é valorizado e distribuído de forma equitativa. O desafio está em garantir que essas inovações sejam justas, acessíveis e que contribuam para a construção de um futuro mais sustentável e humano.


*Camila Medeiros é formada em Comunicação pela Universidade de Brasília (UnB) e especialista em Design pela Universidad Católica de Murcia (UCAM), Espanha (2015) e em Gestão Pública pela UnB (2013). Hoje ocupa o cargo de diretora de Inovação da Enap (Escola Nacional de Administração Pública)

inovação cuidado Inteligência artificial

Leia mais

Terapeuta explica a oficina das emoções o benefício desse trabalho com as crianças


Viagens aéreas longas podem elevar o risco de trombose em até 4 vezes


Abandono afetivo inverso: o momento em que filhos abandonam os pais na velhice


O impacto da dor nas crianças e os cuidados que podem fazer diferença na primeira infância


Crianças e jovens também sofrem com ansiedade