Experimentação de bebidas alcoólicas expõe adolescentes a problemas de curto e longo prazo e primeiro contato ocorre em reuniões familiares
Mariana Thibes* Publicado em 16/08/2022, às 06h00
Dados recentes do IBGE trazem um alerta importante para pais, responsáveis e também para os profissionais da saúde: a experimentação de bebida alcoólica aumentou entre estudantes do 9º ano do ensino fundamental de 52,9% em 2012 para 63,3% em 2019. Esse crescimento foi mais intenso entre as meninas, saindo de 55% para 67,4%, enquanto que entre os meninos, saltou de 50,4% para 58,8%. Embora a legislação brasileira proíba a venda ou oferecimento de bebidas alcoólicas a menores de 18 anos, a experimentação abaixo dessa idade ainda é comum e considerada inofensiva por muitos adultos.
Diante deste cenário, um questionamento comum é como evitar, ou pelo menos adiar ao máximo a experimentação de bebidas alcoólicas. Afinal, os efeitos do álcool são especialmente nocivos para menores de 18 anos, podendo levar ao comprometimento de várias funções cerebrais e a consequências negativas de curto prazo e longo prazo, como queda no rendimento escolar, e prejuízo das funções cognitivas e das habilidades socioemocionais.
A adolescência é uma etapa de intensas transformações corporais, psíquicas e sociais marcada, principalmente, pela busca de identidade. Essa busca vem junto ao desejo de experimentar, afinal, um corpo e uma mente em transformação clamam por novas experiências. A iniciação ao consumo de álcool acaba surgindo nesse contexto, associada à vontade de assumir riscos e testar limites, à busca por novas sensações e à necessidade de aceitação por amigos. Porém, o que temos percebido é que uma das influências mais decisivas nesse momento é a da própria família, sobretudo dos pais.
Pesquisa feita pelo Ipec, a pedido do CISA – Centro de Informações sobre Saúde e Álcool, mostrou que o primeiro contato dos entrevistados com a bebida alcoólica acontece, em geral, em reuniões familiares. Se a experimentação em outros contextos não costuma ser de conhecimento da família, a iniciação no ambiente familiar acontece com consentimento ou até mesmo o incentivo de pais ou parentes.
A passagem da infância para a vida adulta não é um processo fácil. A integração à sociedade adulta é complexa e pode gerar conflitos para os jovens e seus pais. É natural que nesse momento haja o desejo de contestação e experimentação, de maior autonomia e liberdade, necessários para o crescimento dos adolescentes.
Não podemos esperar de nossos filhos que eles apenas se conformem às regras, sem nenhum tipo de contestação, pois isso não seria saudável para o seu desenvolvimento. No processo de se indagar o que é ser adulto, os modelos mais próximos serão os dos pais ou responsáveis Por isso, para que esse processo de contestação natural ocorra de forma benéfica, é importante que eles tenham neles apoio, acolhimento e exemplos positivos.
É por isso que a família exerce um papel fundamental na prevenção à experimentação precoce de bebidas alcoólicas. No entanto, por desconhecimento ou desinformação, muitas acabam tomando atitudes que resultam no contrário.
Não falar sobre álcool com os filhos, apelar para a autoridade, fazer sermões ou permitir que menores de 18 anos consumam bebida alcoólica dentro de casa não são boas estratégias para prevenir a iniciação precoce. O consumo abusivo de álcool pelos pais e parentes em reuniões familiares também não é aconselhável. Por outro lado, o envolvimento afetivo, a boa comunicação, a determinação de limites e a manutenção de hábitos saudáveis em casa são atitudes que podem proteger os filhos de comportamentos nocivos nessa fase tão delicada que é a adolescência.
Nem sempre essa é uma tarefa simples e muito menos uma obrigação só da família. Proteger crianças e adolescentes do uso precoce de álcool é uma responsabilidade de toda a sociedade, que se inicia na família e se estende a outros atores – governo, escola, profissionais de saúde, comunidade e organizações da sociedade civil – para a construção de um pacto coletivo que estabeleça tolerância zero ao consumo de álcool por menores.
*Mariana Thibes é socióloga e coordenadora do CISA – Centro de Informações sobre Saúde e Álcool. Possui doutorado em Sociologia pela USP e pós-doutorado em Ciências Sociais pela PUC-SP e pela UFABC.
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