Escolas podem ajudar na educação crítica sobre as redes sociais e no desenvolvimento de inteligência emocional dos estudantes
Ana Paula Yazbek*, Ângela Kim*, Ana Lucia Bresciane* Publicado em 09/04/2025, às 06h00
A Série “Adolescência”, recém-lançada pela Netflix, tem despertado o debate sobre a responsabilidade de toda a sociedade pelo cuidado da saúde física, mental e emocional dos adolescentes, bem como sobre os riscos causados pelo uso da internet sem supervisão.
Entre os inúmeros questionamentos trazidos em seus episódios, que exploram intimamente as razões de um crime cometido por um adolescente, está o fato de os adultos ao redor daquele menino de doze anos não terem percebido qualquer indício de sofrimento ou dificuldade de lidar com as próprias emoções. Mas seria possível identificar esse sofrimento?
A resposta parece simples: para compreender essa fase do desenvolvimento, é preciso estabelecer vínculos com aquele adolescente, mostrar empatia, manter um diálogo aberto. Isso significa estar presente, conversar sem julgamentos e acompanhar o dia a dia da criança ou do adolescente, observando como eles se relacionam com o mundo e com as pessoas ao redor.
Mas a adolescência é uma fase de mudanças físicas e comportamentais intensas. A busca por privacidade, por exemplo, é um fator comum. Mesmo para mães, pais, cuidadores e educadores que se conectaram intensamente com a infância daquela criança, a transição desse crescimento pode ser desafiadora. Além dos fatores individuais de cada adolescente, é preciso lidar com fatores externos, contextuais, dos ambientes em que frequenta, e fatores estruturais, que atingem toda a sociedade.
Segundo o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), na adolescência, o apoio oferecido pela parentalidade é um dos maiores protetores da saúde mental. Já as escolas podem ser ambientes para reforço do bem-estar, quando promovem ambientes saudáveis, ou de risco, por exemplo, quando há presença de bullying, racismo ou pressões excessivas.
Hoje, sabe-se que crianças e adolescentes que sofrem bullying são mais propensas a desenvolverem depressão e ansiedade. O Instituto do Cérebro descobriu que as vítimas de bullying têm dificuldade de reconhecer emoções, sentem mais medo e mais estresse, o que demonstra um dano no cérebro que gera dificuldade de aprendizado e vulnerabiliza a transtornos de ansiedade e humor.
Além disso, a UNESCO aponta que vítimas de bullying na infância ou adolescência apresentam resultados escolares piores, maiores chances de abandonar os estudos após o ensino médio, além de, durante o período escolar comum, tenderem duas vezes mais a faltar e três vezes mais a se sentirem estranhas. A consequência disso é a vulnerabilização dessas pessoas, na vida adulta, a outros problemas como abuso de drogas (legais e ilegais), transtornos alimentares e doenças como cânceres ou cardiovasculares e metabólicas.
Pensando sobre diversas questões do universo infantil e da adolescência, a Bebok, em parceria com o Studio Ideias e o Espaço Ekoa, realizou uma pesquisa quantitativa que consultou 1.000 mães, pais e cuidadores de crianças entre 6 e 12 anos, em todo o território nacional. Nela, 60% dos pais relatam que as crianças já sofreram algum tipo de agressão, e 60% afirmam que seus filhos vivenciaram alguma forma de violência nas escolas. O bullying é a agressão mais frequente entre as crianças, com 29% dos pais relatando que seus filhos já foram vítimas dessa prática.
Ainda de acordo com o estudo “O mundo que sei”, o bullying está em segundo lugar no ranking das principais preocupações dos pais (20%), perdendo apenas para a violência nas ruas (32%).
Diante desse contexto, não há como evitar falar do papel da sociedade na construção de relações que ajudem as crianças a alcançarem seu pleno desenvolvimento, em ambientes livres de qualquer tipo de violência. Isso porque, nas escolas, podemos ajudar a identificar mudanças na atitude dos estudantes, como aumento da irritação, queda do desempenho escolar ou sinais de isolamento, especialmente quando proporcionamos espaços de diálogo sem julgamentos, e sim de apoio.
O apoio escolar envolve sobretudo promover um ambiente em que as diferenças sejam inseridas e vistas como algo positivo. Envolve também acompanhamento contínuo, com atenção a pequenos sinais de violência, compreendendo as razões e ajudando estudantes a refletir sobre suas ações. Não menos importante, envolve educação digital e reflexões sobre o uso da tecnologia, reconhecendo os impactos das redes sociais na saúde mental das crianças e adolescentes.
Porém, mesmo com prevenções, é possível que nos deparemos com uma situação de bullying ou cyberbullying na escola. Por isso, é importante que as escolas criem estratégias para mitigar os problemas causados pela prática, seja sobre como lidar com a criança agressora, quanto com aquela que é agredida.
O combate ao bullying e ao cyberbullying não é simples, mas exige compromisso, envolvimento e um olhar atento para fortalecer os jovens emocionalmente. Um dos principais papeis da escola é a educação integral, que envolve prepará-los com habilidades não apenas cognitivas, mas socioemocionais, que permitam que possam se relacionam da melhor forma consigo e com os outros. É a partir desse princípio que esperamos ajudar as próximas gerações a criarem ambientes mais seguros e respeitosos para todos.
*Ana Paula Yazbek, Ângela Kim e Ana Lucia Bresciane, são especialistas do Espaço Ekoa, com reflexões sobre como as escolas podem atuar de forma efetiva diante de casos de bullying e cyberbullying.
*Com edição de Marina Yazbek Dias Peres