“A endometriose é uma doença invisível, mas com consequências muito reais”, afirma médica radiologista

Médica radiologista explica por que o diagnóstico precoce é essencial e como o SUS pode evoluir no tratamento da endometriose

Redação Publicado em 03/12/2025, às 06h00

A endometriose é uma doença inflamatória crônica que afeta milhões de mulheres no Brasil - Canva

A endometriose é uma doença inflamatória crônica que afeta milhões de mulheres no Brasil, mas que ainda enfrenta um longo caminho até o diagnóstico. Dor intensa, infertilidade e impactos emocionais e socioeconômicos fazem parte da realidade de quem convive com a condição, muitas vezes sem resposta por anos.

Em conversa com Mariana Kotscho, a médica radiologista Karina Giassi detalha os desafios do diagnóstico no país, explica a diferença entre os tipos de ultrassom e defende a capacitação de mais profissionais para identificar a doença. 

Especialista em diagnóstico por imagem com foco em endometriose, ela também comenta como o estilo de vida moderno contribui para o aumento dos casos e reforça a necessidade de olhar integralmente para a saúde da mulher.

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Entrevista com Karina Giassi

Mariana Kotscho: Karina, como é o foco do seu trabalho hoje?

Karina Giassi: Eu sou radiologista e trabalho basicamente com ultrassom transvaginal em endometriose. O meu foco é o diagnóstico e o mapeamento das lesões nas pacientes que chegam até mim. Relato essas informações para o médico solicitante — geralmente um clínico ou cirurgião —, atuando como um elo entre o médico e a paciente, que muitas vezes chega sem diagnóstico ou com um diagnóstico incompleto.

Mariana: Quais são os principais exames para detectar a endometriose atualmente?

Karina: Existem dois exames fundamentais: o ultrassom transvaginal e a ressonância magnética. Ambos são usados tanto para o diagnóstico quanto para o mapeamento da doença.

Mariana: Esses exames estão disponíveis no SUS?

Karina:  A ressonância magnética, em princípio, sim, mas o acesso costuma ser demorado pela complexidade e pela fila. Já o ultrassom transvaginal tem duas versões: o de rotina, que está amplamente disponível na rede pública, e o ultrassom com preparo intestinal, voltado ao mapeamento da endometriose. Esse último, infelizmente, quase nunca está presente no SUS.

O problema é que o exame de rotina, em geral, não é feito por especialistas na doença. Então, a endometriose muitas vezes passa despercebida, o diagnóstico atrasa e só mais tarde a paciente consegue uma ressonância para confirmar o quadro.

Mariana: O que poderia ser feito para mudar essa realidade?

Karina: Vejo dois caminhos. O primeiro seria incluir o ultrassom com preparo intestinal no SUS, o que seria ideal, mas difícil de viabilizar porque há poucos especialistas no país com essa formação.

O segundo caminho — e o que eu busco com meu trabalho — é educar os médicos que já atuam com imagem para reconhecer sinais da endometriose no ultrassom transvaginal de rotina. É possível ver indícios da doença ali, especialmente na região retrocervical, que representa cerca de 90% das lesões. Se os profissionais fossem treinados para observar essa área, poderíamos antecipar o diagnóstico de muitas mulheres.

Mariana: E qual é a importância do diagnóstico precoce nesses casos?

Karina: O diagnóstico precoce traz alívio imediato para a paciente, que finalmente entende a causa da sua dor, e isso já é um grande passo. Mas também previne as consequências da endometriose, que é uma doença inflamatória crônica com impactos em várias partes do corpo.

Além da dor e da infertilidade, a endometriose está associada a ansiedade, depressão, enxaqueca, síndrome do intestino irritável e até doenças autoimunes, como lúpus e artrite reumatoide. E há ainda o impacto socioeconômico: fadiga crônica, faltas no trabalho e na escola. É uma doença invisível, mas com consequências muito reais.

Mariana: Os casos têm aumentado ou são os diagnósticos que cresceram?

Karina: É um pouco dos dois. O estilo de vida atual é propício ao desenvolvimento da endometriose: vivemos sob estresse constante, com alimentação inadequada, longas jornadas de trabalho e pouca atividade física. Tudo isso contribui para a desregulação do sistema imunológico, uma das hipóteses para a origem da doença.

Ao mesmo tempo, os exames de imagem evoluíram muito. Hoje, tanto o ultrassom quanto a ressonância magnética mostram detalhes minúsculos que há dez anos passavam despercebidos. Então, temos uma combinação de fatores: mais casos e diagnósticos mais precisos.

Mariana: Para encerrar, onde as pessoas podem acompanhar o seu trabalho?

Karina: No meu Instagram, @karinagiassi_radiologia. Lá compartilho informações, casos e conteúdos educativos sobre endometriose e saúde da mulher.

Dra. Karina Giassi é médica radiologista

 

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