Prevenir e reduzir fatores de risco, como uso nocivo de álcool, serão medidas fundamentais para melhorar a qualidade de vida dos idosos
Mariana Thibes* Publicado em 23/10/2024, às 06h00
Existe uma diferença importante nos impactos causados pelo consumo nocivo de
álcool à medida que envelhecemos e entender esse fato pode auxiliar na prevenção
e redução de doenças. Enquanto os mais jovens são mais afetados por causas
externas associadas ao consumo de álcool, como violência e acidentes de trânsito,
pessoas mais velhas tendem a sofrer mais com os efeitos de longo prazo, sendo mais
afetadas por condições de saúde que se agravam com o uso contínuo de álcool.
Isso fica evidente nos dados de mortalidade (Datasus, Ministério da Saúde),
analisados e publicados no anuário Álcool e a Saúde dos Brasileiros: Panorama 2024.
Entre as principais causas de óbitos atribuíveis ao álcool observadas em pessoas até
34 anos estão agressão por diversos meios (arma de fogo ou objeto cortante), lesão
autoprovocada e acidente de trânsito.
Em pessoas com 55 anos ou mais, o cenário é diferente, aparecendo doença alcoólica
do fígado, transtornos mentais e comportamentais devido ao uso de álcool (abuso e
dependência alcoólica) e fibrose e cirrose hepáticas. Entre os homens dessa faixa
etária, acrescenta-se o câncer de esôfago; entre as mulheres, hipertensão,
pneumonia e câncer de cólon.
Com o envelhecimento acelerado da população brasileira, é cada vez mais prioritário
o alerta sobre o uso nocivo de álcool na maturidade. O Censo Demográfico 2022
mostrou que o total de pessoas com 65 anos ou mais no país chegou a 10,9% da
população; em 2010 representavam 7,4%. Praticamente no mesmo período, a
prevalência do consumo abusivo de álcool, entre pessoas com 55 anos ou mais, subiu
de 8,9% em 2010 para 10,6% em 2023, como revelou análise do CISA – Centro de
Informações sobre Saúde e Álcool.
Esse é um padrão de consumo dos mais perigosos e está envolvido a consequências
de curto a longo prazo. Quanto mais frequente for beber de modo excessivo, maior
o impacto negativo do álcool em diversos órgãos e sistemas, especialmente trato
gastrointestinal, fígado e sistema cardiovascular.
Os reflexos desse comportamento ao longo da década já estão sendo sentidos: a faixa
etária 55+ anos foi a única que registrou aumento de mortes associadas ao álcool
entre 2010 e 2022, com crescimento de 29,4% no período. Entre as mulheres, a
ampliação foi de 33,6%, superior à observada entre os homens (27,6%), mas eles
continuam sendo as maiores vítimas, representando 68% dessas mortes.
Também é preciso chamar a atenção para a crescente incidência de doenças crônicas
não transmissíveis (DCNT) à medida que as pessoas vivem mais. As DCNT foram a
principal causa de morte na região das Américas em 2019, segundo apontou relatório
da Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS). A maioria dessas doenças, como
hipertensão, câncer, doenças cardiovasculares e o próprio alcoolismo são mais
prevalentes entre a população mais velha.
Prevenir e reduzir fatores de risco, como uso nocivo de álcool, serão fundamentais
para melhorar a qualidade de vida da população idosa. Até porque a mortalidade é a
ponta do iceberg. Muitas pessoas passam anos convivendo com algum tipo de doença
antes de morrerem, perdendo anos de vida saudável e qualidade de vida de modo
geral.
A conscientização dos efeitos de longo prazo do uso de álcool, a prevenção do
consumo abusivo e a promoção de hábitos saudáveis são medidas essenciais para
promover um envelhecimento mais saudável para a população. Além disso, será
fundamental o fortalecimento dos serviços de saúde para rastreio e diagnóstico
precoce dessas doenças, incluindo o atendimento às pessoas com problemas
relacionados ao álcool.
* Mariana Thibes é socióloga e coordenadora do CISA – Centro de Informações sobre
Saúde e Álcool. Possui doutorado em Sociologia pela USP e pós-doutorado em Ciências Sociais pela PUC-SP.
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